
“Tu, místico, vês uma significação em todas as cousas./ Para ti tudo tem um sentido velado./ Há uma cousa oculta em cada cousa que vês./ O que vês, vê-lo sempre para veres outra cousa.”
Peguei esses versos do Fernando Pessoa para iniciar este texto, porque me considero uma pessoa mística, acredito em uma outra vida além desta que habita este planeta. Caminho também pela Metafísica, pois acredito em uma transcendência que está além daquilo que possa ser comprovado cientificamente. Para mim, o homem não é apenas um conjunto de vísceras. Existe algo mais: uma alma.
A vida humana é sublime, não tem preço. Não pode ser descartada como um objeto qualquer. Por isso, afirmo que a guerra é uma ação desumanizadora, uma vez que se alimenta do ódio, da cólera e prolifera a morte insanamente.
A Prudência, a Justiça, a Força e a Temperança são consideradas virtudes cardeais, encontram-se nos alicerces das atitudes humanas que apontam para a prática do bem, dentro de um comportamento sensato.
A insensatez carrega consigo a inconsequência, fere o bom senso, distancia-se do equilíbrio que pacifica. Os conflitos bélicos mostram a face de uma humanidade desnorteada. E não precisa ser místico para perceber que, por trás deles, há outros interesses que revelam a ganância pelo poder.
Há séculos, os homens aperfeiçoam instrumentos letais e matam-se por motivos fúteis. A ambição, a inveja, o ódio, o vil metal, domínio territorial, as razões desumanizantes não priorizam a vida. E também não precisa ser místico para valorizá-la. Contudo, quem acredita em um Deus Supremo, deve cultivar as virtudes teologais: a fé, a esperança e a caridade. Mas é preciso que se diga que a fé se faz presente no Amor. Quem ama busca a paz, que exige o mútuo respeito.
E quando se trata de amar o próximo, a alteridade se faz necessária, pois nela, reside as raízes dos princípios democráticos, uma vez que consiste em respeitar o outro na individualidade dele, ou seja, é preciso reconhecer o próximo como uma pessoa não somente dotada de direitos e deveres, mas também com virtudes, defeitos, com experiências de vida, valores morais, éticos. Em suma, a alteridade não está somente no reconhecimento da existência do outro, mas também na respeitabilidade da maneira dele ser como é. O termo “alteridade é proveniente do latim “alteritas”, que significa “ser o outro”.
Até por questões culturais, as diferenças existem e devem ser respeitadas. No exercício da empatia, da alteridade, não há espaço para o bullying, nem para o racismo, ou melhor, não há espaço para nenhuma atitude segregadora, supremacista.
Humanizar-se é um processo árduo. As ações que combatem o egoísmo exigem renúncias, imprescindíveis na abnegação que difere de sacrifício. O amor, que se materializa em doação, sabe que a partilha une fraternalmente. O desprendimento possibilita a ajuda mútua. A interação social é inevitável. E, na dita “nova ordem mundial”, o multilateralismo precisa ser mantido para que as nações possam agir dentro de uma cordialidade em benefício de seus habitantes.
A cooperação diplomática nas relações internacionais tornou-se imprescindível na vigente economia globalizada. Um conflito bélico entre nações tem consequências desastrosas.
“Homem algum é uma ilha” já afirmara Thomas Merton. As relações sociais ficam registradas na história. O que se deseja de um processo civilizatório é que tais relações ocorram espontaneamente pela equidade, pelo reconhecimento do valor do outro, para que o existir seja marcado pela reciprocidade do respeito, fundamentado em princípios éticos, morais.
A soberania de uma nação precisa ser respeitada. Os países considerados pobres não podem viver debaixo das esporas dos países considerados ricos. E, como místico, acredito em uma prestação de contas na dimensão celestial. Sim, acredito no Juízo Final. Diante da Face do Bem, todos terão que olhar para si, para as próprias atitudes.
– Quem nunca trabalhou para edificar da paz neste planeta, vai encontrá-la na outra dimensão?…
E para encerrar esta reflexão recorro, mais uma vez, a Fernando Pessoa, em “Prece”:
“Senhor, que és o céu e a terra, que és a vida e a morte! O sol és tu e a lua és tu e o vento és tu! Tu és os nossos corpos e as nossas almas e o nosso amor és tu também. Onde nada está tu habitas e onde tudo está – (o teu templo) – eis o teu corpo.
Dá-me alma para te servir e alma para te amar. Dá-me vista para te ver sempre no céu e na terra, ouvidos para te ouvir no vento e no mar, e mãos para trabalhar em teu nome.”