• Suspeito de sumir com aluna trans da Unesp faria prova para oficial da PM

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  • 15/jul 14:21
    Por José Maria Tomazela / Estadão

    Marcos Yuri Amorim, o namorado suspeito de assassinar a estudante trans Carmen de Oliveira Alves, de 26 anos, tinha feito inscrição para participar de um concurso público para oficial da Polícia Militar. O nome dele consta no edital.

    Segundo o delegado Miguel Rocha, essa é mais uma prova do relacionamento dele com o policial ambiental da reserva Roberto Carlos de Oliveira, suspeito de ser cúmplice do crime.

    O delegado aponta um triângulo amoroso entre a vítima e os dois suspeitos. O advogado Miguel Micas, que defende Roberto, afirma que seu cliente se diz inocente e que a defesa ainda não teve amplo acesso ao inquérito. A reportagem não conseguiu contato com a defesa de Yuri.

    A aluna da Universidade Estadual Paulista (Unesp) está desaparecida desde o dia 12 de junho e a polícia aponta Marcos Yuri Amorim e Roberto Carlos de Oliveira como responsáveis pela morte dela – o corpo ainda não foi encontrado. Os dois estão presos temporariamente. Yuri foi levado para uma cadeia pública da região. O policial está no presídio militar Romão Gomes, em São Paulo.

    Relação de ‘sugar daddy’

    De acordo com o delegado, Yuri mantinha um triângulo amoroso com Carmen e o ex-policial. No caso com o PM, haveria um interesse financeiro, pois Oliveira bancava algumas despesas do Yuri.

    “A investigação toda aponta neste sentido. O Yuri é extremamente frio e manipulador. Ele e Carmen se conhecem há 15 anos, estudaram juntos na Unesp e o Yuri se aproveitava da Carmen, ele foi sendo arrastado pela Carmen nos estudos”, diz.

    O delegado descreve a relação de Yuri com o policial com uma relação típica de sugar daddy, quando o mais velho, melhor dotado financeiramente, banca o mais novo.

    “A relação de sugar daddy encaixa como uma luva. O Roberto tem poder econômico e o Yuri não tem. Ele trabalhava como entregador de yaksoba em um bairro aqui e fazia bicos. O Roberto se aposentou como segundo tenente, oficial da PM, com uma boa aposentadoria, e recentemente recebeu uma herança.”

    De acordo com o delegado, a investigação apontou o militar como cúmplice de Yuri no assassinato de Carmen. Eles teriam matado a estudante e ocultado o corpo. “O Yuri e o Roberto contaram aqui que dormiram juntos várias vezes. No dia 16 de junho, dias após o desaparecimento, eles vieram aqui espontaneamente, juntos, com o mesmo advogado, e contaram a mesma história. Isso chamou a atenção, porque o Roberto apareceu na história e a coisa foi escalando.”

    Para o delegado, a inscrição de Yuri no concurso para a PM é mais uma prova da relação entre os dois. O policial teria influenciado o rapaz que sustentava para que se inscrevesse no certame – a prova de conhecimentos foi realizada nesta segunda-feira, 14. Segundo o edital, o salário básico inicial é de R$ 4,8 mil. “Os dois estavam ligados e fizeram tudo juntos. Temos imagens do Roberto se deslocando para o sítio do Yuri. Temos a geolocalização do celular dele que bate com a geolocalização da vítima, a Carmen. Isso fundamentou a prisão temporária dos dois.”

    Desaparecida desde o Dia dos Namorados

    Carmen foi vista pela última vez após sair do campus da Unesp em Ilha Solteira, onde cursava o último ano de zootecnia. Ela havia feito uma prova e saiu em sua bicicleta elétrica de cor preta. Como não foi para casa, a família denunciou o desaparecimento à polícia.

    O rastreamento do seu celular apontou que o último lugar em que ela esteve foi na casa do namorado, em um assentamento de Ilha Solteira. Câmeras de segurança mostram a jovem se deslocando de bicicleta para a casa de Yuri.

    Relacionamento escondido

    A motivação do crime, segundo a investigação, seriam as pressões de Carmen para que Yuri assumisse o relacionamento com ela. Nada apontou ainda que ela soubesse da relação dele com o ex-policial Ela também havia preparado um dossiê apontando supostos crimes, como furtos, praticados pelo namorado. O dossiê seria divulgado se o rapaz não assumisse o relacionamento, que não seria bem visto pela família dele.

    A polícia tenta localizar o corpo. “Está sendo difícil porque eles (os suspeitos presos) negam, falam que não sabem de nada. Como na localização do celular dela um dos últimos pontos foi no lote que o Yuri cuida, fizemos buscas lá e achamos coisas estranhas”, disse o delegado. Segundo ele, havia uma fogueira com ossos, que foram recolhidos e encaminhados para pericia a fim de saber se são restos humanos. Nesta quarta-feira, será realizada uma nova perícia com luminol na casa para detectar eventuais resíduos de sangue. Uma perícia já realizada foi prejudicada pela entrada de luz no local.

    Segundo o delegado, a polícia obteve um sonar para vasculhar o rio que passa no fundo do sítio de Yuri. “A gente vai passar o sonar para tentar achar a bicicleta elétrica e, quem sabe a arma. Já fizemos buscas em poços que existem lá, com resultado negativo.” A psicóloga de Carmen também foi ouvida e disse que ela estava feliz, de bem com a vida e não tinha nada que indicasse a intenção de se matar.

    Caso é investigado como feminicídio

    O caso é investigado como feminicídio, crimes de violência doméstica cometido contra a mulher geralmente por namorados, maridos ou ex-companheiros. As decisões mais recentes da justiça têm entendido como feminicídio os homicídios cometidos contra pessoas trans por companheiro ou namorado.

    A Unesp Ilha Solteira se manifestou sobre o caso prestando solidariedade à família e amigos da vítima e informou que a comunidade universitária acompanha as investigações com a expectativa de que os fatos sejam plenamente esclarecidos.

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