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  • 07/08/2022 08:00
    Por Ataualpa A. P. Filho

    A cada dia que passa, certifico-me que as lições de vida nos fazem crescer interiormente. A minha obsessão pelo aprendizado tem me proporcionado momentos de gratas surpresas. Na quinta-feira passada (04/08), recebi uma aula de Eletricidade, mais especificamente, sobre instalações elétricas na construção civil. Por alguns minutos, tornei-me aprendiz de um ex-aluno da escola em que trabalho. Falo ex-aluno, porque, na referida quinta-feira, ele concluiu o Ensino Médio. E, em uma conversa informal, explicou-me como trabalha na montagem de circuitos de um prédio em construção.

    Tenho certeza que o dia 04 de agosto ficará marcado na memória dele, pelo fato de não só ter concluído a escolaridade no ciclo básico, mas também por ter visto uma equipe de profissionais de educação exaltando a vitória conquistada. Ele me disse:

    “Eu começava e não terminava nada. Fui matriculado em várias escolas. Mas devido ao meu problema, não conseguia concluir. Naquele tempo, não sabia que tinha déficit de atenção. Não me concentrava, tinha dificuldade de aprender. Passei a trabalhar ainda menino. Às vezes, para não ser reprovado, abandonava a escola. Quando ficava desempregado, voltava pros estudos. Mas quando arrumava emprego, largava…”

    Esse ex-aluno está na infância da terceira idade. A conclusão do Ensino Médio dele foi uma alegria para todo o corpo docente da escola pública que atende a jovens e adultos no sistema semipresencial. O pessoal de apoio, a equipe pedagógica, a equipe gestora, todos comemoraram…

    Ficamos felizes com todos os concluintes. Mas alguns se destacam pela superação, pelos obstáculos vencidos. Há uma cumplicidade, uma união de força. Há uma torcida de fibra que vibra na arquibancada da vida, que apoia para não deixar desistir, não deixar de existir, não deixar cair na invisibilidade. Quando não aparecem, ligamos; quando somem, procuramos. Todo esse trabalho não é pela estatística que temos que apresentar nos relatórios dos censos escolares; é pela alegria da vitória que, às vezes, ocorre apenas no plano pessoal. Vencer mesmo desacreditado. Mostrar para si que é capaz. Coisas simples também promovem momentos de alegria.

    Não temos contas dos casos de alunos que, por limitações pessoais, abandonaram as salas de aula pela não adaptação a sistema de ensino que não enxerga as individualidades. Tenho aprendido muito ouvindo depoimentos, testemunhos de vida. Há uma satisfação muito grande quando contribuímos para que uma pessoa possa vencer obstáculos, obtendo assim uma força de vontade capaz de levá-la a acreditar em si. Essa alegria é o maior tributo de um processo educacional.

    Mesmo com o risco das decepções, precisamos aprender a confiar nas pessoas quando elas estão convictas de que precisam mudar o destino com as próprias mãos em busca de melhores condições de vida. Pelos inúmeros casos que já testemunhei, posso afirmar que o carinho, a compreensão, a paciência, a tolerância, o amor ao que se faz, a ternura são elementos indispensáveis na promoção do ser. É preciso identificar as pessoas no espaço em que elas se encontram, reconhecer os seus propósitos, promover as habilidades e competências para o exercício da cidadania e nas realizações pessoais.

    Sei que este fato que relato aqui não será manchete de telejornais, pois não se trata de uma cena de violência, não tem margem de sensacionalismo. Porém cito para fundamentar a importância de não desistir dos sonhos.

    Após receber os cumprimentos de felicitações, o ex-aluno deixou a escola. Mais ou menos uma hora depois, ele voltou com uma cesta, na qual, havia flores e chocolates que ofertara a todos os profissionais que contribuíram para a sua conquista. Comi alguns chocolates da cesta com gosto de vitória. A gratidão tem o sabor da essência humana…

    Nenhum aluno é sem luz. Nenhum ser humano é opaco. Ser brilhante é a nossa vocação. Temos que fazer brilhar o que há em nós, pela autenticidade, pela consolidação do caráter. A aula de Eletricidade que recebi não expressava nenhum déficit de atenção. Há desatenção quando fazemos algo que não nos mobiliza, que não nos desperta interesse. É a dor que ensina a gemer. A necessidade abre a porta da superação. Ninguém é feliz sem acreditar em si.

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