OAB Mulher condena ‘deboche’ de prefeito que sugeriu ‘castrar meninas’
A Comissão OAB Mulher do Rio de Janeiro emitiu nota oficial para repudiar a manifestação do prefeito de Barra do Piraí, Mário Esteves (sem partido), que defendeu na última quinta-feira, 14, que as meninas da cidade deveriam ser “castradas” para controlar a população de crianças na cidade, que fica a cerca de 100km da capital fluminense.
Nota assinada pela presidente da comissão, Flávia Pinto Ribeiro, expressa “veemente repúdio” às falas do prefeito, “que sugeriu de forma desrespeitosa, afrontosa e debochada que as mulheres barrenses fossem “castradas” e que uma lei fosse apresentada na Câmara Municipal limitando o número de filhos por mulheres”. O documento reforça que a Comissão tem “compromisso contínuo de combater atos preconceituosos e discriminatórios”.
A declaração da Comissão endossa a posição da 6ª subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Barra do Piraí, que já havia afirmado que “a fala é típica de ato de misoginia, e mais uma vez demonstra o total desrespeito do prefeito com as mulheres”.
O prefeito, por sua vez, alegou não ter tido a intenção “de ofender quaisquer parcelas da população, muito menos as mulheres”. Acrescentou ainda acreditar que o problema de sua fala foi “o equívoco” de usar o termo técnico “castrar”, em vez de “laqueadura”.
A lei federal nº 9.263, de 1996, proíbe a aplicação de medidas de controle demográfico, que incluem a limitação de número de filhos ou a realização forçada de operações como laqueadura ou vasectomia. A legislação sobre o tema estabelece que o planejamento familiar “orienta-se por ações preventivas e educativas e pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para a regulação da fecundidade”.
‘Tem que castrar essas meninas’
As declarações repudiadas pela OAB foram feitas pelo prefeito Mário Esteves durante evento em que anunciou a inauguração de uma creche na cidade. “O que não falta em Barra do Piraí é criança. Cadê o Dione [secretário de Saúde]? Tem que começar a castrar essas meninas. Controlar essa população. É muito filho, cara”, disse.
Esteves defendeu também a criação de uma lei para limitar o número de filhos de cada família. “É no máximo dois. Tem que fazer uma lei lá na Câmara. Haja creche para ser construída ao longo dos próximos anos. Tem que ter um projeto federal, estadual e municipal, porque precisa sim desse controle. É muita responsabilidade colocar filho no mundo”, afirmou.
Partido Solidariedade expulsa prefeito
A direção do partido Solidariedade no Rio de Janeiro decidiu expulsar dos quadros da legenda o prefeito Mário Esteves depois das declarações sobre “castrar” as meninas da cidade. A decisão foi unânime e, em um comunicado divulgado neste domingo, 17, o presidente estadual do Solidariedade, deputado Aureo Ribeiro, classificou a fala como misógina (preconceito ou ódio contra mulheres) e um “total desrespeito” a elas.
Com a palavra, Comissão OAB Mulher
Leia na íntegra a nota da Comissão OAB Mulher do Rio de Janeiro, assinada pela presidente Flávia Pinto Ribeiro:
A OAB Mulher do Rio de Janeiro vem por meio desta nota expressar seu veemente repúdio às recentes declarações do prefeito de Barra do Piraí, Mário Reis Esteves, que sugeriu de forma desrespeitosa, afrontosa e debochada que as mulheres barrenses fossem “castradas” e que uma lei fosse apresentada na Câmara Municipal limitando o número de filhos por mulheres.
Em consonância com nossos princípios de igualdade de gênero, respeito e promoção dos direitos das mulheres, anuímos integralmente à manifestação da Subseção de Barra do Piraí em condenação às palavras e atitudes que refletem misoginia, desrespeito e discriminação de gênero.
Nossa Comissão OAB Mulher reitera o compromisso contínuo de combater atos preconceituosos e discriminatórios, bem como de trabalhar incansavelmente pela construção de uma sociedade mais igualitária e justa para todas e todos.
Estamos unidos na busca por um ambiente onde todas as mulheres sejam respeitadas e tenham seus direitos preservados, endossamos a posição Subseção de Barra do Piraí e nos solidarizamos com seus esforços em prol dessa causa./i>
Com a palavra, a prefeitura de Barra do Piraí
A prefeitura emitiu uma nota oficial declarando que a fala do prefeito foi resultado de um “momento de descontração” e que ele “jamais teve a intenção de promover qualquer tipo de prática danosa ou preconceituosa às mulheres”. Leia na íntegra:
O prefeito de Barra do Piraí, Mario Esteves, entende que a laqueadura seja um dos procedimentos para o incremento do planejamento familiar, assim como a vasectomia. Jamais teve a intenção de promover qualquer tipo de prática danosa ou preconceituosa às mulheres. Prova disso, são os investimentos que a prefeitura tem aplicado no Hospital Maria de Nazaré – a Pérola do Vale – e nos programas Saúde da Mulher e Saúde do Homem, onde o planejamento familiar é discutido. Foi um momento de descontração na inauguração de uma importante via de escoamento de produção e de desenvolvimento na cidade, tema central do evento e que é o principal destaque. Qualquer ilação com esse assunto mostra desconhecimento político, uma vez que castrar é esterilizar. A utilização da linguagem vai muito mais para quem quer difundir a confusão na mente do outro, quando deveria explicar.
Com a palavra, o prefeito Mário Esteves
Logo depois das críticas, o prefeito Mário Esteves se manifestou nas redes sociais e disse que errou os termos. “Reconheço o equívoco na troca do termo técnico – “laqueadura” por “castrar”‘, escreveu. “No entanto, isso não diminui a importância do assunto. O que deveria entrar em pauta era o planejamento familiar. Esse é o assunto que tem que estar nas manchetes – e não a troca num termo técnico. Infelizmente, hoje, qualquer palavra mal colocada pode se transformar em barbárie nas mãos de pessoas mal intencionadas”.
No domingo, 17, voltou às redes. Com uma imagem religiosa e um título “Compreender Além das Palavras”, pediu empatia e disse que nem sempre as palavras refletem as verdadeiras intenções. “Na era da comunicação instantânea, um simples mal-entendido pode desencadear um julgamento impiedoso. É crucial lembrar que as palavras nem sempre refletem as verdadeiras intenções”, escreveu.