• ‘Os manifestos geram poder para a resistência’, afirma Celso Lafer

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  • 11/08/2022 08:08
    Por Marcelo Godoy / Estadão

    O professor da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e ex-chanceler Celso Lafer afirmou que, ao atacar as urnas eletrônicas, o presidente Jair Bolsonaro (PL) revela “falta de confiança na Constituição”. O jurista estará na leitura da carta pró-democracia da Universidade de São Paulo, nesta quinta-feira, 11. Lafer disse confiar na resiliência das instituições e na atuação da sociedade civil para preservação das liberdades e acreditar que os manifestos geram poder para resistência a qualquer tentativa de atropelo.

    Que tipo de ação o manifesto pode iniciar neste momento que a Nação vive?

    O manifesto e os outros que estão surgindo resultam da percepção de que existe uma insegurança na sociedade. E uma das razões dessa insegurança é a ameaça que ronda o estado de direito. Ela nasce de várias manifestações do presidente que se contrapõem às regras do jogo democrático, e a mais óbvia delas é o capítulo das eleições. Não resisto à tentação de citar Hannah Arendt, quando ela diz que você gera poder pela ação conjunta.

    O sr. deve estar presente hoje na faculdade?

    Eu vou. E queria fazer uma observação sobre por que é significativa a leitura da carta no pátio da faculdade. Ele é um local de memória, do papel multissecular de gerações de alunos da faculdade em prol das grandes causas da vida política nacional.

    Como vê os ataques do presidente à Justiça Eleitoral?

    Existem regras do jogo democrático, como eleições livres e alternância do poder. É o que tem sido garantido pelo TSE e pelas urnas eletrônicas. E é evidente que são infundados os constantes ataques do presidente à Justiça Eleitoral, aos seus membros e às urnas. Eles revelam falta de confiança na Constituição Federal.

    A criação de inimigos reais ou imaginários é um traço de governos autoritários. O sr. acredita que isso se manifesta em forças políticas do Brasil? Em quais?

    Acho que ela é proveniente do espírito de facção, em que o adversário torna-se o inimigo com o qual cabe travar um combate sem limites. E as facções voltam-se para suas vantagens e privilégios. Desconhecem a res publica, que é comum a todos, e abrem caminho para a res privada dos interesses particulares. Penso que o Bolsonaro é a expressão de um líder da facção. É o que alimenta a polarização e uma governança facilitada pelo segredo, como no caso do orçamento secreto. Na democracia, como dizia o (Norberto) Bobbio, o poder público é exercido em público. Mas Bolsonaro almeja ocultar nas arcas de seu Estado aquilo que não quer divulgar.

    Como o sr. qualificaria a reunião do presidente com embaixadores para difamar a Justiça Eleitoral?

    A mensagem que ele transmitiu de contestação das regras do jogo democrático é um absurdo, porque as urnas e a Justiça Eleitoral têm sido exemplo de lisura e eficiência. Lembro da lei de 1950, que estipula os crimes de responsabilidade. Em matéria de administração pública e probidade, um dos critérios é conduta compatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo. Claramente, essa reunião feriu a dignidade, a honra e o decoro do cargo.

    Qual o papel que os militares devem ter na eleição, se é que devem ter um?

    O papel das Forças Armadas é de subordinação ao poder civil, ao poder da República. É o que contempla o artigo 142 da Constituição. Não está no âmbito de sua competência ser “o poder moderador”. Instigar uma mudança do papel das Forças Armadas é questionar as regras do jogo democrático.

    Qual o futuro da democracia e das liberdades no País?

    Confio na resiliência das instituições e na atuação da sociedade civil para preservação da democracia e das liberdades. E vejo, nessa nossa carta, como nos diversos manifestos que estão pipocando, expressão dessa sensibilidade democrática da sociedade, que gera poder para afirmar uma resistência a qualquer tentativa de atropelo.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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