• Pontes entre ilhas

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  • 09/10/2017 17:25

    Às vezes, imagino o trabalho dos educadores como sendo semelhante ao trabalho dos operários que têm a árdua tarefa de construir pontes entre ilhas. 

    Hoje é visível o crescimento do número de pessoas que vivem em função do próprio umbigo, ou seja, querem tonar-se ilhas, isolam-se, só se preocupam consigo. São adeptos do chamado marketing pessoal, que facilmente se esvazia na perecividade da aparência.

    Nesse contexto da exaltação do ego, por intermédio das redes sociais, cresceu também a exposição da vida privada. “Postam” fotos e fatos que deveriam ficar no sigilo da intimidade. No entanto, ganham ares publicitários.

    O neologismo “selfie”, derivado da palavra da língua inglesa self com o sentido de próprio, ganhou espaço pela prática constante do autorretrato, popularizada pelo uso febril de smartphone. 

    “Personal” é outro vocábulo que está sendo incorporado à nossa língua no campo semântico da individualidade, da exclusividade.  Paga-se para ter um “personal-trainer”, “personal stylist” até “personal bank”.

     John Donne afirmara “Homem algum é uma ilha completa em si mesma; todo homem é um fragmento do continente, uma parte do oceano. A morte de cada homem me enfraquece porque sou parte da humanidade; assim, nunca perguntes por quem o sino dobra; ele dobra por ti”.

    Creio que inspirado nessa afirmativa, Thomas Merton deu ao livro que escrevera o seguinte título: “Homem algum é uma ilha”.  É dele, a seguinte frase: 

    “O que temos a ganhar viajando para a lua se não conseguimos atravessar o abismo que nos separa dos outros? Essa é a mais importante viagem de descoberta; sem ela, todas as outras são não apenas inúteis, mas desastrosas. ”

    Foi ele também que afirmou: “Jamais poderei encontrar-me se me isolar dos demais homens como se eu fora uma espécie diferente de ser.”

    O trabalho educacional deve seguir também essa diretriz de se tornar ponte para unir os homens na construção da paz.  Nesse processo, a linguagem é imprescindível. Portanto é preciso aprimorá-la, para que se possa falar menos e ouvir mais.

    Mantenho acesa a chama da esperança, porque nem tudo está perdido. Existem várias pessoas que gostam de andar de mãos dadas, dedicam-se ao trabalho comunitário, doam-se voluntariamente em atos solidários sem fins lucrativos, sem autopromoção. Escolhem o caminho da humildade para servir ao próximo. E assim, sentir-se útil à humanidade.

    “Não devemos reter as graças”. Essa frase, ouvi várias vezes pronunciada pelo Padre Quinha. Ele literalmente dava a roupa do corpo aos mais necessitados. Citei-o aqui, porque muitas pessoas, em Petrópolis, testemunharam a dedicação dele no acolhimento dos irmãos que moram nas ruas.

    No próximo dia 12 deste mês, comemoraremos os 10 anos da Chácara Nossa Senhora Aparecida, criada por ele para acolher os irmãos que vivem nas ruas. Houve um período em que ele chegou a abrigar mais de 100 homens com problema de alcoolismo e dependência química, sem que nada fosse exigido das famílias dos recuperandos.

     As lições de vida sempre externam gestos de amor, de dedicação ao que se faz. Até os animais, que são movidos pelo instinto, são capazes de praticar altruísmo. Mas a caridade é exclusividade humana, porque nela reside o amor ao próximo dentro de um comportamento cristão. Para ser um Francisco de Assis é preciso amar o outro a ponto de desapegar-se dos bens materiais e valorizar a vida como o único Bem que tem espaço na eternidade. 

    Compartilhar é o que nos faz crescer como ser humano, não é o acúmulo de bens. 

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