• Instituições mal-amadas e valores conservadores

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  • 09/07/2022 08:00
    Por Gastão Reis

    Com certa frequência, analistas políticos de jornais de circulação nacional nos informam que as instituições nacionais estão firmes, resistindo às investidas golpistas de que estariam sendo vítimas. Talvez, face aos últimos absurdos do congresso em matéria de desrespeito ao dinheiro público, eles devam estar se perguntando a quem elas estão servindo. Essa situação me fez lembrar da célebre pergunta do Garrincha no jogo que a seleção teria contra a da então URSS: “Já combinaram com os russos?” No nosso caso, cabe perguntar o que a população pensa a respeito de nossas instituições e da pre-servação de valores conservadores. Certamente, não combinaram com o povo.

    A matéria publicada no Globo, de 4.7.2022, intitulada “Pistas da Confiança – Os altos e baixos das instituições”, de autoria de Marlen Couto, nos permite acompanhar o que ocorreu nos anos de 2018, 2019, 2021 e 2022. Pelos resultados, bem que o título poderia ter sido “Pistas da Desconfiança”. O Datafolha, em pesquisa feita entre 13 e 15 de setembro de 2021, publicada na Folha de SP, em 25/09/2021, nos forneceu indicadores com itens que não constam da pesquisa em tela, que foi realizada pelo Instituto da Democracia (IDDC-INCT) e financiado pelo CNPq e Fapemig. Mas o número de itens pesquisados em ambas são os mesmos em boa parte, permitindo compará-los.

    Seguindo a sequência da pesquisa relatada pelo Globo, tomemos as Forças Armadas (FAs). A do Datafolha, admite 3 tipos de resposta em relação ao grau de confiança nas instituições dos pesquisados: confia muito; confia um pouco (=desconfia muito); e não confia. A do Globo amplia o espectro das respostas para: não confia; confia mais ou menos; confia pouco (=desconfia muito); confia muito; e não sabe. No caso das Forças Armadas, em 2018, 2021(Datafolha) e 2022, o item confia muito apresenta, respectivamente, os seguintes percentuais: 31; 37 (Datafolha) e 25. Ou seja, houve um declínio forte de 12 pontos percentuais de 2021 (Datafolha) para 2022 (Globo). É evidente o desgaste das FAs ao acupar funções civis, em especial no Ministério da Saúde.

    No caso dos partidos políticos, nos anos de 2018, 2019, 2021 e 2022 (Globo), os percentuais do não confia foram de 78 para 71, 68 e 53, respectivamente, evidenciando uma melhora. Mas o do Datafolha de 2021, era de 61% contra 68% (Globo). Deve ter piorado face aos últimos acontecimentos em que os partidos vêm passando por cima das leis para obter recursos a qualquer custo, até mesmo com o risco de mais inflação. Mas se somarmos o não confia com o desconfia muito (=confia pouco), em 2022 (Globo), 53 mais 18, batemos numa rejeição dos partidos de 71% da população.

    O congresso, no mesmo período do parágrafo anterior (2018 a 2022- Globo), o item não confia sai de 58, depois 50, sobe para 54 (2021) e vai para 46 em 2022. A desconfiança teria se reduzido. Mas, da mesma forma, ao somarmos, em 2022, o não confia (46%) com o desconfia muito (=confia um pouco=27%), batemos numa rejeição de 73%, percentual coerente com o que ocorre com os partidos políticos (71%). Ou seja, dois indicadores fundamentais para a saúde da democracia, em que a confiança nos poderes é fundamental, a situação do país é muito ruim. Desconfiança aguda.

    Vejamos agora o que acontece com o STF. Na sequência de anos de 2018 a 2022 (Globo), o não confia tem o seguinte desempenho: 31, 42, 43 e 37. Da mesma forma, somando o não confia (=37) com o confia pouco (=desconfia muito=15), batemos em 52% da população, mais da metade, fazendo sérias restrições ao STF. Um quadro nada bom para a imagem da Justiça no Patropi.

    No caso das igrejas, a situação é mais favorável entre 2018 e 2022 (Globo). Os percentuais do confia muito, nestes anos, saem de 34 para 39% com o não confia na faixa de apenas 20% no período de 2018 a 2022. A Justiça Eleitoral fica na faixa de gozar da confiança de apenas 22% dos eleitores.

    Passemos, agora, para a questão da presença dos valores conservadores junto à população. Outra pesquisa, publicada pelo Globo, em 3.7.2022, intitulada “Conservadorismo à Brasileira – Flerte com extremos convive com avanços por direitos humanos”, da lavra do jornalista Flavio Tabak.

    A pesquisa foi realizada pelas mesmas instituições já mencionadas, tendo entrevistado pessoalmente 2583 eleitores em 201 cidades em todas as regiões do país entre os dias 4 e 16 de junho, com nível de confiança de 95%. Cobre os anos de 2018 a 2022. Nesses anos, cerca de 70% são favoráveis à redução da maioridade penal; cerca de 74% em média é contra a legalização do aborto ao longo do período 2018-2022; a surpresa vem com a mudança a favor de casamento de pessoas do mesmo sexo, de 38% em 2018 para 49% em 2022; e também a adoção de crianças por casal gay, que saiu de 37% em 2018 para 56% em 2022.

    Do ponto de vista das preferências políticas, por autodeclaração, a direita hoje tem um percentual (30%) que é o dobro da esquerda (16%) a despeito de ter baixa representação política nos legislativos nos três níveis. Quanto à democracia, a preferência vem crescendo no período de 56, em 2018, para 59%, em 2022, uma tendência positiva. Por outro lado, a insatisfação com a democracia, se reduziu de 55 para 51%, no mesmo período.

    Esse desconforto com a democracia pela maioria (51%) reflete o fato de o eleitor perceber o baixo grau de controle que tem sobre seus representantes. Nosso sistema eleitoral proporcional é visto como o pior por cientistas políticos. O eleitor desconhece que o voto distrital puro, ou equivalente, obriga o representante a prestar contas de seus atos no parlamento mensalmente. Essa possibilidade, junto com a revogação de mandatos, faria dele aquele que efetivamente controla o seu representante.

    É curioso que valores conservadores sejam vistos como atraso pela esquerda. Na verdade, respeito à lei, à família, à religião, por exemplo, fortalecem os laços comunitários e passam no teste de Kant de que são princípios políticos e morais generalizáveis. Ou seja, são benéficos a todos e não apenas a grupos, como ocorreu na dita constituição cidadã de 1988.

    Nota (*): Vídeo meu, “Reação do Brasil Profundo”, sobre os desmandos da república no uso do dinheiro público. Continua atual. Clique

    no link abaixo:

    https://www.youtube.com/watch?v=Bytk5mwEm90&t=5s

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