• Violência Doméstica: cerca de 14% das mulheres desistem das medidas protetivas

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  • 09/09/2019 15:35

    “O medo vai permanecer para sempre. Depois que você sofre uma violência como essa, você nunca mais tem uma vida igual. Eu não sou mais a mesma e nunca mais deixarei de ter medo” – é assim que uma vítima de violência doméstica retrata a vida depois de ter sido brutalmente agredida pelo ex-companheiro. Ele está preso e a primeira audiência está marcada para o mês de outubro. Ela garante que, apesar do medo, não vai desistir do processo. “Não é fácil conviver com esse sentimento. Ele está preso, mas se for solto, o que vai acontecer comigo?”, questionou a vítima. 

    Segundo dados do Centro de Referência de Atendimento à Mulher (Cram), no primeiro semestre deste ano, cerca de 14% das mulheres desistiram de manter os processos nas primeiras audiências. Neste período, o Cram acompanhou 128 audiências. Dessas, 19 vítimas optaram por não dar prosseguimento à denúncia. 

    “O que nós percebemos é que boa parte das vítimas que chegam às audiências sozinhas acabam desistindo ou por medo, ou por desinformação. Isso mostra a importância do nosso trabalho no atendimento a essas mulheres”, ressaltou a advogada do Cram, Ana Luiza Franco. Segundo ela, das 35 audiências que acompanhou no último mês, apenas duas mulheres desistiram. “Em contrapartida, em 20 audiências onde elas estavam sozinhas, 15 não deram mais continuidade ao processo”, disse a advogada.

    O Centro de Referência de Atendimento à Mulher (Cram) atendeu, este ano, 473 mulheres vítima de violência. Foto: Alexandre Carius/Tribuna de Petrópolis

    A coordenadora do Cram, Cléo de Marco, alerta para os perigos em desistir dos processos. “Ela perde todas as medidas protetivas que a lei oferece e volta para um lar de agressão. O nosso trabalho é proteger essa vítima que já está em situação vulnerável, por isso o alerta para que elas não desistam dos processos contra os agressores, para que sua integridade seja preservada”, disse a coordenadora.

    Dados do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) revelam que houve um aumento de cerca de 525% na quantidade de medidas protetivas expedidas na Comarca de Petrópolis em um ano. Foram apenas quatro de janeiro a agosto de 2018 contra 25 deferidas no mesmo período deste ano. Entre 2012 e 2017, foram deferidas 769 medidas protetivas de urgência para mulheres vítimas de violência doméstica na cidade. 

    Segundo Cleo de Marco, a maioria das mulheres que procuram o Cram não querem apenas dar um “susto” no companheiro com o Registro de Ocorrência, elas realmente querem sair da relação abusiva. “Muitas dessas mulheres vivem essa situação de violência durante anos e em algum momento elas decidem registrar a queixa na delegacia e denunciar os agressores. A rede de proteção existe: as delegacias, o Cram e o Judiciário estão juntos para atender, acolher e adotar todas as medidas protetivas para essas vítimas”, enfatizou Cléo de Marco.

    Esta semana, as policiais civis do Núcleo de Atendimento à Mulher (Nuam) da 105ª Delegacia de Polícia (DP), no Retiro, prenderam um homem que agrediu violentamente a companheira. A denúncia foi feita no dia 19 de abril, depois que a vítima em depoimento disse “estar cansada das agressões”. A mulher teve ferimentos na cabeça, rosto e braços.

    Ela relatou que o marido chegou em casa embriagado, por volta das 22h e iniciou as agressões. Ele também tentou esfaqueá-la, mas como não encontrou a faca ou outro objeto cortante acabou desistindo. A vítima contou aos policiais, que tinha escondido todas as facas por medo. Ela disse ainda que em 2017, teve um dedo quebrado pelo companheiro, mas na época não quis denunciar o caso à polícia.

    “A pressão psicológica que essas mulheres sofrem é enorme. O medo é algo muito presente. É um ciclo de violência que pode não ter fim. Denunciar, procurar a delegacia e o Cram é o primeiro passo”, frisou Cleó de Marco. Este ano, o Cram já atendeu 473 mulheres. Em todo o ano passado, a unidade realizou 638 atendimentos.

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