• Presos na fronteira: o drama de brasileiros e americanos que tentam fugir de Gaza

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  • 16/10/2023 19:36
    Por Redação, O Estado de S. Paulo / Estadão

    Em meio a temores de uma incursão de Israel contra o Hamas na Faixa de Gaza para retaliar os atentados terroristas do dia 7, estrangeiros aguardam há dias a movimentação diplomática de vários países para que o Egito abra a passagem fronteiriça de Rafah, no sul do enclave palestino, para deixar o local, que desde a semana passada é alvo de um cerco das Forças Armadas israelenses.

    Pelo menos 28 brasileiros sofrem há dias para deixar a Faixa de Gaza em segurança. O grupo conseguiu chegar ao sul e está concentrado entre as cidades de Rafah e Khan Younis, perto do Egito, mas se deparou com a fronteira fechada. Junto com eles, o governo tenta resgatar mais seis palestinos que têm residência no Brasil, mas ainda não conseguiu embarcá-los.

    Hasan Rabee está na lista de resgate do governo brasileiro e conta que a situação é dramática. Em um vídeo nas redes sociais, ele relatou que saiu para procurar pão – alimento cada vez mais raro em Gaza – e tentar carregar o celular quando se deparou com uma explosão.

    “Saí para carregar o celular, pegar água e pão, mas não consegui pão ainda. Atacaram uma casa de civis, tem bastante gente ferida, o resgate ainda não está funcionando, os hospitais colapsaram, pessoas feridas estão correndo na rua. Infelizmente, está muito difícil. Cai bomba de todos os lados, a casa da esquina foi completamente destruída”, contou.

    Avião de prontidão

    Um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) aguarda em Roma, na Itália, a abertura da fronteira entre a Faixa de Gaza e o Egito para buscar os 28 cidadãos brasileiros. O grupo tem 14 crianças, 8 mulheres e 6 homens – 22 deles nasceram no Brasil, três são imigrantes palestinos e três são palestinos que possuem cidadania brasileira.

    No sábado, 14, após Israel pedir um esvaziamento do norte de Gaza, ameaçando novos e mais intensos ataques na região para tentar resgatar os israelenses feitos de reféns pelo grupo terrorista Hamas, o governo brasileiro contratou ônibus para transportar os brasileiros, que estavam na Cidade de Gaza, no norte do território palestino, até o sul.

    Três homens, três mulheres e quatro crianças estão, agora, em Rafah, cidade palestina de onde se pode ir andando até a fronteira com o Egito. Os outros três homens, cinco mulheres e dez crianças estão em Khan Younes, há 10 quilômetros da fronteira. O embaixador do Brasil na Palestina, Alessandro Candeas, passou a relação de pessoas e confirmou ao Estadão que elas estão bem, alojadas em casas alugadas pela Embaixada.

    Assim que autorizada a passagem dos brasileiros, o avião da FAB deve se deslocar até o Egito para fazer o resgate, informou Candeas e o Itamaraty. Enquanto isso, os brasileiros têm recebido apoio psicológico da Embaixada. Uma profissional da psicologia foi contratada em Gaza para fazer o acompanhamento das famílias.

    Americanos presos em Rafah

    Não são só os brasileiros que sofrem com a indefinição em Rafah. Antes do amanhecer de segunda-feira, 16, a Embaixada dos EUA em Jerusalém enviou um e-mail aos cidadãos americanos presos na Faixa de Gaza, sugerindo que se dirigissem à fronteira com o Egito e oferecendo a perspectiva de fuga.

    No entanto, não se tratava de uma promessa. Um fim de semana de negociações diplomáticas para abrir a fronteira entre o Egito e Gaza, até o momento, não rendeu muito além de confusão, mesmo na embaixada. O e-mail sobre a abertura da fronteira não citava conversas com o Egito ou Israel – baseava-se em notícias.

    A falta de clareza ficou clara no local. Na segunda-feira, dezenas de pessoas carregaram malas e sacos de lixo com os pertences pessoais que puderam levar para a única passagem da fronteira com o Egito, apenas para encontrar os portões do lado de Gaza fechados e ficarem presos à espera de esforços diplomáticos que não deram certo.

    “Será que nunca vamos sair daqui???” Lena Beseiso, 57 anos, uma americana presa perto da passagem, na cidade de Rafah, escreveu em uma mensagem de texto para um repórter. Foi a segunda vez nos últimos sete dias que ela e sua família foram para a fronteira na esperança de escapar antes da ameaça de invasão israelense em Gaza.

    A confusão em Rafah foi apenas uma das vertentes do caos que tomou conta de Gaza desde que Israel impôs um bloqueio total e lançou ataques aéreos de retaliação após o ataque do grupo terrorista Hamas em 7 de outubro, que matou mais de 1.400 pessoas em Israel.

    Os ataques aéreos mataram 2.750 pessoas, segundo o Ministério da Saúde da Palestina, e mais de meio milhão de habitantes de Gaza atenderam aos avisos israelenses de uma invasão iminente e fugiram de suas casas para o sul do enclave.

    Israel cortou o fornecimento de combustível na semana passada, e não há mais energia suficiente para abastecer a única usina elétrica de Gaza. Isso, por sua vez, desligou as usinas de dessalinização, deixando o território com suprimentos de água cada vez menores.

    As lojas foram esvaziadas de alimentos e suprimentos básicos. A ONU disse na segunda-feira que Gaza estava até mesmo ficando sem sacos para cadáveres.

    Fadel Waheed, um engenheiro de software, fugiu com sua família da Cidade de Gaza, no norte, e também foi para a cidade de Khan Younis, no sul, há alguns dias. Eles não conseguiram encontrar um lugar para ficar, então ele passa a noite com dois de seus filhos em seu carro estacionado, enquanto seus outros dois filhos, sua esposa e seu pai dormem amontoados em um apartamento de 1.000 metros quadrados com dezenas de parentes.

    Todos estão com fome. Quando o Waheed, 33 anos, conseguiu comprar macarrão em uma loja, ele e sua família tiveram que comê-lo seco – não havia gás para ferver água. O motorista de um caminhão de água permitiu que ele tomasse alguns goles do tanque por meio de uma torneira, mas se recusou a lhe vender água. Ele não troca de roupa há dias.

    “O dinheiro não tem valor”, disse Waheed em uma entrevista por telefone. “Haverá uma grande luta por água, comida e até remédios em dois dias.”

    Ele acrescentou: “Estou faminto, humilhado, desmaiado, oprimido e paralisado”.

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