• Um caso de tripofobia

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  • 27/05/2017 09:10

    Às vezes somos surpreendidos por situações inusitadas. O inesperado ocorre e não sabemos como agir. Não somos senhores da onisciência, portanto, precisamos aprender com o que a realidade nos mostra.

    Parentes e amigos conhecem a minha resistência quanto às adaptações aos avanços cibernéticos. Gosto das coisas artesanais, caseiras, poéticas. Mas a vida corre pela velocidade da tecnologia.  Tive que me adaptar à telefonia móvel.

     Hoje alguém sair de casa sem celular é quase inadmissível. Admiro os amigos que ainda resistem, não têm celulares. São poucos. A minha mãe, para dialogar com as netas, entrou no grupo da família que há no whatsApp. Liga o áudio e manda as mensagens. Foi ela quem me ensinou a escrever cartas. Hábito que ainda cultivo, mesmo via e-mail.

     Além das palavras, a comunicação dos aplicativos explora belas imagens.  Só que uma delas me colocou em situação delicada. Enviaram-me um gif com um “bom dia” entre flores. Achei tão bonito que repassei. Porém uma amiga me respondeu como se tivesse recebido algo aterrorizante:

    -Você quase me matou! Entrei em pânico! – Depois da mensagem, colocou as carinhas de espanto (emoticons).

    A princípio, não entendi. Mesmo sem saber por que tinha provocado tanto pavor, pedi desculpas. Fiquei com a sensação de quem havia agredido alguém. 

    Percebendo que eu estava apreensivo, ela explicou:

    -Tenho tripofobia. Não sabia que eu tinha isso. Descobri outro dia. Mas não fique preocupado, não é contagioso. Não é doença, não precisa de remédio, não tem nada a ver com saúde pública. E por favor, não fale pra ninguém que sou tripofóbica. Eu mesma acho isso uma frescura. Mas é algo pavoroso. 

    Pela minha ignorância, perguntei: 

    -Mas o que é tripofobia? – Ela respondeu:

    -São reações que provocam náuseas, quando a gente se depara com vários buracos reunidos como os das colmeias, ou com movimentos simétricos que produzem a sensação de profundidade. As flores que você me mandou abriam e fecham de um jeito que me deixou tonta.

    O que perecia criativo para mim, o abrir e fechar harmônico das pétalas dando a conotação do nascer do dia, criou uma situação angustiante para ela. 

    Em síntese, a palavra tripofobia designa medo de buraco. O pouco que li sobre o assunto deu para perceber que se trata de um problema de natureza psicológica. Pude perceber também que esse assunto carece de um estudo mais aprofundado.

    Não perdi a amiga. Só que agora guardo um secreto, mas não chega a incomodar. Em conversa amistosa, ela me confessou que procura administrar a ansiedade, porém, ao ver as flores, perdeu o controle…

    Outro dia, durante a aplicação de uma prova no turno da noite, descobri que uma aluna tem nictofobia, medo de escuro:

    Tudo transcorria normalmente, quando rapidamente a luz piscou. Não chegou a apagar. Porém foi o suficiente para desestabilizar emocionalmente a aluna, que levantou o braço e perguntou:

    -Professor, posso ligar o celular?

    -Não. Não é permitido o uso de celular em sala de aula.

    De repente, o semblante da aluna mudou: ficou pálida, trêmula. Aproximei-me dela e perguntei:

    -Por que você quer ligar o celular?

    -Tenho medo de escuro. Se faltar luz, entro em pânico. Posso deixar a lanterna do celular ligada?! 

    Pela falta de concentração que ela demonstrou, mesmo contrariando a norma da escola, permiti. Isso bastou para que voltasse a fazer a prova tranquilamente.

    -Precisamos aceitar e respeitar as pessoas como elas são…

    Diante do caos vivido no país, que fobia pode surgir quando alguém ouvir a palavra “político”? Traumatizado, o povo já está.



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