Preço ainda mantém hidrogênio verde longe do mundo real
A distância entre a sustentabilidade energética e o mundo real ainda é muito grande, e a substituição pelo hidrogênio verde será mais lenta do que se imagina, principalmente no Brasil, onde o marco regulatório do combustível não foi aprovado. A grande barreira ainda é o preço, avalia o presidente e um dos fundadores da Associação Brasileira de Hidrogênio e Combustíveis Sustentáveis (Abhic), Sergio Costa, que mesmo assim destaca que o País não está parado, e tem sim potencial para ser grande exportador do “novo petróleo”.
De acordo com levantamento da McKinsey & Company, nos próximos 20 anos o Brasil deve receber US$ 200 bilhões em projetos de hidrogênio verde. Costa aponta pelo menos 10 empreendimentos em andamento que somam mais de US$ 20 bilhões, a maioria no Nordeste, atraídos pela geração de energia elétrica renovável. A gigante Petrobras entrou agora nessa corrida, o que poderá acelerar o processo. Mas, assim como outras petroleiras, tem mais observado do que investido, destaca Costa.
“As ‘big oil companies’ não estão com a estratégia de correr com a transição energética, como as europeias Shell, BP, e TotalEnergies. As grandes empresas americanas, que são a Exxon e a Chevron, basicamente têm uma estratégia de sentar e esperar para ver”, disse Costa ao Broadcast(sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado).
Assim como o petróleo, o hidrogênio verde é usado para produzir derivados, como amônia e metanol, que podem ser utilizados em várias indústrias, como a de fertilizantes e transporte. Somente no Ceará, os projetos de hidrogênio verde têm previsão de gerar 10 gigawatts (GW) de energia para fazer a eletrólise (processo que separa o hidrogênio do oxigênio da água), alguns já levando em conta a instalação de usinas eólicas “offshore”.
Uma das preocupações de Costa, porém, é a energia intermitente das renováveis do Nordeste, o que pode encarecer o custo de produção do hidrogênio verde.
“Em projetos de energias renováveis eólicas e solar, o custo caiu muito e é por esse motivo que teve entrada tão grande dessas fontes. Só que na indústria foi feito um desacoplamento da operação. A galera lastreia essas fontes pelo custo de implantação, mas sem o custo de operação. Quanto custa para implantar e operar? Toda vez que você entra em fontes renováveis, você tem que ter um custo para cobrir com outra fonte de geração para não faltar energia”, explica o executivo.
Azul
Por produzir muito gás natural, os Estados Unidos têm se dedicado mais à produção do hidrogênio azul, que consiste na captura do carbono do hidrogênio produzido com o combustível fóssil. “Eles estão avançando, mas lá tem uma visão diferente, eles estão focados no hidrogênio azul, porque eles têm muito gás natural e eles capturam o carbono e fazem o hidrogênio azul para substituir o hidrogênio cinza (de petróleo)”, informa, ressaltando que nos EUA, mesmo os fundos de investimento ditos “green” (verdes), têm ativos de petroleiras para garantir a rentabilidade.
Costa informa que o quilo do hidrogênio cinza custa hoje de US$ 1,50 a U$ 2,00, enquanto o hidrogênio verde está na faixa de US$ 5,00 a US$ 6,00 o quilo, dependendo do método. “O preço é quatro vezes maior, e como podemos tirar esse ‘gap’? Com o avanço tecnológico e com a melhoria da produção do hidrogênio, como aconteceu com a eólica e a solar”, diz.
Regulação
Para ele, é fundamental que o Brasil aprove o marco regulatório do setor até meados deste ano, para que os projetos comecem a sair do papel, e que, além disso, o governo consiga dar um tratamento tributário diferenciado para estimular o crescimento do novo combustível.
“Você cria o marco regulatório, mas tem que criar as condições para se desenvolver. Tem a possibilidade do Brasil se tornar um grande exportador, os derivados do hidrogênio virarem uma commodity, já que você vai produzir uma série de combustíveis a partir do hidrogênio”, afirma. “Como tributar uma indústria que não existe? É melhor ganhar menos e deixar a indústria crescer e aumentar o tributo no futuro”, sugere.
Costa avalia que por falta de estrutura de gasodutos no País, é possível que ao contrário da Europa, que está adaptando seus gasodutos para receber hidrogênio, os projetos no Brasil se mantenham nas regiões portuárias, com as exportações ajudando a criar um mercado interno de hidrogênio verde.
“A nossa estrutura no Brasil de gasoduto é muito fraca. No Brasil deve acontecer por ‘hubs’. As fábricas de hidrogênio vão estar muito próximas aos que vão consumir ou exportar o combustível. Por isso os estudos nos portos que Ceará, Piauí, Bahia e Pernambuco estão fazendo. Para quando sair a regulação [do hidrogênio verde], poderem prosseguir sem perder o ‘timing'”, conclui.