• Sem conseguir prisão temporária de acusados de latrocínio, delegado desabafa: saíram pela porta da frente

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  • 02/09/2018 10:49

    O casal detido no último sábado suspeito de ter assassinado com nove facadas a comerciante Maria das Graças Carvalho Bravo, de 53 anos, dentro de uma padaria no Castelo São Manoel, em Petrópolis, na sexta-feira (31), foi liberado horas depois. Segundo o delegado titular da 105ª Delegacia de Polícia (Retiro), Cláudio Batista Teixeira, o pedido de prisão temporária, que tem parecer favorável do Ministério Público, não foi analisado pelo plantão judiciário da Vara Única de Paty do Alferes, onde o casal foi encontrado. O juiz Fabio Lopes Cerqueira considerou que não havia “justificada urgência” que exigisse apreciação do pedido de prisão no plantão. 

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    Um dia depois da decisão, o delegado fez um desabafo por meio de uma rede social. Lembrou o trabalho dos investigadores e citou que, enquanto o juiz citava resolução do Conselho Nacional de Justiça para dizer que não apreciaria a representação por não haver urgência, o casal admitia, na delegacia, participação no crime. O homem, segundo delegado, confessou ter matado a comerciante e a mulher admitiu sua participação na fuga. 

    No texto, Cláudio Batista Teixeira afirmou: “a decepção dos policiais envolvidos só não era maior do que a felicidade do casal com a notícia de que sairiam pela porta da frente da delegacia depois de terem entrado pelos fundos. Enquanto pensávamos como remediar trágica decisão, outros problemas urgentes se acumulavam no lotado plantão da 105ª Delegacia Policial de Petrópolis. Apesar da decepção e da desolação, não dava para interromper tudo porque a polícia nunca pode parar”. 

    Pouco mais de duas hora depois de postado em uma página da 105ª Delegacia de Polícia, o desabafo já tinha sido compartilhado 200 vezes. Em tom de decepção, o delegado afirmou que, naquele momento, chegou a repensar a profissão. “No momento onde um olhava para a cara do outro com tamanha desolação, fiz uma rápida recapitulação de tudo o que vivi nos cinco anos para analisar, como líder e gestor, onde errei e se devo parar”. 

    Em outro trecho, ele continuou: “a noite de ontem foi vencida com certa dificuldade, após a decepção com a não decretação da prisão. Fico martelando para tentar entender o que seria mais urgente do que uma prisão após um latrocínio com os dois supostos autores em declarada fuga e o que seria mais conveniente do que a prisão temporária para a coleta de todos os outros indícios não colhidos no local. Não tenho as respostas, mas fica a exata noção de que foi feito o máximo. Amanhã vou acordar novamente tentando fazer as escolhas corretas. Terei o prazer de chegar à 105ª Delegacia de Petrópolis e encontrar com homens e mulheres que escolhem não se esconder, que escolhem ser policiais e, mesmo com toda dificuldade estrutural e pessoal, encerram seus dias com a sensação de dever cumprido”.  

    O delegado finalizou lembrando a dura realidade enfrentada atualmente pela polícia do Rio. “Precisamos de uma medida urgente. Estamos sem papel, viaturas sem manutenção, salários defasados, desacreditados, mas somos homens atrás de cargos e sentimos a fragilidade do próximo, a carência de um povo que sucumbe à violência, que espera por mudanças desconhecendo o funcionamento emperrado da máquina pública. Precisamos da sensibilidade de poucos para entender que acima da lógica não ha mais nada que seja possível visualizar, que é preciso bom senso antes de exigir o deslocamento de quilômetros em viaturas ruins com efetivo menor para se fazer uma simples comunicação e a grandeza de se mergulhar nos fatos para apenas decidir. Esconder em falsas premissas, dar de ombros e afirmar não é problema meu não pode ser mais fácil do que fazer a diferença ao fazer apenas o que lhe é devido”.

    A Tribuna não conseguiu contato com o juiz  Fabio Lopes Cerqueira.

    Segundo a Associação dos Magistrados do Rio de Janeiro (AMAERJ), o pedido policial continha como único fundamento a necessidade de reconhecimento dos investigados pelas vítimas, sem justificativa de urgência. De acordo com norma do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o juiz do plantão judiciário só tem autorização legal para analisar esse tipo de representação quando há justificada urgência. Caso contrário, o processo deve ser remetido ao juiz natural da causa. 

    Em nota, a AMAERJ ressaltou ainda que não constava da representação policial a relevante informação de que os investigados já haviam sido presos e tinham confessado o crime:  “Causa espécie ainda a detenção dos suspeitos, uma vez que a prisão só é legal em hipóteses de flagrante ou mediante ordem judicial. E que a Polícia Civil tenha divulgado dados sigilosos de inquérito policial nas redes sociais, e não os tenha informado ao magistrado”.



    Leia o depoimento: 









       


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