• Um rombo no que restava de credibilidade ao governo

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  • 25/04/2020 00:00

    A saída de Sérgio Moro do Ministério da Justiça, por justo inconformismo com a demissão do Superintendente da Polícia Federal, parece desnudar de vez o governo Bolsonaro. Que se dizia comprometido com o combate à corrupção, embora toda a vida tenha transitado entre corruptos (do quilate de Maluf, Valdemar Costa Neto e Roberto Jefferson), nos diversos partidos que frequentou.

     

    Você pode até não gostar de Sérgio Moro. Mas, mesmo com deslizes aqui ou ali, ele prestou grande serviço ao país como o juiz que, com desassombro, julgou os casos apresentados pela força-tarefa da Lava-Jato. Foi o maior golpe que os corruptos deste país já sofreram. A histórica operação produziu – com mais de 90% das sentenças confirmadas em todas as instâncias – quase 300 condenações, com mais de 3000 anos de prisão somados, e recuperação de mais de 12 bilhões de reais. Poderosos políticos, empresários e funcionários públicos, criminosos que se achavam para sempre acima do bem e do mal, pela primeira vez foram parar atrás das grades. Foi um avanço civilizatório.

     

    Sempre achei um erro Moro ter entrado nesse governo. Acho que devia ter seguido juiz, ou ter ingressado de vez na carreira acadêmica. Mas ele, como tantos que hoje se desiludem, acreditou em Bolsonaro. Entrou no governo na esperança de que estabeleceria a Lava-Jato como modelo nacional. Foi o tempo todo sabotado, criticado e combatido por Bolsonaro, sua família e suas milícias digitais. Já devia estar incomodado não só com as manifestações pró-ditadura apoiadas pelo Presidente, mas também com a aproximação do governo justamente com partidos do Centrão, afundados na Lava-Jato. Agora, ele reage ao corte de seu braço direito. Valeixo, o Diretor da PF, era para Moro, a garantia de um “padrão Lava-Jato”. Mas tudo indica que a Polícia Federal, com suas investigações, chegou perto demais do entorno presidencial, seus apoiadores, suas fake news e suas manifestações pró-ditadura. Por isso Bolsonaro o pôs para fora, e ainda de forma desleal, num Diário Oficial publicado na calada, mentindo que era exoneração “a pedido” e publicando o documento com o nome de Sérgio Moro, que jamais o assinou. E o presidente ainda deixou claro a Moro que não só faria mais intervenções políticas em outros cargos da PF, como também se meterá em investigações em curso, assim rasgando a carta branca que antes prometera ao Ministro e sepultando a tão imprescindível autonomia da Polícia Federal.

     

    Lembro, como Moro fez questão de lembrar, que Dilma Roussef (em quem jamais votei ou votaria), quando a Lava-Jato decolava, mesmo sob intensas pressões de Lula e outros caciques petistas, não ousou trocar a direção da PF. Justiça lhe seja feita. Tomara que a saída de Moro, tão simbólica, abra os olhos dos ainda hipnotizados pelo mundo paralelo das redes bolsonaristas. Mas sempre haverá os que, como fizeram com Mandetta, passarão a chamar Moro de “traidor”, “comunista”, buscarão defeitos, tentarão desconstruí-lo. Ao fazerem isso, bolsonaristas fanáticos (nem todos o são, tenho visto arrependimentos e senso crítico despontando aqui e ali) reforçarão ainda mais as semelhanças com lulistas fanáticos (e nem todo petista é lulista fanático), que odeiam Moro. Mas nada apagará o valor do juiz da Lava-Jato. E nada, nem o fanatismo, poderá consertar a já tão arruinada imagem desse governo. Parece um rombo gigantesco no que lhe restava de credibilidade.

    denilsoncdearaujo@gmail.com

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