• Olhares atentos para combater a violência sexual e o abuso de crianças e adolescentes

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  • 27/03/2019 10:06

    A violência sexual e os abusos, infelizmente, acontecem muitas vezes dentro de casa. Os agressores, geralmente, são parentes próximos ou amigos da família. Embora a legislação impute em primeiro lugar à família o dever de cuidar e proteger crianças e adolescentes, nem sempre isso acontece. E o desafio de detectar e denunciar esse tipo de situação, em muitos casos, é enfrentado pela escola. A sensibilidade e o olhar atento dos educadores sobre a criança têm um papel cada vez mais importante para interromper e ciclo de violência e ajudar a garantir sua proteção.

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    Segundo o estudo feito pelo último Dossiê Criança e Adolescente, divulgado pelo ISP (Instituto de Segurança Pública), em 2018, mais da metade (50,3%) dos crimes de periclitação da vida e da saúde contra crianças e adolescentes foram praticados por familiares. Em 2017, foram 3.886 meninos e meninas vítimas de violência sexual. Isso significa que, em média, por dia, dez crianças e adolescentes foram vítimas de violência sexual no estado.

    Os dados referentes ao número de registros de crimes de estupro também vem aumentando nos últimos cinco anos. De acordo com os dados do ISP, de 2013 à 2018 o número subiu 34% no município. No Rio de Janeiro, em 2017, segundo os dados do Dossiê Mulher 2018, em 66,6% dos casos registrados em todas as delegacias do estado, as vítimas eram crianças ou adolescentes. Dos 4.173 registros, 2.779 foram vítimas mulheres de até 17 anos de idade. 

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    Os números assustam, mas ainda não refletem a realidade, uma vez que o estudo considera apenas os casos registrados nas delegacias de polícia. E é ai que se encontra o problema. A maior parte das vítimas continua omissa.

    Apoio da escola é fundamental

    A suspeita e a identificação dos casos de vitimização de crianças e adolescentes ainda são enormes desafios. Dependendo da idade e das circunstâncias, uma criança pode não entender que aquilo que ela sofreu foi uma violência e não sabe expressar isso a alguém, como explica o Dossiê Criança e Adolescente. Por isso, a capacitação e o olhar do profissional da educação sobre a criança e o adolescente podem, sim, ajudar a mudar esse quadro. 

    “A escola é a porta de saída da informação, é um ambiente protetor que pode identificar as situações e acolher essa criança ou adolescente”, explicou a psicóloga escolar do Crei (Centro de Referência de Educação Inclusiva), Vanessa Senna. A abordagem do tema na rede municipal de ensino segue o protocolo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), desde a identificação de suspeita dos casos, a notificação ao Conselho tutelar e o encaminhamento ao Ministério Público. 

    As vítimas de algum tipo de violência, seja ela física, psicológica ou sexual, comumente apresentam alterações no comportamento. São oscilações de humor – crianças que são extrovertidas e passam a apresentar comportamento mais introvertido, por exemplo – medo de determinadas situações, recusa a participar de atividades e falas e atitudes sexualizadas para a idade, que representam sinais importantes de que algo pode estar errado. 

    A violência sexual não se configura apenas como o ato sexual, mas pode acontecer de outras formas, como carícias pelo corpo, sexo oral, exposição de órgãos sexuais para as vítimas, apresentação de materiais pornográficos ou observação de banho ou troca de roupa.

    A negligência familiar muitas vezes atrasa a identificação do abuso. Há ainda a insegurança das vítimas em revelar para familiares por medo, de ser punido ou afastado da família. Aí entra a atuação do Conselho Tutelar, que tem, entre outras responsabilidades, que adotar medidas protetivas para garantir que a violência contra a criança e o adolescente seja interrompida.

    “Não denunciar os casos pode acarretar vários problemas para a criança e o adolescente, até o suicídio. Estudos demonstram que crianças sexualmente abusadas acabam tendo uma visão muito diferente do mundo e dos relacionamentos. Quanto mais cedo receberem o apoio educacional, médico e psicológico, mais chances terão de superar a experiência negativa da infância e ter uma vida de adulto mais prazerosa e saudável”, explicou a conselheira tutelar Mérilen Dias.

    O ECA, em seu artigo 13, obriga a comunicação de suspeitas ou confirmação de casos de maus-tratos contra criança ou adolescente ao Conselho Tutelar. Já no artigo 245, estabelece multa de 3 a 20 salários para médicos, professores ou responsáveis por estabelecimentos de atenção à saúde que detectem ou suspeitem dos casos e não comunique ao Conselho. 

    Para a conselheira, muitos educadores ainda não dão credibilidade às denúncias por não acreditar que os agressores serão responsabilizados. “É importante frisar que os serviços de disque-denúncia têm registrado um número cada vez maior de denúncias. Inúmeras denúncias recebidas têm se transformado em inquéritos, quando anteriormente os casos de exploração sexual nem chegavam à fase de investigação. O número de agressores penalmente responsabilizados pelos seus atos vem aumentando significativamente”, disse.

    Os programas de atendimento às crianças têm aumentado progressivamente, como explica a Mérilen. Petrópolis conta com o NAPE/IJ – Núcleo de Atendimento Psicológico Especializado – Infantojuvenil. O núcleo atua em parceria com a Secretaria de Educação. Após a criação da lei 7.382/15, em que foi criado um protocolo de atuação da rede no atendimento de crianças e adolescentes vítimas de violência, por abuso ou exploração sexual, no município, as ações também com os profissionais de educação foram intensificadas no sentido de capacitar a rede. 

    Recentemente um caso de abuso sexual contra criança foi identificado pelos profissionais de uma escola da rede municipal de ensino. O crime vinha ocorrendo há pelo menos um ano na casa da família. O suspeito é companheiro da avó da menor, com quem está casado há 10 anos. Na escola, a menina teria contado à orientadora da unidade sobre os frequentes abusos que vinha sofrendo do ”tio”. Além disso, a criança vinha apresentando comportamento estranho, o que chamou a atenção dos professores.

    O caso chegou ao conhecimento da mãe em agosto do ano passado, quando foi chamada no Conselho Tutelar. A prisão foi em cumprimento a um mandado de prisão preventiva expedido pela vara de Violência Doméstica, o crime está sendo investigado pela 106ª DP. O suspeito foi preso e transferido para um presídio no Rio de Janeiro. 

    A psicóloga explica que por mais que os pais estejam atentos, na maioria dos casos isso não acontece. E o apoio com os professores e demais profissionais da escola foi fundamental para o tratamento deste caso.



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