Sonho da casa própria vira pesadelo no Conjunto Habitacional da Posse

Dezenas de famílias que moram no Conjunto Habitacional da Posse estão lidando com o descaso do poder público, desde o momento em que receberam os apartamentos. Os inúmeros problemas estruturais encontrados comprometem não somente a composição dos prédios, como também a segurança dos moradores. Em um cenário composto por vazamentos, rachaduras, sobrecarga elétrica e até doenças, quem vive lá pede, mais uma vez, a atenção dos órgãos públicos, para que a situação não se torne ainda mais alarmante.

Marilene França, de 62 anos, recebeu da Prefeitura a chave de seu imóvel em outubro de 2016. Em um primeiro momento, a total satisfação em conseguir o apartamento tão esperado. Entretanto, poucas horas após o recebimento, o sonho em ter um imóvel em boas condições foi “por água abaixo”. “A situação está totalmente precária. Quando estamos vendo TV na sala, por exemplo, vemos urina do apartamento de cima escorrendo pela nossa parede. Além deste, que é o pior, há vazamentos e infiltrações em grande quantidade na cozinha e no banheiro. Estou perdendo os meus móveis, está tudo mofando nesse ambiente”, lamentou.

O quarto da dona de casa é outro local atingido pelos problemas. Com o estado precário do cômodo, a mulher foi obrigada a colocar um colchão no chão da sala para dormir. “Meus problemas respiratórios aumentaram, faço rotineiramente o uso de bombinha para conseguir respirar. Isso, sem na pneumonia, que cada vez se agrava mais”. 

Indo de mal a pior também está toda a parte elétrica do prédio. As lâmpadas queimam a todo o momento. Na sala, a luz não acende. Já o banho, precisa ser à luz de vela. “Perdi minha casa no bairro Nossa Senhora de Fátima, em 2011. Mesmo diante das condições do local, nunca precisei ficar no escuro. Agora, com o apartamento novo, tenho problemas ao extremo. Troco lâmpadas a todo o momento, não tenho luz no banheiro, a campainha queimou no segundo dia por conta de instalação incorreta. Para ter ideia, nos primeiros dias, quando uma pessoa ligava um chuveiro, toda a luz do prédio apagava”, explicou.

E quem pensa que os problemas acabam aí se engana. Em alguns blocos ao lado, os entregues pelo estado, outros prédios sofrem com a mesma situação. “Tem um apartamento que a moradora não pode ligar o secador de cabelo, pois toda a iluminação do prédio acaba. Sofremos com problemas que vão desde entupimentos à laje cedendo”, disse Louise dos Santos, de 26 anos, que teme a queda de uma estrutura. “Moro no terceiro andar e minha laje deu uma barriga, próximo às caixas d’água. A preocupação é diária por aqui. A qualquer momento vai acontecer uma tragédia. Muitos estão cientes do problema, mas ninguém toma nenhuma medida para resolvê-lo”.

Recém-chegada na área, Juraci Maria Ribeiro, de 60 anos, levou um susto enquanto tomava banho no apartamento. “Entrei no imóvel este ano, em 2 de fevereiro. Quando fui tomar banho, do nada o chuveiro começou a pegar fogo. Foi um desespero para mim. Pensei que poderia causar um incêndio em todo o prédio. Houve sobrecarga elétrica. Fiquei completamente sem luz. Estou com a sensação que fizeram uma casa para bonecas e não para pessoas”, disse a mulher, que perdeu a casa às margens da BR-040 em 2011.

Já no apartamento da doméstica Solange Pompeo, de 46 anos, as mesmas reclamações se repetem. Porém, por lá as paredes já apresentam rachaduras e, segundo ela, as janelas podem cair de uma altura de quase quatro metros a qualquer momento. “Elas estão coladas com silicone em pequena quantidade. Há alguns dias, uma janela soltou e uma menina precisou segurar a estrutura, caso contrário, cairia em quem tivesse passando embaixo. No meu apartamento, por exemplo, os vidros da sala, quartos e cozinhas, que estavam colados de qualquer maneira, se soltaram, caindo na rua. Foi feito um serviço qualquer, que nos prejudica a todo o momento”, contou a mulher, indignada.

Obras se arrastaram por anos

O tão aguardado “Lar, doce lar” continua sendo motivo de preocupação. As obras do Conjunto Habitacional da Posse começaram em 2010, sendo paralisadas duas vezes. Dos 144 apartamentos, divididos em 12 blocos, 72 pertencem ao Governo do Estado e outros 72 são fruto de uma parceria entre o Governo Federal e a Prefeitura de Petrópolis. 

Com condições estruturais deficientes, muitos moradores esperam pela solução dos mais variados problemas. Segundo eles, há apartamentos da Prefeitura que ainda precisam de finalização da construção – o que não está acontecendo.“Minha mãe tem 82 anos e está aguardando pela moradia há 10 anos. A entrega estava prevista para abril deste ano, mas até o momento, nada. Não tem ninguém trabalhando no local, está tudo parado. Quando pedimos alguma resposta, o município fica em silêncio. Diante disso, minha mãe recebe a ajuda do aluguel social de R$ 500, mas está sendo obrigada a morar em uma casa de R$ 680. Está tirando do bolso um dinheiro que não pode. Descaso total com todos nós”, disse a filha Luzia da Silva, de 41 anos.

Desde a sua construção, o Conjunto Habitacional serviria como destino, principalmente, para as famílias que perderam suas casas nas tragédias que atingiram a região do bairro Nossa Senhora de Fátima, na Posse, além de Vila Rica, em Pedro do Rio, e também no distrito de Itaipava.. 

Moradores convivem com o abandono 

Às margens da Estrada Silveira da Motta, que liga a Posse à São José do Vale do Rio Preto, o local onde o condomínio está situado conta com unidade de saúde a 25 minutos de ônibus, mas muita gente reclama que é difícil conseguir atendimento.“É uma dificuldade absurda para conseguir atendimento médico no posto. Se for algo mais grave, mesmo só contando com essa unidade, nem sempre é possível ter algum tipo de socorro imediato. Estamos completamente abandonados por aqui”, disse Louise dos Santos.

Ainda a poucos metros da área destinada ao Conjunto Habitacional, um lago coloca em risco a vida de muitas pessoas. Com a água parada, suja e com mato em volta, o local se tornou propício para a proliferação de mosquitos. “Muitas pessoas sofreram com dengue nos últimos meses. Já reclamamos de todas as formas, e continuamos abandonados”. Na última semana, enquanto crianças brincavam em um campo de futebol, próximo ao lago, foram surpreendidos por uma cobra de aproximadamente um metro de comprimento. 

As denúncias de aparecimento de animais peçonhentos são constantes na vizinhança. “Já é a segunda cobra em duas semanas. Estamos preocupados. Não temos nenhum socorro imediato onde moramos . Só queremos ser vistos pelo governo”, concluiu um morador, que preferiu não ter a identidade divulgada.

A Prefeitura informou que a Secretaria de Obras fará uma vistoria nas unidades de responsabilidade do município para verificar as informações relatadas pelos moradores ao jornal. Os problemas, segundo os moradores, também foram, constatados em unidades de responsabilidade do governo do Estado. A Prefeitura informou que estes casos já foram informados pelo município à Companhia Estadual de Habitação (Cehab). A Cehab informou que fará a contratação de uma empresa que ficará responsável pela manutenção dos apartamentos. A Secretaria de Obras fará uma nova notificação sobre as reclamações dos moradores. A Cehab informou, em nota, que o processo referente ao Conjunto Habitacional da Posse encontra-se em fase de licitação para a conclusão dos serviços.

Sobre a unidade de saúde da Posse, a Prefeitura informou que os agendamentos para consultas são feitos normalmente. A unidade conta com três médicos de clínica geral, dois enfermeiros, dois técnicos de enfermagem, um dentista e nove agentes comunitários de saúde. “No último mês, um dos médicos solicitou transferência, mas a equipe já foi recomposta e o atendimento é feito normalmente”, garantiu o Município, em nota.

Sobre a água parada em lago próximo ao prédio, a Coordenadoria de Vigilância Ambiental já realizou ação de combate e prevenção a proliferação do mosquito transmissor das doenças no local. Uma nova ação será realizada para o controle da proliferação de larvas na região. 

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