Somos todos sapientes
Não sou um “intelectual” muito menos mais sapiente de quem quer que seja, mas cada um, em sua área, é sempre o máximo ou assim se julga – sabem de tudo mas não conseguem fazer nada certo. E estamos numa boa época para observar tal detalhe com tantos candidatos à vereança, uma vez que, muitos, não saibam nem a função de um edil?
Alguém me disse, certa vez, que eu precisava “aprender a trabalhar” mas, logo depois, deu com “os burros n´água” e está arrastando um fracasso até hoje. Portanto, inquestionavelmente, muitos sapientes deixem muito a desejar em suas áreas. E eu, não me abato, vou seguindo meu caminho sem qualquer pretensão e, como dizia o velho personagem de Chico Anysio, o “Quem-Quem” – “Morro teso mas não perco a linha.”.
Assim é a maioria das pessoas em seus segmentos profissionais, por mais importantes que sejam e até na política – bem, aí já é covardia e querer demais. Afinal, sou de antigamente e comecei minha alfabetização em 1940 quando aprendíamos, realmente, a escrever na língua “mater” (“Ivo viu a uva” – somente no vernáculo puro, sem gírias ou pornografias) e raciocinar sob o exercício da matemática. Hoje vejo pessoas aparentemente cultas com escritas sofríveis sem falar nos cálculos que só conseguem fazer com a mão na máquina. Portanto, há muito, o ensino deixou a desejar – tanto na ortografia como na matemática, esta, essencial para desenvolver o raciocínio. E não há o que se duvidar diante da realidade!
Mas agora vem o governo propor uma nova reforma no ensino pela enésima vez, seguindo conselhos de alguns eméritos sapientes, mesmo em prejuízo coletivo como já ocorre que, por índole, o jovem não gosta de se esforçar para aprender, terminando por não só criar “calos nos dedos” (conforme se referiu o prof. J. Eloy em recente crônica) mas também no cérebro pelo vício de não raciocinar – mas todos continuarão tão sapientes pois muito cedo são todos auto-suficientes em raciocínio (coisas da juventude, como sempre), verdadeiros gênios, sabem de tudo, se transformando até em músicos, compositores e cantores, mesmo só compondo sons sem melodia – seria só a modernidade? E o que esperar dessa nova reforma, se a maioria das pessoas além dos políticos não conseguem se expressar sem apelar para o chulo?
Por isto escrevi o sonetilho –“Arte de quinze minutos”:
“Com miojo torna-se especialista / se em quinze minutos se faz o almoço. / Com tintas e pincéis, em alvoroço, / em minutos, um quadro modernista.
E só com três notas, o instrumentista, / com rapidez compõe um som insosso; / e em quinze minutos, vate colosso / monta um grande poema iluminista.
Raciocínio saiu de uso e de moda, / rapidez e facilidade é norma, / pensar muito é cansativo e incomoda.
Por isto, ao se manter na plataforma / do belo, nenhum poeta se acomoda, / nem aplaude quando a arte se deforma.”
Como adepto do soneto clássico, rejeitado por muitos (dá muito trabalho), sempre justifico que tal estilo é um desafio como o alpinista enfrenta ao escalar uma montanha em vez de subir pela trilha, ou montar um quebra cabeça ou ainda, jogar xadrez. E, em função desta avaliação, descubro uma frase do professor francês Roger Frison-Rochée (1906-1999), também alpinista-guia, quando disse – “Infeliz de quem se deixa levar pelas coisas fáceis”. Ele não deixou, apesar de, com sua persistência, enfrentar e perder os dedos das mãos numa escalada gelada. jrobertogullino@gmail.com