Queimada destrói 80% da cana do Instituto Agronômico de Ribeirão Preto: ‘Frustração’
O Centro de Cana do Instituto Agronômico, em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, teve 80% das plantações de cana-de-açúcar destruídas por causa das queimadas no interior de São Paulo a partir da sexta-feira, 23. A perda de 120 dos 150 hectares de plantação do instituto deve provocar entre um e dois anos de atraso nas pesquisas que estavam em andamento.
No total, foram contabilizados até terça-feira, 28, 44,6 mil hectares de área queimada, resultando na destruição de muitas instalações, perda de animais e lavouras. Nos últimos dias, o Estado não tem registrado novos focos de incêndio, mas é prevista nova alta de temperatura até o fim de semana, com 48 municípios em alerta.
Muitas dessas pesquisas estavam próximas de serem finalizadas e seriam colocadas à disposição dos produtores. Havia, por exemplo, novas variedades da cana sendo estudadas, que poderiam gerar ganhos de até 20% em relação ao que é usado hoje pelos produtores, segundo Marcos Landell, engenheiro agrônomo, pesquisador e diretor do Centro de Cana do Instituto Agronômico. “Esse ganho não vai ser mais incorporado pelos próximos dois anos”, ele prevê.
O terreno do Centro de Cana tem, em seus 150 hectares, ensaios e experimentos instalados que são fonte para o desenvolvimento de novas tecnologias para a agricultura nacional e mundial. “Nós temos, por exemplo, um trabalho muito grande na seleção de novos tipos de cana, feita por meio do melhoramento genético da cultura. Há também estudos na área de administração das plantas e na área de manejo de pragas e doenças”, completa Landell.
O interior de São Paulo concentra a maior produção de cana de açúcar do País, com fábricas de etanol, açúcar e álcool, e usinas de energia elétrica. Ribeirão Preto é uma das regiões mais afetadas pelas queimadas no Estado, com diversos focos de incêndio e pessoas tendo que deixar suas casas em razão das proximidades das chamas.
Para recuperar o canavial, o Instituto Agronômico terá de cortar a cana afetada, uma vez que o que sobrou pode estar contaminado com microorganismos, tornando as plantas inviáveis para as produções de etanol e açúcar, diz o engenheiro agrônomo.
“Vamos ter de começar tudo de novo, produzir mudas, deixar brotar. Isso significa perda de renda [para os produtores]”, afirma Lendell.
Ele avalia que será possível recuperar parte do prejuízo, mas com atraso. “Vamos perder a informação deste ano, ter de repetir no ano que vem. E não vamos conseguir colocar à disposição todas as tecnologias que queríamos liberar até março de 2025”, diz o pesquisador e diretor do Centro.
Para Lendell, retirar a cana queimada tem um significado ainda maior, já que ele foi um dos pesquisadores que implementaram o método de colheita crua da cana-de-açúcar no País, nos anos 1990.
Antes, os produtores usavam um método de colheita em que precisavam queimar as próprias plantações. Hoje em dia, no Estado de São Paulo, esse método não é mais utilizado por se mostrar menos eficiente perante a colheita crua, processo desenvolvido com a finalidade de eliminar a queima da cultura, diz o engenheiro agrônomo.
“Imagina a minha frustração, depois de 30 anos [da implementação do processo de colheita crua], de voltar a colher essa cana queimada, em função desse acidente”, relata. “Insisti para que a gente partisse para um modelo como esse. Passamos a ter, a partir da década de 1990, uma visão de sustentabilidade”.