• Carteiras digitais tentam provar valor ao cliente além de oferta de descontos

  • 31/01/2022 08:10
    Por André Jankavski / Estadão

    Em busca de todo tipo de desconto, o comerciante Daniel Cavallini, 37 anos, é um usuário assíduo das carteiras digitais. Sempre usou a sua conta do PicPay para obter cashback (dinheiro de volta) nas lojas de carnes da Swift; a do Mercado Pago para ter benefícios nas suas compras no Mercado Livre; e a do RappiPay para pagar menos no aplicativo de refeições. Antes, ele também usava a Ame, da Americanas, para pagar menos nos postos da rede BR, mas desinstalou o aplicativo após o fim da parceria entre as empresas. “A interface delas não tem tanta diferença entre si. Acho que o que diferencia são as vantagens”, diz o comerciante.

    Cavallini é um exemplo dos usuários que as carteiras digitais passaram a disputar nos últimos anos. Se antes elas surgiram para ser uma forma mais rápida para realizar pagamentos, depois do Pix e da digitalização acelerada dos bancos essa qualidade se tornou “commodity”. Afinal, se antes as operações realizadas em TED e DOC podiam demorar 24 horas, o novo serviço do Banco Central (BC) mudou completamente a realidade das transferências digitais, tornando-as quase instantâneas.

    E, aí, a briga migrou para os benefícios, o que, segundo analistas, gerou um problema: as carteiras digitais estão praticamente comprando usuários com “mimos”. Isso pode dar resultado no momento em que o crescimento é o ponto de atenção de todas as companhias. Porém, a necessidade de mostrar resultado vai chegar, como já ocorreu em outros segmentos. “A dúvida que fica é quando as empresas vão conseguir fechar essa conta – e se isso vai acontecer”, afirma Marcelo Nakagawa, professor da escola de negócios Insper.

    O próprio Cavallini evidencia essa tendência. Ao mesmo tempo em que utiliza diversos aplicativos, ele nunca aderiu a nenhum serviço pago das carteiras. Essa dificuldade de “conversão” fez com que o mercado encolhesse nos últimos anos. De 2019 para 2020, o setor viu 15 companhias fecharem, o que reduziu o total de concorrentes para 17. Em 2021, houve novamente um crescimento, para 25 empresas, mas isso foi insuficiente para voltar ao antigo patamar.

    Disputa

    O PicPay, controlado pelo grupo J&F, dono da JBS, é a maior força do setor: são 60 milhões de usuários na plataforma, sendo que 27 milhões fizeram alguma operação nos últimos três meses.

    A empresa faz grandes aportes em marketing (é uma das principais patrocinadoras do Big Brother Brasil, da TV Globo, por exemplo) e em benefícios, como rendimentos na conta acima de 100% do CDI e cashback.

    Além disso, no ano passado comprou 100% da startup Guiabolso, dona de um software que ajuda as pessoas a organizar suas contas. Tudo para fazer o cliente ficar mais dentro do aplicativo.

    Mesmo com tantos investimentos, a empresa só prevê ser rentável daqui a dois anos. Havia planos para uma estreia na Bolsa em 2021, mas o mau momento do mercado afastou essa possibilidade. “A rentabilidade é um tema super presente na empresa e temos esse compromisso. Quanto mais engajamento, maior a chance de ficarmos mais rentáveis”, diz Danilo Caffaro, diretor de serviços financeiros do PicPay.

    A 99Pay segue com uma estratégia similar. A empresa surgiu com a promessa de democratizar as contas digitais, especialmente para o público de seu aplicativo de transporte, que ainda paga muitas corridas em dinheiro.

    Porém, além do pagamento aos motoristas, a empresa aderiu a novas funcionalidades, como compra e venda de bitcoins, recarga de celulares e pagamento de boletos. Com essas funcionalidades, chegou a 7,9 milhões de usuários ativos por mês.

    Mas ainda falta a parte da lucratividade – que, segundo Gabriel Reginato, diretor de operações da 99Pay, não está fora de vista. “Temos um volume robusto de usuários e serviços, o que nos oferece uma grande escala para trabalhar e equilibrar nossas ofertas com benefícios e cashbacks”, diz.

    Para Renato Camargo, presidente da RecargaPay, a questão da rentabilidade virou um problema para o setor de fintechs como um todo. Por isso, a empresa não quer “crescer por crescer”: a geração de caixa é importante.

    Não à toa, um dos modelos que a companhia adota é o do “freemium”, que consiste na oferta de algumas ferramentas grátis, mas com limite de uso. Se quiser usar mais, o usuário precisará pagar. Esse direcionamento atraiu novos investidores, que fizeram um aporte de US$ 80 milhões no negócio em 2021. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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