Tinha ‘trago’ ou tinha trazido?

Trago, tragado, trazido, pego, ganho, escrevido… A lista é enorme! O particípio de alguns verbos provoca muita estranheza e, quase sempre, faz-nos rir da própria dúvida. Na quinta passada, a discussão que predominou entre colegas de trabalho foi esta: quando devo usar o particípio regular e quando usar o irregular? 

Gosto de relembrar o tempo de escola, pois foi, e ainda é, nesse ambiente que estudamos esses detalhes da nossa língua. O particípio denominado regular é aquela forma nominal do verbo que flexionamos usando o sufixo ‘-do’ (-ado ou -ido). Por exemplo: falar – falado; amar – amado; vencer – vencido; dividir – dividido. Já a forma irregular é formada pelo sufixo ‘-to’, tal como: por – posto; ver – visto; cobrir – coberto; abrir – aberto. Até aqui, tudo bem! 

Onde está a confusão? Está nos verbos que possuem as duas formas, a regular e a irregular, e naqueles que possuem apenas uma. Quando o verbo possui as duas formas, devemos usá-las da seguinte maneira: a forma regular é usada com os verbos auxiliares ‘ter’ e ‘haver’. Assim: “Ele tinha salvado o cachorrinho.” Ou “ele havia salvado o cachorrinho.” Já a forma irregular deve ser acompanhada dos auxiliares ‘ser’ ou ‘estar’, deste modo: “O cachorrinho foi salvo.” Ou “o cachorrinho está salvo.” Nessa categoria se enquadram os verbos ganhar, pagar, perder, imprimir, eleger, gastar e muitos outros. 

Por outro lado, se o verbo só tem uma forma de particípio possível, seja qual for o verbo auxiliar (ter, haver, ser ou estar) o particípio será sempre o mesmo. Vamos aos exemplos: “ele foi visto na praia” ou “eu o tinha visto na praia”; “o portão foi aberto” ou “ele tinha aberto o portão”. Cito alguns verbos com particípio único: ter/ tido, estudar/ estudado; haver/ havido; saber/ sabido; caber/ cabido; sorrir/ sorrido; beber/ bebido; cancelar/ cancelado; chegar/ chegado; escrever/ escrito; fazer/ feito; perder/ perdido. 

O verbo trazer tem somente o particípio regular: trazido – ‘eu tinha trazido chocolate’ ou ‘chocolate foi trazido para mim’. O verbo tragar também só possui o particípio regular: tragado – “a fumaça do cigarro foi tragada” ou “ele tinha tragado a fumaça do cigarro”. Também são inexistentes as formas de particípio usadas na linguagem coloquial moderna: *chego, escrevido, cabo*… e tantas outras. 

Em tempo, as formas de 1ª pessoa do singular (eu) do presente do Indicativo dos verbos trazer e tragar são idênticas: eu trago flores (trazer) ou eu trago a fumaça do cigarro (tragar). Ressalto ainda que, na língua clássica e formal, não existe registro da forma “pego” como particípio irregular do verbo PEGAR, encontrando-se apenas a forma “pegado” com qualquer auxiliar. Contudo, na língua moderna, parece não haver problema o uso da forma “pego”, com os verbos ser e estar como auxiliares. Exemplos: O ladrão foi pego/ está pego. 

Espero ter clareado e dirimido as suas dúvidas. Reafirmo que espero a colaboração de vocês, leitores, enviando as sugestões e os pedidos de esclarecimentos. Obrigada pelo carinho e feliz 2020!.