• ‘Pelo menos há agora um aceno à disciplina fiscal’, diz Scheinkman

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  • 10/04/2023 07:03
    Por Luiz Guilherme Gerbelli / Estadão

    Um dos economistas brasileiros mais respeitados no exterior, José Alexandre Scheinkman diz que o grande destaque no cenário internacional deste início de terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva tem sido a condução da política ambiental. “Está dando muito crédito para o governo, e ele poderia usar isso em vários outros setores, inclusive para a economia em geral”, diz Scheinkman, professor da Universidade de Columbia.

    Na economia, ele avalia que há muito barulho envolvendo o governo, mas vê sinais de que o governo busca o equilíbrio das contas públicas.

    “A disciplina fiscal, principalmente, durante os dois últimos anos do governo Bolsonaro foi completamente abandonada. Pelo menos, há na proposta – sem detalhes, é claro – do Haddad, uma vontade de conseguir voltar a ter uma certa disciplina fiscal”, afirma.

    A seguir trechos da entrevista concedida ao Estadão.

    Como o sr. avalia este início de governo?

    Vou começar por uma coisa importante e que marca uma mudança em relação ao governo Bolsonaro: é a questão do clima. Isso é uma coisa muito importante. E, claro, muda a imagem do Brasil.

    O sr. poderia detalhar o impacto dessa mudança?

    O País participava da discussão de uma maneira esdrúxula. Ao mesmo tempo, o mundo entende que o Brasil tem recursos que podem ajudar a resolver o problema.

    Como o Brasil pode se beneficiar dessa melhora na área ambiental?

    Isso está ligado a um trabalho de pesquisa que estou fazendo. Temos ainda números preliminares, mas eles indicam que o reflorestamento do bioma da Amazônia brasileira tem uma capacidade de captura de carbono importante. O Brasil teria uma renda importante, mais do que a renda atual que tem com a exploração agrícola da Amazônia, feita principalmente por gado.

    E na área econômica, quais a percepção do sr., sobretudo com esse embate entre governo e BC?

    É uma coisa que não adianta. Obviamente, podemos debater qual deve ser o nível da taxa de juros. Todos os economistas podem ter uma opinião. Agora, isso não é a mesma coisa que ficar tentando duvidar da moral da equipe do Banco Central ou da sua capacidade. São duas coisas diferentes.

    Esse embate tem prejudicado a economia brasileira?

    Essa discussão sobre o Banco Central não é tão importante assim. Seria melhor não ter essa discussão, mas não vai ser a razão pela qual a economia brasileira vai dar certo ou não nos próximos quatro anos.

    E como o sr. avalia o arcabouço fiscal?

    Eu acho que o plano apresentado pelo Haddad me parece sério. Ele depende – como o próprio ministro falou – do aumento da arrecadação. Esse aumento da arrecadação pode ser feito de uma maneira que até ajude a economia brasileira ou de uma maneira que prejudique muito a economia. Essa vai ser a grande questão.

    O que poderia ajudar?

    Se você, por exemplo, retirasse alguns dos subsídios.

    E o resto da agenda econômica do governo?

    Outra coisa que estou bastante satisfeito é com a nomeação do Bernard Appy, porque o governo está empenhado em passar uma reforma tributária. O Brasil tem um sistema tributário impossível.

    Parte dos economistas esperava um governo mais pragmático, como foi o primeiro mandato do Lula. De forma geral, está mais otimista ou pessimista?

    Havia a personalidade do Palocci (Antônio Palocci, ex-ministro da Fazenda) no Lula 1. Era uma pessoa que falava de uma maneira clara sobre quais eram as intenções do governo. Hoje, tem mais barulho. Tem por um lado o ministro da Fazenda falando algumas coisas, mas tem a presidente do PT (Gleisi Hoffmann). Ela não é um membro do governo, mas, de uma certa maneira, fala por uma parte dos apoiadores do presidente. Isso tudo faz a coisa ficar mais complicada. As intenções do governo são menos declaradas. Mas as ações, sem a retórica, têm sido mais do lado positivo.

    E como tem sido a visão internacional em relação a esse início do governo?

    O grande chamariz, por boas razões diante da gravidade do problema, é na questão ambiental. Está dando muito crédito para o governo, e ele poderia usar isso bem em vários outros setores, inclusive para a economia. Há um outro ponto que se discute bastante, que é a questão da democracia. O Brasil era visto como um país em que o governo estava tentando levá-lo para uma direção bastante autoritária.

    E no campo da economia?

    As pessoas estão esperando para ver o que vai acontecer. Não se pode exigir em 100 dias uma definição. A disciplina fiscal, principalmente, durante os dois últimos anos do governo Bolsonaro foi completamente abandonada. Pelo menos, há na proposta – sem detalhes, é claro – do Haddad, uma vontade de conseguir voltar a ter uma certa disciplina fiscal. A outra questão é como o governo vai conseguir convencer o Congresso a passar essas medidas que ele está propondo.

    O Lula enfrenta um cenário diferente hoje, em que a aprovação dele não é tão grande como era em outros mandados. Qual é força para aprovar as medidas?

    O aspecto principal não é nem a aprovação do Lula, mas o poder que foi ganho do chamado Centrão na eleição. Infelizmente, o Congresso saiu pior (da eleição). As pessoas que estão mandando no Congresso têm uma agenda de prioridades que é essencialmente ganhar poder político.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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