• Segundo domingo de maio

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  • 09/05/2021 08:00
    Por Ataualpa Filho

    “Mãe é mãe”. E pronto. Nenhum adjetivo tem a amplitude conceitual para qualificar o ser “mãe”.

    “Mãe é tudo”.  Esse “tudo”, na frase, exerce função adjetiva com sentido vago. E se alguém diz que “mãe é tudo de bom”; o “tudo de bom” precisa de um referencial: o bom para quem? Para quê? Em que condições? O “bom” está em uma posição relativa.

    “Mãe é mãe”.  Em qualquer sentido que se faça a leitura, a significação se mantém em equilíbrio. E aqui dou por encerrada esta reflexão.

    Este texto, por conseguinte, escrevo-o para dizer que, diante dos comerciais que invadem os meios de comunicação, tentando sensibilizar os consumidores, apelando para o sentimento materno, não sou um bom filho. Nunca dei à minha mãe um celular, nunca abri crediário para dar a ela um presente. Mas foi ela que me ensinou a colocar o chapéu só onde a mão alcança, nem fazer referência com o chapéu alheio.

    Nunca fui ao shopping levado pelo modo imperativo dos verbos das publicidades que tornam “o dia das mães” uma simples data para aquecer o consumo. Acho isso um abuso da imagem materna. O pior é que esse fato contribui para comportamentos demagógicos, hipócritas: alguns filhos passam o ano tratando mal a mãe e nessa data, apresentam-se afetuosos, oferecendo presentes sem nenhum sentimento verdadeiro. As mães não são idiotas. Sabem discernir um gesto de carinho, por mais simples que seja.

    Quando vejo uma mãe chorando sobre o corpo de um filho assassinado, ou humilhada numa fila de um presídio para ser revistada, porque deseja visitar o filho que foi preso por furto, roubo ou tráfico, ou levando-o para casa bêbado, drogado, tenho a verdadeira noção do imensurável amor materno. Nenhuma mãe desiste do filho. Principalmente na dor, enxerga-se a força do amor de mãe. Vide Maria ao lado do Filho Crucificado.

    O maior presente que um filho pode ofertar a uma mãe consiste em ter uma vida digna, que possa proporcionar a ela o orgulho de tê-lo colocado no mundo. Todas as mães trocam qualquer presente pela satisfação de ver, no fruto do seu ventre, um exemplo de vida. Não se compra o amor de mãe, não está exposto nas vitrines.

    Não fiz nenhuma estatística, mas me atrevo a afirmar que ninguém é feliz por agredir a própria mãe. Nos barracos ou nas mansões, o calor do amor materno é o mesmo. Mãe não tem cor, nem classe social. O que se encontra na essência materna é o amor. Não basta parir para ser mãe, é preciso amar imprescindivelmente, condição sinequa non: mãe – ame. Mamãe – a amem, amém. Até a palavra Mãe é poética em si, não precisa ser lirificada.

    O amor é a parte divina do ser mãe. “Deus é amor; e quem está em amor está em Deus, e Deus nele” (1Jo 4:16). Qualquer atitude relacionada às mães, sem um gesto de amor, soa como hipocrisia.

    Mães nos hospitais com o filho doente no colo, ignoradas nas maternidades. Não dá para envernizar essas cenas tristes por meio dos comerciais da TV, mostrando “tudo lindo e maravilhoso”. A sociedade de consumo aguça o prazer e esconde a realidade.

    – A minha mãe é a melhor mãe do mundo como todas as outras.  Mãe, desculpe esse meu jeito duro de dizer te amo. Mas foi a senhora que me educou assim, nunca quis que eu usasse óculos escuros. Vejo a realidade à luz do dia.

    O segundo domingo de maio é somente o segundo domingo de maio. O dia das mães começa na gravidez e vai pelo resto da vida, mesmo quando a mãe tem a profunda dor de levar o filho ao túmulo.

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