• Para acolher Centrão e ampliar base de apoio, Lula anuncia 38º ministério

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  • 30/08/2023 08:08
    Por Vera Rosa, Matheus Piovesana e Sofia Aguiar / Estadão

    A Esplanada dos Ministérios, conjunto criado por Oscar Niemeyer no projeto de Brasília, incluiu 17 prédios iguais, desenhados para abrigar os órgãos de governo. Se fosse projetar a cidade hoje, talvez o arquiteto pensasse em fazer duas esplanadas – e, mesmo assim, faltaria prédio para tanto ministério. Com a criação da pasta da Micro e Pequena Empresa, anunciada ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a administração atual chegará a 38 ministérios, bem perto do recorde de 39 atingido pela gestão de Dilma Rousseff (PT). Por trás do inchaço da Esplanada está a necessidade de ampliar o número de rubricas orçamentárias à disposição de partidos aliados, para angariar votos nas Casas Legislativas e facilitar a aprovação de pautas de interesse do governo.

    No momento, o nome mais cotado para a nova pasta é o do ex-governador Márcio França (PSB), atualmente ministro de Portos e Aeroportos. Nessa hipótese, para o seu lugar iria o deputado Silvio Costa Filho (PE), do Republicanos, um dos partidos que o governo tenta atrair.

    Há pelo menos um mês já está certo que Costa Filho – chamado de Silvinho nos bastidores – e o também deputado André Fufuca (PP-MA) serão ministros, como forma de ampliar a presença do Centrão na Esplanada. Falta definir quais pastas eles comandarão. Assim, a criação de mais uma ministério deve ajudar a destravar a reforma do governo. A nova pasta não necessariamente vai interessar ao grupo, mas possibilitará a Lula remanejar um aliado e abrir espaço em um ministério mais poderoso.

    Líder do PP, Fufuca é ligado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (AL), e ao senador Ciro Nogueira (PI). Este último foi ministro da Casa Civil no governo de Jair Bolsonaro (PL) e é adversário de Wellington Dias (PT) – o atual titular do Desenvolvimento Social – no Estado de origem de ambos, o Piauí. Ciro Nogueira preside o PP, critica Lula nas redes sociais e terá apadrinhados políticos no governo, mas diz não querer cargos.

    Aliada de Ciro Nogueira e de Lira, a ex-deputada Margarete Coelho será a nova presidente da Caixa Econômica Federal. Ela vai ocupar o lugar de Rita Serrano. A mudança deve ser seguida de trocas no comando das vice-presidências do banco para abrigar PP e Republicanos, as duas legendas que o governo tem interesse em atrair para a base aliada. Atualmente, Margarete é diretora de Administração e Finanças do Sebrae.

    Bolsa Família

    A configuração traçada até o momento prevê deixar Wellington Dias no comando do Desenvolvimento Social com o Bolsa Família – marca registrada do PT – e também com o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Nesse desenho, Fufuca ficaria com Ação Social, um ministério turbinado por emendas parlamentares.

    O plano desagrada ao PT, mas enche os olhos do Centrão, às vésperas de um ano de eleições municipais. Motivo: a nova pasta abrigaria as chamadas emendas de transferência especial, que vão diretamente para o caixa das prefeituras. O dispositivo foi batizado por técnicos do Orçamento de “emenda Pix” ou “cheque em branco” por causa da dificuldade em rastrear a finalidade dos recursos.

    “Com tudo isso, é no mínimo estranho, no meio da reforma ministerial, que setores do Congresso avancem para criar uma pauta-bomba”, disse o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), numa referência ao projeto do Centrão de ampliar as desonerações da folha de pagamento para todos os municípios. O impacto previsto para os cofres públicos é de R$ 14 bilhões.

    Apoio interno

    Em reunião do Diretório Nacional do PT realizada nesta segunda, 28, Wellington Dias fez um balanço de sua gestão e disse que no governo Bolsonaro a fome aumentou nas grandes cidades. Ex-governador do Piauí, o ministro acompanhará Lula na viagem ao Estado, amanhã, para o lançamento do programa Brasil Sem Fome. No encontro partidário, ele recebeu a solidariedade de deputados e senadores petistas, que criticaram a ideia de dividir o ministério para entregar uma fatia ao Centrão.

    “Nós hipotecamos apoio e solidariedade ao Wellington”, afirmou o deputado Jilmar Tatto (SP), secretário de Comunicação do PT. “Nós não nos recusamos a contribuir com a governabilidade, mas o Desenvolvimento Social e a Saúde não são para negociar.”

    Na prática, dirigentes do PT não acham que Dias esteja tão bem assim no comando da pasta, mas não querem perder espaço na Esplanada e já se queixaram com Lula. Argumentaram que tirar ações do guarda-chuva do Desenvolvimento Social significa dar aos candidatos do Centrão um poderoso trunfo para as eleições às prefeituras, em 2024.

    Equilíbrio

    Para o cientista político Eduardo Grin, professor da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, a criação de um ministério surge de forma estratégica para Lula se equilibrar entre manter aliados, mulheres e representantes negros e indígenas no governo, ao mesmo tempo que possibilita abrir espaço para os partidos do Centrão, como é o caso de Republicanos e PP.

    Nesse sentido, é emblemática a substituição de Rita Serrano, funcionária de carreira da Caixa, pela ex-deputada Margarete Coelho. Inicialmente, o PP havia indicado para o posto o advogado Gilberto Occhi. Ex-ministro (Cidades e Integração Nacional na gestão de Dilma Rousseff e Saúde na administração de Michel Temer), ele presidiu a Caixa entre 2016 e 2018, sob a presidência de Temer. No entanto, pessoas próximas a Lula têm feito pressão para que o posto não deixe de ser ocupado por uma mulher.

    Outros ministérios comandados por mulheres estão na mira da reforma. A pressão é mais forte sobre as pastas da Saúde (chefiada por Nísia Trindade) e Esporte (com Ana Moser). A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, afirmou que as ministras do governo Lula são “atacadas todos os dias” para que as pastas que comandam sejam dadas a homens.

    ‘Povo trabalhador’

    Enquanto tenta agradar aos congressistas com a reforma ministerial, Lula disse na sua live de ontem que a maioria deles não representa o “povo trabalhador”. “A maioria dos deputados são pessoas que pertencem a uma classe média alta. Quando chega um projeto para votar, muitas vezes não votam de acordo com os interesses da maioria do povo. Eles votam a favor dos interesses daquela sociedade que eles vivem no meio”, afirmou o presidente.

    De acordo com Lula, quando o eleitor vota “de forma estabanada”, “planta vento e colhe tempestade”. Lula fez a declaração no programa “Conversa com o Presidente”, no qual anunciou a criação do ministério. (COLABOROU CAIO SPECHOTO)

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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