• Ou isto, ou isso

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  • 28/02/2020 16:16

    Plagiando o título de um famoso poema de Cecília Meireles, resolvi abordar a questão do uso dos pronomes demonstrativos no português do Brasil. Observo que há uma confusão tanto na fala e quanto na escrita, em especial, no uso de este ou esse. 

    Para entender os pronomes demonstrativos é preciso relacioná-los com as pessoas do discurso. Aquelas participantes de uma conversa. Para haver bate-papo, são necessárias três pessoas. Uma que fala: falante (1ª pessoa – eu, nós), uma que escuta: ouvinte (2ª pessoa – tu, você, vocês) e o ente de que se fala: o assunto (3ª – ele, ela). 

    A língua portuguesa mantém um sistema de demonstrativo tripartite no uso relativo à área de quem apresenta o objeto/ ser. Assim sendo, ‘este’ pertence à área do falante; ‘esse’ para o campo do ouvinte e ‘aquele’ serve para referenciar tudo o que é exterior à área desses dois interlocutores. Por essa razão, diz-se que os demonstrativos situam a pessoa ou a coisa designada no tempo e no espaço relativamente às pessoas gramaticais. 

    Podemos dizer que os demonstrativos têm três empregos: a) indicam situação no espaço; b) indicam situação no tempo; c) indicam situação no texto. 

    Vou procurar resumir. Em relação ao espaço: o lugar onde estou é este; o lugar onde você está é esse; o lugar distante do falante e do ouvinte é aquele. Há nesse aspecto uma natural correlação com os advérbios de lugar: isto aqui; isso aí; aquilo ali / lá. O emprego em relação ao tempo obedece à lógica usada para estabelecer uma relação de lugar: tempo presente ou futuro próximo: este; passado recente ou futuro próximo que inclua o ouvinte: esse; passado remoto ou futuro distante: aquele. 

    Em situações de fala direta, são particularmente importantes o este e o esse. O primeiro localiza os seres em relação ao falante; o segundo, em relação ao ouvinte. Trocá-los pode causar ambiguidade. Entretanto, a função demonstrativa com maior número de dúvidas é a que pretende situar o leitor. Aquela que objetiva dizer-lhe se a palavra, a frase já foi referida no texto. Ou, ao contrário, se vai ser referido. É o terceiro emprego do demonstrativo. Nesse caso, este: exprime referência futura (anunciase o fato que será dito depois). Ex.: Fernando Pessoa escreveu esta frase: “Minha pátria é a língua portuguesa”; esse: indica referência passada (o fato já dito; depois, retomado). Ex.: “Minha pátria é a língua portuguesa. Essa frase é de Fernando Pessoa”. 

    Nas frases em que precisamos fazer referência a mais de um termo já citado, usamos ‘aquele’ para o termo mais afastado e ‘este’ para o mais próximo. Ex.: Conhecemos Paris e Lisboa; nesta (Lisboa), comemos bacalhau à moda; naquela (Paris), compramos os melhores perfumes. 

    Na literatura especializada já existe quem defende o uso do demonstrativo “esse” em lugar de “este”, o que levaria ao binarismo. Contudo, devo lembrar que o processo de mudança no Português Brasileiro, se ocorrer, caracterizar-se-á como um “caso de especialização” das formas. Nesse caso, o uso seria semelhante ao que ocorre na língua inglesa. 

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