‘Queremos atrair mais recursos do setor privado’, diz presidente do BID
Presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) desde outubro de 2020, o americano Mauricio Claver-Carone acredita que o Brasil e demais países da América Latina têm uma oportunidade única de se reposicionar no comércio global. Na visão dele, existe uma tendência de as multinacionais realocarem parte da produção para países mais próximos do Ocidente, como forma de evitar problemas no fornecimento de peças e insumos vindos da Ásia.
Em entrevista, Claver-Carone diz que pretende financiar projetos que substituam parte da produção feita hoje fora da região. Para isso, ele tem liderado uma reforma no BID Invest – braço de investimentos do BID voltado para o setor privado – e um aumento de capital, já aprovado pelos países membros. Em meio à turbulência global, diz o presidente do BID, “o mundo está vendo a América Latina e Caribe como um certo mar de tranquilidade”.
Qual o objetivo do aumento de capital do BID Invest, anunciado recentemente?
Uma das minhas críticas antes de entrar no BID era de que, para cada dólar que o BID Invest investia, só eram mobilizados 40 centavos do setor privado. Um dos meus objetivos era chegar, pelo menos, a uma razão de um para um. O que apresentamos para os nossos governadores (como são chamados os representantes dos governos da região no conselho do BID) é um novo modelo de fazer negócios, que é o BID Invest 2.0. É tornar o BID Invest em um banco de mobilização.
Como isso funcionaria?
Nós originamos (os financiamentos), reduzimos o risco, oferecendo garantias – o que é essencial, especialmente para um país como o Brasil – e distribuímos os portfólios de investimento. Somos uma das únicas instituições no mundo com classificação de risco AAA, que têm status de credor preferencial. Podemos usar nosso status de credor preferencial para mobilizar ainda mais recursos. É aí que se consegue o efeito multiplicador. A ideia teve um amplo apoio e foi bem recebida, incluindo por investidores privados.
Pretendem trabalhar com bancos locais também?
Sim, absolutamente. E, obviamente, queremos trazer investidores institucionais. Esses investidores têm uma proximidade maior com o país. Eles sabem onde estão as lacunas.
Qual será a quantia do aumento de capital do BID?
O objetivo é igualar a participação do capital público e do privado no nosso balanço. Do lado do capital público, fazemos entre US$ 14 bilhões e US$ 15 bilhões (em investimentos), dependendo do ano e das taxas de juros. No ano passado, foram US$ 14 bilhões. Se conseguirmos atrair outros US$ 14 bilhões do setor privado, poderíamos nos tornar instituição de quase US$ 30 bilhões.
Quais são as áreas prioritárias dos investimentos?
Infraestrutura digital, energia renovável e infraestrutura de saúde são as principais. Acrescentaria ainda mais uma, que é o nearshoring (a terceirização da produção para países vizinhos ou próximos). Nunca vamos ver outra oportunidade como estamos vendo hoje. Os fechamentos de indústrias de base na China e, agora, os desafios de fornecimento de energia e comida depois da invasão da Rússia à Ucrânia provocaram uma reavaliação dos riscos. Nós fizemos US$ 4 bilhões em investimentos em projetos de nearshoring no ano passado.
Quais projetos são esses?
De todo tipo. Dos US$ 4 bilhões, US$ 2 bilhões foram para projetos no lado governamental. Em apoio à melhoria da logística. Outros US$ 2 bilhões foram para projetos do setor privado, incluindo em energias renováveis.
Existe demanda para esses projetos e investimentos?
Em meio à turbulência por causa do fechamento de cadeias de suprimento na China, na Ásia, e por causa da invasão da Rússia à Ucrânia, na Europa, o mundo está vendo a América Latina e Caribe como um certo mar de tranquilidade. Obviamente, há eleições e riscos políticos, que sempre existiram, mas os investidores estão reavaliando esse risco. Qualquer risco político agora na América Latina e no Caribe é visto como algo menor.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.