• Pela sabedoria popular

  • Continua após o anúncio
  • Continua após o anúncio
  • 23/05/2021 08:00
    Por Ataualpa Filho

    Vir da roça para o centro urbano também tem as suas vantagens, uma delas está na facilidade de se estabelecer analogias entre o comportamento humano com o de outros animais.

     Diante do momento social e político que vivemos, tenho lembrado com frequência de um fato, não muito raro, que ocorre na roça: galinha chocar ovo de pata.

    Sei que Trostsky já fez essa analogia ao se referir ao “centrismo” diante das deserções.  Mas o que quero destacar aqui é o que sempre me chamou atenção:  o desespero da galinha ao ver aqueles filhotinhos adotivos nadando ao lado da mãe e do pai biológico, todos serelepes e os pintinhos na beira do lago, tomando sol na moleira, sem poder dar um mergulho, sem aptidão para o nado.

    A galinha, no seu instinto materno, choca os ovos sem saber o destino daquilo que gera. É válido ressaltar que ela os protege até o limite que o destino ou a natureza determinam. “Amor? Pássaro que põe ovos de ferro”, já dizia Riobaldo personagem-narrador do livro “Grande Sertão: Veredas” de Guimarães Rosa.

    Um outro fato do mundo animal que remete para o momento político vigente está relacionado à prática do molothrus-bomariensis, ou popularmente, vira-bosta, maria-preta, godero, chopim, que coloca os ovos no ninho da fêmea do tico-tico (zonotrichiacapensis) para chocar, que também pelo instinto materno, alimenta sem discriminação os filhotes do vira-bosta. Esse pássaro recebeu tal denominação popular, porque é comum vê-lo revirando bosta de boi em busca de semente. E, sobre esse pássaro, nasceu o dito popular: “tico-tico é que cria filho de godero.”

    Na política de aliança e coligações, quantos goderos existem? E o que nos choca é a ingratidão: nos momentos felizes se apresentam unidos, posam, pousam em harmonia; nas dificuldades, revoam na teoria de “cada macaco em seu galho”, do “segura que o filho é teu”. E, no jogo de culpa, o povo sempre perde. Os filhos feios têm dificuldades até para arrumar pais adotivos. Mas, quando há um projeto bem-sucedido, é preciso fazer exame de DNA para se descobrir o pai verdadeiro, pois são muitos que brigam pela paternidade, ou querem um espaço no palanque para colher algum dividendo. No jogo de interesses, só se descobre o verdadeiro amigo na derrota.

    No reino dos animais políticos é fácil identificar a fonte em que eles bebem; todos têm sede na fonte de renda…

    E, nesta pandemia, no âmbito das relações internacionais, estamos presenciando uma incoerência com reflexos nocivos para a população. É de domínio público, um velho adágio: “não se deve cuspir no prato que se come”. Ainda não temos uma autonomia para produzir vacina contra a Covid-19. Portanto, as críticas ao país que mais produz o Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA) não foi uma elegante atitude diplomática. A campanha oficial de vacinação chegou tarde. “Mas antes tarde do que nunca”, já afirmara o sábio povo, que tem a sua inteligência subestimada.  E aproveitar este caos na saúde pública para soltar a boiada pelo desmatamento, provocando crimes ambientais, é uma covardia.

    Não é difícil encontrar pessoas que se arrependem do voto colocado nas urnas, quando se depara com as atitudes do candidato que ajudou a eleger. Resta, portanto, a reparação e não cometer o mesmo erro nas futuras eleições. Mas quem vendeu o voto não tem muito do que reclamar.

    É também da boca do povo que se ouve: “Quer conhecer uma pessoa? Dê poder a ela”.

    E, no mundo da esperteza, é pela fama que se distingue o papagaio do periquito.

    Últimas