PL para salvar Daniel Silveira prevê anistia retroativa a investigados desde 2019
O projeto de lei preparado por bolsonaristas para anistiar o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) prevê a manutenção do mandato e dos direitos políticos do parlamentar, permitindo a ele concorrer nas eleições de outubro. A proposta, obtida pelo Estadão/Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, é uma reação às críticas feitas ao presidente Jair Bolsonaro (PL) por conceder perdão a Silveira, que foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a oito anos e nove meses de prisão por ataques à democracia.
De autoria da deputada Carla Zambelli (PL-SP), o projeto fala em anistia a todos que tenham praticado atos investigados como crimes de natureza política de 1º de janeiro de 2019, início do governo Bolsonaro, até 21 de abril de 2022, quando o presidente concedeu o perdão a Silveira. A ideia é que a proposta seja apresentada nesta semana. No texto, Zambelli destaca que os crimes de tortura, tráfico de drogas, terrorismo, agressões físicas, invasões de propriedade e danos ao patrimônio público e privado não estariam incluídos na anistia.
“Esta Lei concede anistia, nos termos do art. 48, VIII, da Constituição Federal, a todos aqueles que, no período entre 1º de janeiro de 2019 e 21 de abril de 2022, tenham praticado atos que sejam investigados ou processados sob a forma de crimes de natureza política ou conexo, decorrente ou relacionado com estes, bem como aos que sejam praticados por motivação política, incluindo condutas inseridas no âmbito da liberdade de expressão, manifestação e crença”, diz a versão preliminar do projeto.
Na quinta-feira passada, 21, Bolsonaro publicou um decreto no qual concedeu perdão a Silveira, menos de 24 horas após o deputado ser condenado pelo STF por ameaças a ministros da Corte e antes mesmo do início do cumprimento da pena. A medida se tornou alvo de contestações da oposição no Supremo e também no Congresso.
Ao mesmo tempo, parlamentares bolsonaristas começaram a costurar uma forma de também manter os direitos políticos e o mandato de Silveira na Câmara, tendo em vista a avaliação de alguns juristas de que o perdão presidencial pode cancelar a condenação, mas não garante a manutenção dos direitos políticos. Silveira articula uma candidatura ao Senado nas eleições deste ano.
“Ficam assegurados os direitos políticos, inclusive a manutenção de mandato parlamentar, e, ainda, a extinção de todos os efeitos decorrentes das condutas a si imputadas, sejam cíveis ou penais, para as pessoas que se beneficiem da presente lei”, diz o projeto escrito por Zambelli, que deve receber o endosso de outros parlamentares que apoiam Bolsonaro, como o deputado Coronel Tadeu (PL-SP). O projeto caracteriza como abuso de autoridade a continuação das investigações de crimes como o de Silveira.
“Neste contexto, as estruturas republicanas encontram-se fortemente abaladas ante indevidas interferências do Poder Judiciário nas competências e prerrogativas do Poder Legislativo nos últimos anos, culminando inclusive na cassação indireta de mandato de Deputado Federal por opiniões expressadas no contexto de sua atividade parlamentar e, portanto, albergadas pela garantia da inviolabilidade estabelecida pelo art. 53 da Constituição Federal”, diz o texto.
Como parte da ofensiva para livrar Silveira das penalidades definidas pelo STF, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), presidente da Frente Parlamentar Evangélica, também protocolou um projeto de resolução para alterar o Regimento Interno da Câmara e “dar mais clareza” ao procedimento de perda do mandato parlamentar, numa tentativa de blindar a Casa da orientação do Supremo para que Silveira seja cassado.
“Nesse entendimento, cabe, portanto, no caso concreto, à Câmara dos Deputados, estabelecer com clareza a forma de cumprimento do mandamento constitucional que determina caber à Casa Legislativa decidir sobre a perda de mandato parlamentar, não devendo essa ater-se a um mero papel homologatório da decisão emanada de outro Poder, mas apreciá-la, dentro da função fiscalizatória que lhe é inerente, prevenindo e impedindo abusos e extravagâncias legais e constitucionais, à luz da lei, da Constituição, dos Princípios Gerais do Direito e do Estado Democrático”, afirma a proposta apresentada por Sóstenes.
Indulto de Temer
Em 2017, parlamentares bolsonaristas que hoje defendem o perdão concedido por Bolsonaro a Daniel Silveira já tentaram barrar no Congresso o indulto natalino decretado pelo ex-presidente Michel Temer. Aliados do presidente dizem que Temer, à época, “soltou bandidos”, e Bolsonaro, agora, “perdoou um inocente”.
Pelo menos dois projetos de decreto legislativo foram apresentados na Câmara para sustar os efeitos da medida de Temer, que reduziu o tempo de cumprimento das penas a condenados por crimes sem violência ou grave ameaça, o que incluía corrupção e lavagem de dinheiro. O indulto foi questionado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), mas validado pelo STF em maio de 2019.
Uma das propostas para reverter o indulto foi protocolada justamente por Zambelli. No texto do projeto, a deputada reconhece que o perdão a condenados é “ato discricionário” do presidente, ou seja, com liberdade de escolha, mas afirma que o decreto de Temer foi arbitrário.
Questionada pelo Estadão/Broadcast, Zambelli disse nesta segunda-feira, 25, que continua defendendo a sustação do decreto de Temer porque vê diferenças entre o perdão concedido pelo ex-presidente e o caso de Silveira.
“A diferença é que o (indulto) do Temer soltava bandido e o indulto do presidente (Bolsonaro) solta inocente. Era muito abrangente e colocou muito bandido na rua”, afirmou ela. “Tudo é do jogo democrático. É democrático e constitucional o Temer fazer o indulto, mas também é democrático eu achar que soltar bandido não é uma atitude bacana. O indulto é feito para corrigir injustiças.”
Na sexta-feira, 22, Temer, que costuma aconselhar Bolsonaro em momentos de tensão com as instituições, pediu ao presidente que revogasse o indulto a Silveira e esperasse a conclusão do julgamento. Bolsonaro, contudo, rejeitou a sugestão do ex-presidente. “Não”, escreveu ele no Twitter, logo após a sugestão de Temer.