Venezuela vai pedir ajuda da ONU para desativar campos minados em fronteira
O governo da Venezuela vai pedir à Organização das Nações Unidas (ONU) ajuda para remover minas terrestres em seu território, colocadas, segundo Caracas, por “grupos armados irregulares” perto da fronteira com a Colômbia. Em pronunciamento, o presidente Nicolás Maduro afirmou que pedirá ao secretário-geral, António Guterres, “assistência emergencial imediata, para que possam trazer todas as técnicas para desativar os campos minados que os grupos irregulares deixaram para trás”. A ONU ainda não se pronunciou.
Na semana passada, dois militares venezuelanos morreram depois de pisar em uma mina em uma área próxima à fronteira colombiana, em meio a conflitos que provocaram a fuga de milhares de pessoas da área. Por outro lado, o governo da Colômbia acusa Caracas de abrigar integrantes do Exército de Libertação Nacional (ELN) e dissidentes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), que rejeitam o acordo de paz assinado em 2016 entre lideranças do grupo e Bogotá.
Na quarta-feira, dia 31, grupos de defesa dos direitos humanos defenderam que a ONU indique um enviado especial para a região de fronteira, local que há anos é cenário de violência e instabilidade ligados à ação de traficantes e contrabandistas.
A Venezuela está empreendendo sua maior campanha militar em décadas, tendo como alvo o que diz ser um grupo criminoso que opera dentro de sua fronteira perto da Colômbia. A operação forçou a fuga de 5 mil venezuelanos para o país vizinho e alguns dos que se refugiaram na cidade colombiana de Arauquita denunciam que o Exército matou civis e os fez passar por guerrilheiros.
A operação – que começou com vários ataques aéreos – representa um afastamento da abordagem empregada contra as organizações ilícitas nas fronteiras. Durante anos, funcionários do governo de Nicolás Maduro toleraram e até cooperaram com esses grupos armados, muitos deles com raízes na Colômbia, enquanto transportavam drogas e outros contrabandos. Agora o país atacou um deles.
Maduro afirmou que o ataque reflete a política de “tolerância zero em relação aos grupos armados colombianos irregulares”. Mas analistas são céticos sobre a explicação. “Nunca vimos algo assim nessa escala”, disse Kyle Johnson, fundador da Conflict Responses, uma organização sem fins lucrativos com foco em questões de segurança com sede em Bogotá.
A campanha militar começou no dia 21 em Apure, um dos Estados mais pobres da Venezuela, e causou a morte de nove pessoas que o governo venezuelano considera guerrilheiros.
No município colombiano de Arauquita, Emir Ramírez diz que fugiu da Venezuela antes que seus pais, um irmão e um tio fossem mortos por militares venezuelanos. Ramírez mostra com revolta as fotos de seus parentes assassinados, alguns usando botas e portando armas que ele diz nunca ter visto. “Por que os assassinaram?”, questiona o comerciante de 26 anos, defendendo a inocência dos parentes. “Não eram guerrilheiros.”
Ramírez temeu por sua vida e a de sua mulher e fugiu com ela em uma canoa pelo Rio Arauca para o lado colombiano, onde tem mais parentes e um filho de 7 anos. Em vão, tentou convencer os pais a acompanhá-lo.
Os parentes de Ramírez foram mortos no dia 25. Naquela mesma noite, um conhecido lhe mostrou pelo celular fotos dos corpos dos pais dele, do irmão Uriel e do tio Yanfran, vestidos com uniforme militar e armados. “A primeira foto que vi foi a da minha mãe, com um revólver jogado no chão ao lado dela. Com botas que dizem ser de guerrilheira”, lembra, incrédulo. Na imagem seguinte, seu pai jaz com botas, calças verdes e um revólver do lado.
Carlos Valdés, ex-diretor de Medicina Legal na Colômbia, investigou execuções de civis pelas mãos de militares colombianos que os faziam passar por guerrilheiros. Para o analista forense, os corpos da família de Ramírez foram dispostos para que aparecessem de barriga para cima, com uma arma na mão em um mesmo “padrão de simulação”.
O governo Maduro culpa seu vizinho de descuidar os 2.200 km de fronteira e permitir a expansão de grupos armados. Mas a Colômbia e a oposição venezuelana asseguram que Caracas pretende com esta ofensiva ajudar guerrilheiros dissidentes colombianos na luta que travam com outra facção pelo controle do tráfico de drogas.
O ataque, centrado em torno de La Victoria, uma cidade de cerca de 10 mil habitantes, tem como alvo uma facção de dissidentes das Farc conhecida como a Décima Frente, segundo moradores locais, levando especialistas em segurança a sugerir que eles podem ter quebrado regras estabelecidas pelo governo Maduro ou seus aliados.
Os ataques aéreos foram seguidos de combates terrestres entre os militares venezuelanos e a Décima Frente, disse Juan Francisco García, do grupo venezuelano de direitos humanos Fundaredes. Ele descreveu “uma população civil presa entre grupos beligerantes”. (Com agências internacionais).