Singelo coração
O que mais espantara nunca fora o espantalho. Este, pobrezinho, fora desmoralizado por uma nuvem de gafanhotos, despidos de qualquer cerimônia, fazendo banquete de seu corpo de palha. Junto com ele feneceu o milharal e todo o mais componente da lavoura do sitiante, o infeliz “seu” Juca. Confiava Seu Juca em uma boa safra já que o tempo favorável nada previa quanto a incidentes graves.
O que mais amedrontava “seu” Juca era a política sempre favorável aos poderosos e fazendo de conta que administrava para os menos favorecidos de tudo, como ele, por exemplo, modesto produtor rural de barraquinha na feira onde expunha e vendia o melhor produto oriundo do suor de seu rosto calejado pelo sol a sol, chuva a chuva, miséria a miséria e todos os etceteras e coisa e tal sinalizados e defendidos na legislação nacional.
Pagava ele – sim – todos os impostos, taxas, emolumentos, aluguéis, previdências, o feijão com arroz que não produzia e nada recebia de qualquer bolsa dessas que criaram uma nova concepção de trabalhador, do tipo “volto já”. Explicando: aquele que não vai e nem fica; nem corre nem anda; vegeta no barro mole, sem mexer qualquer palha e possui um cartãozinho mágico bem aceito pelas máquinas pagadoras dos bancos…
Dá para entender, pois não?! É, mas Seu Juca não entendia. Ele confiava – sim – no político quadrienal que sempre aparecia para conversar e anotar todas as necessidades das famílias dele e da vizinhança, enchendo os olhos cansados de todos com uma vitalidade comovedora quanto luminosa. Tapinhas nas costas, sorrisos, elogios não faltavam naquele momento de esperança que fazia bater mais acelerados os singelos corações, que sorriam desdentados e amolecidos com tanta honra.
O tempo vinha por detrás solapando as esperanças, minimizadas pelo conforto das mentiras fáceis e desumanas dos homens públicos de atitudes impublicáveis. Pois assim sempre acontecia! E, mais: Seu Juca não via nenhuma melhoria nos caminhos de buracos e lama, na distribuição da água, na iluminação que era do tipo vaga-lume: pisca-pisca e é fraquinha quando consegue acender; e quando chovia forte com raios brilhando, Seu Juca se encolhia dentro do barraco correndo o risco de cair a morraria em sua cabeça, como já havia acontecido algumas vezes.
De quem a culpa? E o político responde: – De Deus! Cobra dele! Claro que Deus nada tem a ver com isso. O verdadeiro culpado é o pobre Seu Juca, de pouca ou nenhuma pecúnia, porque continua votando nos mesmos de sempre. E, quando acerta e elege o predileto, este rasga a máscara e amplia as sinecuras e as abandalhas, numa criatividade infernal superior às maldades do próprio capeta.
Ah! Mas, o carnaval está aí; Seu Juca é deixado de lado porque a classe política está desfilando nas alas das escolas e dos blocos trajando as fantasias ilusórias da vileza, que mudam rapidamente a partir da quarta-feira, quando as cinzas morais esvoaçam sobre os detritos da insensatez.