Saúde Mental: Vamos falar sobre isso?
Pode um livro salvar vidas ?
O Primeiro Festival Literário Internacional de Petrópolis (Flipetrópolis 2024) foi um verdadeiro sucesso! Organização e programação impecáveis. Convidados e convidadas deixaram marcas significantes em cada participante.
Como uma das autoras que se inscreveu no evento através do formulário online para lançar e autografar livros, agradeço aos curadores, Afonso Borges, Gustavo Grandinetti, Leandro Garcia, Leo Cunha, Sérgio Abranches e Tom Farias pela ideia brilhante e generosa de possibilitar aos escritores locais e menos conhecidos do grande público a oportunidade de participarem de um evento da importância de um Festival Literário Internacional como o que aconteceu em Petrópolis, do dia primeiro ao dia cinco de maio.
Foram dias de muito aprendizado, de muita emoção. O poder revolucionário, transformador e historicizante da escrita literária foi bastante abordado, confirmando o papel da escrita na reconstrução de histórias particulares e de como as pessoas atravessam e são atravessadas pelos fatos históricos em seu tempo e lugar.
Escritor, roteirista, dramaturgo e colunista da Folha de São Paulo, Tom Farias (@tom_farias_oficial) fala da escrita como um trabalho de transpiração diário que deve ser levado a sério. Sua obra literária reafirma o poder revolucionário e político de uma escrita, além da posição ética do autor que não recua diante das injustiças sociais. Parece que é disso que o autor trata no livro que lançou no festival, Toda fúria, publicado pela editora Gutenberg/SP cuja leitura iniciarei em breve.
Por ora, gostaria de falar das emoções que o festival deixou em mim. Não foram poucas as sensações que as diversas falas dos autores e autoras suscitaram em mim, resultando em uma questão: “pode um livro salvar vidas?”
Havia pensado em outra questão, “o que é um livro de sucesso?”, mas achei pouco pertinente para a resposta à que cheguei, depois de muito refletir. Afinal, todo livro publicado já é por si só o resultado do sucesso de muitas ações. Então, resta a pergunta sobre “o que é um livro e se ele pode salvar vidas”. Tentarei responder a isso neste artigo inacabado.
Meu atravessamento pela psicanálise em intenção e em extensão me faz pensar que um livro é uma coisa séria, especialmente, se faz série. Entretanto, é preciso que isso se confirme no leitor. Um livro é algo que faz p’arte de uma mudança real que começa com o movimento das pulsões de dentro do/a autor/a, mas que só se confirma como obra literária se houver o reconhecimento de seu valor de flecha pelo leitor. Não basta atingir sua mente, é preciso invadir sua alma, mobilizar emoções, chegar a algum reduto obscuro do coração e trazer algo desse lugar à luz.
Um texto só será interpretado como pertencendo ao leitor/a se algo dele/a for identificado nisso, nesse livramento. Se isso acontecer, o/a leitor/a seguirá reeditando o texto do outro, apropriando-se disso que lhe restar como valor. Vai estampar o dito em broches, imãs de geladeira, canecas, camisetas, quadros, postes de luz, coisas banais, objetos degradados do cotidiano que se prestam para disfarçar a coisa indisfarçável que aponta para a verdade. Pode virar tese, objeto de pesquisa, pretexto pra criação de outras obras.
Para o leitor, um livro pode se tornar um estranho objeto familiar de salvação. Dele, o leitor se servirá para produzir alguma coisa genuinamente sua, geralmente, um saber a mais sobre si. Nesse aspecto, um livro ocupa um lugar muito parecido com o do analista, embora não operem da mesma forma. No entanto, um livro, ao ocupar o lugar de objeto de ar’te, tem o poder de arejar salas obscuras, iluminar cenas, causar desejo de saber e renovar enigmas.
Para muitos, escrever e tornar públicas ideias, pensamentos, sofrimentos, traumas, catástrofes e tragédias é a única forma de se fazer re-existir, de dar dignidade aos seres humanos apagados da história. Foi isso que aprendi com os autores e autoras convidado/a(s), especialmente, depois de escutar a escritora ruandesa, Scholastique Mukasonga que perdeu 37 entes de sua família no genocídio em Ruanda, em 1994.
Livro é livramento, uma forma humana de re-existência.