• Rio Branco olímpico

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  • 20/08/2016 11:00

    O que você diria, caro leitor, de um homem público que tivesse suas dívidas pessoais pagas com dinheiro público? Nossa primeira reação é de repulsa, dado o quadro atual da vida política do País, e tantos pretendentes a enfiar a mão (nada) boba nos recursos do erário. Não obstante, esse homem existiu e foi, nada mais nada menos, que o Barão do Rio Branco. E – pasme! – tudo por iniciativa da própria população da cidade do Rio de Janeiro. Vamos aos devidos esclarecimentos.

    Certamente, não existe uma modalidade olímpica que desse medalha de ouro a “atletas” da disputa territorial pacífica entre nações. Ainda hoje, assistimos guerras violentíssimas entre povos disputando um pedaço de chão. Mas, se existisse, o nosso Barão levaria o ouro, com vários corpos de vantagem em relação a eventuais concorrentes. Eu me explico: ele conquistou para o Brasil, pacificamente, através de acordos internacionais, mais de 900 mil km2.   Um feito memorável que ampliou o território nacional em “apenas” 10%. 

    Como conseguiu a proeza de fundamentar tão bem esses acordos com base no princípio do direito internacional do uti possidetis, ou seja, do direito de posse de quem comprova ter chegado antes e ocupado a terra? E aqui vai uma explicação que tem sabor de uma desculpa para viver a boa vida parisiense. E que, de fato, não era. Sempre que o Barão, cônsul do Brasil em Liverpool, encontrava com algum brasileiro em Paris, disparava: “Cheguei ontem e volto amanhã para o consulado.”  Claro que nem sempre voltava no dia seguinte. Nessas estadas em Paris, ele usou sabiamente seu tempo para pesquisar mapas e outros documentos que tão bem fundamentariam seus acordos com países vizinhos na definição final de nossas fronteiras terrestres.

    Numa das mais memoráveis disputas com a Argentina, referente ao território das Missões, arbitrada pelo presidente Cleveland dos EUA, o embaixador argentino resolveu “comprar” os delegados americanos, oferecendo-lhes jantares e presentes. Rio Branco simplesmente trancou-se em seu escritório em Washington, na montagem da brilhante peça de defesa da posição brasileira. Produziu um texto primoroso, consubstanciado por provas e documentação irrefutáveis que levou o presidente Cleveland a dar ganho de causa ao Brasil. Isto lhe valeu a inimizade eterna do embaixador argentino arrasado com a nossa vitória. E assim foi a excepcional trajetória das defesas de Rio Branco das zonas de litígio entre o Brasil e os muitos países com que temos fronteiras. 

    Retomemos, agora, o fio da meada inicial das dívidas do Barão. O lema de Rio Branco era “Ubique patriae memor”, ou seja, “em toda parte, a memória da pátria”. Justamente por pensar no Brasil o tempo todo, não prestou muita atenção em suas finanças pessoais. Ao final da vida, estava muito endividado. A população do Rio de Janeiro, sabedora das dificuldades por que ele passava, propôs que fosse votada na Câmara Federal uma verba especial para pagar suas dívidas. Merece registro o fato de que tudo isso, diferentemente de hoje, foi feito às claras, com plena aprovação dos contribuintes de então. Foi um reconhecimento público pelos serviços prestados à Pátria. 

    Rio Branco, quando vinha a Petrópolis, era recepcionado pela popula-ção da cidade com flores e aplausos. Por mais de uma vez, ele foi convidado a ser presidente do País, e sempre recusou a honraria. Era ainda um exímio conhecedor das chamadas efemérides. Em qualquer dia do ano, ele sabia de cor o que havia acontecido de importante naquele dia na história do Brasil. E na história de Portugal, conhecedor profundo que era desta última. Rio Branco foi, e sempre será, uma espécie de campeão olímpico na defesa dos interesses do País. Em sua cabeça, só havia um pensamento – Brasil.

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