• Saúde Mental: Vamos falar sobre isso?

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  • 19/fev 08:00
    Por Vanisa Santos

    “O outro sou eu?”

    “Diz-me com quem andas que te direi quem és…”

    Que verdades sobre nossas escolhas inconscientes esses ditos comportam?

    Não somente é preciso nos havermos com o fato de que as pessoas com quem escolhemos conviver é uma escolha de nossa responsabilidade como é preciso reconhecer que só escolhemos tais atores por eles se engancharem em nossas idealizações e cristalizações sintomáticas.

    Escolhemos a dedo os atores que melhor consigam representar as cenas que compõem nossas fantasias masoquistas inconscientes e que estão alinhadas com nossos sintomas. Aliás, é esperado que os atores performatizem cenas em que nos sentimos humilhados, culpabilizados e que nos façam sofrer. Eventualmente, as ações se invertem e o humilhado passa a ser o algoz e assim seguem os intérpretes das cenas, num troca troca de papéis.

    Durante o processo de cura ativa pela reescrita do texto que vai se modificando, conseguimos revisitar e até refazer nossas escolhas, atribuindo aos atores novas funções e papéis.

    É importante sabermos que o Outro é nosso próprio inconsciente e que ele opera em nós como um diretor de cena. Sabendo disso, podemos reconhecer melhor os mecanismos que compõem nossas escolhas inconscientes para podermos mudar o rumo da história que vinha sendo escrita em nós e por nós. Com a revisão dessa escrita em curso, provavelmente será preciso mudar os personagens, ou designar-lhes novos papéis.

    Parece cruel, mas é preciso nos havermos com o sofrimento de que nos queixamos e cuja responsabilidade atribuímos exclusivamente aos outros, ou melhor, aos personagens que nós mesmos criamos.

    Reconhecer isso, talvez nos liberte para enxergarmos que nossos algozes somos nós mesmos. E isso acontece todas as vezes em que algo de nossas verdades particulares escapa.

    Se resolvemos retirar um personagem da história, ou designar-lhe um novo papel, é porque algo em nós mudou e aquele personagem ou aquela cena já não faz mais sentido, mas nada garante que tal mudança acontecerá para o bem de todos.

    Livrar-nos do peso de não sermos nós mesmos pode nos tornar mais solitários e silenciosos, porém mais leves, mais bem acompanhados, melhores leitores e até escritores mais precisos.

    Saber escolher com quem queremos contracenar o poema que nos tornarmos é um exercício ético diário.

    **Sobre a autora: Vanisa Moret Santos é poeta, escritora, psicanalista membro do Fórum de Psicanálise da Escola do Campo Lacaniano do Rio de Janeiro, professora do Curso de Especialização em Psicologia Clínica da PUC-RJ, mulher, mãe, dona de casa, autora do livro, Mães faltosas crônicas e outras histórias, lançado pela Editora Atos & Divãs em 2021.

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