• Um jeito elegante de falar do que há de pior no ser humano

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  • 29/10/2022 08:31
    Por Luiz Carlos Merten, especial para o Estadão / Estadão

    Matheus Nachtergaele encontra-se com a reportagem do Estadão, num hotel dos Jardins, em São Paulo, para falar da próxima estreia, O Clube dos Anjos. O longa que Angelo Defanti adaptou do livro homônimo de Luis Fernando Verissimo (parte da Coleção Plenos Pecados, que tem “Gula” como tema), integra a programação da Mostra de Cinema. Estreia dia 3.

    Otávio Müller também veio para a apresentação de O Clube no fim de semana. Matheus e ele nunca haviam trabalhado juntos. Guardam ótimas lembranças do set. “O filme tem um elenco excepcional que o Angelo conseguiu reunir ao longo de dez anos”, conta Müller. “Mais recentemente, um outro diretor, baiano, também me disse que queria adaptar o Verissimo e pensava em mim para o personagem, mas prevaleceu o projeto do Angelo.”

    O elenco, excepcional, inclui, além de Matheus e Müller, também Angelo Antônio, Paulo Miklos, Marco Ricca e César Mello. Matheus destaca a fineza da direção de Defanti. “É um filme muito bem feito, bem escrito. Tem soluções de mise-en-scène muito elegantes, e isso num filme que muitas vezes está expondo o pior do ser humano.” Alguém poderá pensar que O Clube dos Anjos virou um reflexo – uma metáfora – sobre o Brasil atual, mas o País ainda era outro quando essa história, ou melhor, quando a produção começou.

    LEMBRANÇAS

    “O personagem não sou eu, mas conheço bem esse tipo de gente que foi perdendo o dinheiro, o status social. Ocorreu com minha família.” Matheus viaja na lembrança, agora para falar de outro filme. O assunto surge porque, no Instagram do ator, Chicó e João Grilo, figuras emblemáticas de O Auto da Compadecida, estão em plena campanha da eleição presidencial. “Psiu! Não vamos falar sobre isso”, ele brinca. Mas lembra o set.

    “A gente estava se divertindo muito. Não sabíamos direito no que aquilo ia dar, e um dia o Guel (o diretor Guel Arraes) chegou no meu ouvido e disse: ‘Está dando certo. Acho que vai ficar bom’. Eu não tinha mais dúvida, e sabe por quê? Uma das lembranças que guardo daquele set é de Luisa Arraes, filha do Guel, que ainda era uma menina e acompanhava o pai nas gravações. Luísa ficava siderada, na pontinha dos pés, olhando no video e dando mostras de grande felicidade.”

    Luísa está agora no ar com ele, na segunda temporada de Cine Holliúdy, na Globo. Matheus terminará a entrevista e, na sequência, estará correndo para o aeroporto. À noite, no Projac, no Rio, ele fará gravações da terceira temporada de Cine Holliúdy.

    O que ele pode dizer da futura temporada? “Olegário perde a eleição e vai parar na oposição ao novo prefeito.” Como é fazer um personagem que parece ter virado uma extensão dele? Dois filmes, duas temporadas. “O Olegário fica no ar quase tanto tempo quanto o protagonista dessa história, o Francysgleidisson, que o Edimilson Filho faz com tanta graça. (Luísa Arraes faz Francisca, que é a musa do diretor do Cine Holliúdy.) É um personagem que adoro fazer.” Lá atrás, em outra entrevista, Matheus já disse que se havia inspirado no Odorico Paraguassu de Paulo Gracindo em O Bem-Amado. Acontece que, sem propriamente descolar dessa referência, Olegário foi ficando cada vez mais com a cara dele. Atores da categoria de Matheus Nachtergaele e Otávio Müller parecem tirar de letra os personagens que fazem. A pergunta – boba – que não quer calar? Eles ainda são dirigidos, ou os diretores os deixam livres para fazer o que sabem?

    Matheus surpreende: “Eu, às vezes, gosto de ser mandado. A Renata (Pinheiro, de ‘Carro Rei’) me enquadrava diante da equipe. ‘Não é isso!’ É natural, quem tem o filme na cabeça é o diretor, ou diretora”. Müller, que anda louco para voltar ao teatro, concorda. “Comecei com a Bia Lessa, então ter mulher mandando em mim na direção faz parte do show.” O prefeito Olegário, Cine Holliúdy. “Deu muito certo, o Brasil se reconhece no filme, nos personagens. São divertidos, mas, se você parar pra pensar, vai ver que ali dentro tem uma crítica séria. A arte, a cultura, não dá pra viver sem.”

    COMER, COMER

    De volta a Clube dos Anjos, no imaginário de qualquer cinéfilo que se preze a história de um grupo de amigos que se reúne em sucessivas refeições para comer até morrer remete a um clássico de Marco Ferreri – A Comilança (La Grande Bouffe), de 1973, que também tinha um elenco fora de série. Marcello Mastroianni, Ugo Tognazzi, Philippe Noiret, Michel Piccoli, Andréa Ferréol. “Era uma referência da gente, mas o Angelo nunca nos falou sobre aquele filme. Já sabia o que estava querendo.”

    Matheus conta que, embora todo mundo soubesse que ele ia fazer o cozinheiro – Lucídio -, o diretor guardou-o como um segredo (de Polichinelo?). “Só fui aparecer no set com o filme andando. Ninguém sabia como seria o meu Lucídio, que é decisivo nas mortes que vão ocorrendo. Esse elemento- surpresa terminou sendo positivo para os desdobramentos da trama.”

    Na fase dura da pandemia, Matheus ficou em casa, cuidando das flores, dos animais. “Moro numa casa e o que começou como diversão passou a me dar um trabalho danado. Vai cuidar de bicho pra ver.” Ele teve de reduzir o número dos cachorros: “Não estava dando conta”. Otávio Müller lembra que Clube dos Anjos foi feito em estúdio, em São Paulo, e Matheus trouxe os cachorros para o hotel. É um dos privilégios da produção: “A gente dá duro, mas também se diverte”. Matheus concorda.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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