
Um seminário oportuno e Lula dando tiro nos próprios pés
O jornal Valor, em boa hora, promoveu um seminário aberto, em 24/03/25, em que os interessados poderiam participar apontando o celular para um QR code. O título era “RUMOS 2025 – O Brasil que teremos e o Brasil que quere-mos”. Reuniu especialistas em diversas áreas, distribuídas em três painéis.
Meu interesse era o Painel 2 – Superespecialistas indicam os Caminhos: O que fazer para voltar aos trilhos na questão fiscal? Foram convidados o ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, sócio fundador da Gávea Investimentos; Pedro Malan, ex-ministro da Fazenda; Zeina Latif, consultora econômica, sócia da Gibraltar Consulting; e Mansueto Almeida, economista-chefe da BTG Pactual. Passemos aos alertas que fizeram.
O moderador Alex Ribeiro passou então a formular as perguntas. A primeira foi quanto à questão da dívida pública. Monsueto, especialista na área, chamou a atenção para os avanços de seu percentual de 71% para 76% em período curto, devendo atingir 86% do PIB em 2030. Afirma que os juros (a SELIC foi a 7,8% em termos reais) subiram tanto porque a inflação cresceu muito. A carga tributária escorchante, segundo ele, não vai diminuir. Basica-mente temos que cortar despesas para começar a atacar nosso problema fiscal.
A pergunta seguinte foi na linha de que o mercado não teria reconhecido o esforço fiscal do governo Lula. Teria alguma injustiça em relação ao governo?
Zeina Latif inicia chamando a atenção para a crise de confiança já instalada no país, e até reconhece que o mercado exagerou no final do ano passado. Mas enfatiza que isso não saiu do nada. Problemas, retrocessos e iniciativas desastrosas explicam o pé atrás do mercado em relação ao (des)governo Lula. Monsueto faz um aparte, ressaltando que precisamos de previsibilidade, de ter um norte. Exatamente o que o governo federal não entregou até agora com seu comportamento fora dos trilhos.
A nova pergunta foi a seguinte: ainda haveria espaço para adotar um enfoque gradual na redução da dívida pública?
Monsueto enfatiza a necessidade de políticas sérias permanentes. O investimento público está sempre abaixo de 2% quando já foi de 10% do PIB. As simulações referentes à previdência social são explosivas. Nos gastos tributários, os subsídios somam 7% do PIB. A trinca previdência-folha salarial-gastos tributários, se enfrentada para valer, mudaria a cara do País. Monsueto bate ainda na tecla de que um forte ajuste fiscal levaria o PIB a reagir e a se expandir significativamente, como já ocorreu na presidência Temer. Mas nada tem sido feito pelo governo Lula. Vai sempre na direção errada quando faz.
Quanto à possibilidade de ser feito um ajuste fiscal, Pedro Malan responde que sim, mas com ressalvas. É preciso superar a armadilha da renda média em que certos países caíram, caso do Brasil, dado o lento crescimento anual da renda real per capita da população. Nosso bônus demográfico, situação em que há mais gente entrando no mercado de trabalho do que saindo via aposentadoria, já se foi. A História não registra países que ficaram ricos após seu povo envelhecer.
Não se pode adotar, diz Malan, um keynesianismo fora de época ao se conferir renda à população para consumir sem que o investimento seja ampliado para 20 ou 25% do PIB. Crescimento sustentado exige inovação, elevação da produtividade e continuidade de políticas nessa direção. E ainda enfrentar para valer o problema da desigualdade. Ao reforçar a possibilidade gradual de reduzir a dívida pública, Malan enfatiza que tem que ser um gradualismo em marcha apressada. A visão do gasto público como motor do crescimento, muito a gosto de Lula, está simplesmente errada.
Entre os convidados, Zeina Latif foi a única que pôs o dedo na ferida ao afirmar que o Brasil tem um pesadelo político-institucional mal resolvido, que vem travando o desenvolvimento do País. Seu início, denunciado competente-mente por Roberto Campos, foi a fatídica Carta de 1988, que atendeu bem mais a grupos de interesse do que ao bem comum.
Vamos agora aos tiros dados por Lula em seus próprios pés. O primeiro foi dado ao longo dos dois primeiros anos de seu (des)governo em que pediu do Congresso licença para gastar. E conseguiu. Qual tresloucada Dilma, ele resolveu repetir a dose indo bater em uma inflação global acima da meta, e na de alimentos que chegou a mais de 10% em itens prioritários para a população de menor poder aquisitivo.
Ao invés de desacelerar, o segundo tiro de Lula no outro pé foi dobrar a aposta na direção a ser evitada, segundo os economistas convidados para o seminário mencionado nos primeiros parágrafos. A total falta de imaginação o levou a adotar um conjunto de medidas que vão expandir o consumo na linha da desastrada Dilma, que dizia que consumo é vida.
Dentre elas, cabe citar as principais: pagamento de mil reais mensais a beneficiários do programa pé-de-meia; gratuidade (obviamente paga pelo governo, ou seja, todos nós) dos 41 medicamentos do programa Farmácia Popular; isenção do imposto de renda para quem ganha até 5 mil reais mensais; e edição de medida provisória que permite a liberação do FGTS aos trabalhadores demitidos. Tudo somado atinge o valor de 31, 2 bilhões de reais. Tudo isso para tentar conter sua desaprovação em queda vertiginosa.
Ninguém precisa ser economista para saber no que vai dar esse amontoado de medidas demagógicas: muita inflação! O corte de gastos proposto pelo governo é de cerca de R$ 15 bilhões. Como ele vai jogar no mercado R$ 31, 2 bi, na verdade Lula está aumentando o déficit público em mais de R$ 16 bilhões. A população já se deu conta da enganação quando constatou que os preços dos alimentos explodiram em 2024, doendo no bolso e no estômago.
Em suma, é muito provável que a inflação continue em alta, atingindo seu auge no ano eleitoral de 2026. Tem ou não tem cara de quem optou por um suicídio político? Mas a pesada conta irá para a população pagar sem esquecermos as digitais do STF, que viabilizou a candidatura e posse de Lula. A boa notícia é que a reação popular vem crescendo organicamente.
**Sobre o autor: Gastão Reis é economista e escritor.
Contato: gastaoreis2@gmail.com