O sofisma do TSE
Na Atenas que dependia da cidadania em praça pública, essencial era bem articular ideias e pensamento em palavras. Com os sofistas, virou moda grega o filósofo de estimação, mestre não das profundidades do raciocínio, mas de truques superficiais. Como entendia que a filosofia devia buscar a verdade, Platão denunciou os sofistas, pois prostituíam armas da lógica. O silogismo – construção modelada para ajudar, no desenvolvimento do pensamento, a potência do discurso – virou mero sofisma, este raciocínio com alvas roupagens, ares e imponências de filosofia, mas que veste inverdades.
As distorções produzidas no TSE com o fim de livrar a cara de Temer e Dilma reafirmam o Direito como paraíso do sofisma. O Tribunal deferiu provas, por unanimidade. Armou-se o circo de oitivas, requisições, rol de perguntas… E o Tribunal agora “arrependeu-se”? Por 4 a 3, contra a unanimidade de ontem, descobriu que não, aquelas provas não eram mais possíveis. Calçados no sofisma de suposta extemporaneidade, chutaram o pau da barraca da decência, esmagando a verdade, assim, sem mais. Foi de dar asco.
Quando concordei ser essencial sair a Dilma, a quem perguntava sobre o azar de ficarmos com vice nefasto, retrucava que provavelmente seria necessário depois tirar também o Temer. Foi-se a Dilma, o Temer vai ficando. Manipula aqui, troca ministros ali, sofisma acolá, com seus juristas de feira praticando sórdidos truques. Existe um fastio na população, um esgotamento físico, mental e moral disso tudo. O julgamento no TSE aconteceu no deserto. Ninguém foi às ruas ou às redes. O pessoal se aquietou em gritante silêncio, durante os três dias de julgamento. Sabia-se que Temer condenado, como deveria ter sido, era Dilma condenada. Então, afora os exauridos de gritar em vão, há estes, que só gritam por conveniência, não por indignação verdadeira, pois só depois do resultado do julgamento apareceram tímidos petistas, vocalizando o bordão cansativo do “golpe”. Como desta feita “o golpe” os beneficiou, gritaram só com o estrago já feito.
Enquanto isso, servidores públicos do Estado do Rio seguem em penúria, com dificuldades de sobrevivência digna, socorridos por cestas básicas solidárias aos mais afetados pelo drama terrível. O Rio, esse despenhadeiro, com a multidão de desempregados, a violência aumentando, os serviços públicos apodrecendo, a autoestima do povo se arrastando na calçada como um cão doente. Mas o Rio é só o front mais agudo da crise, que se espalha país afora. E é aí que o julgamento do TSE fica mais afrontoso. A um país que desceu aos esgotos em que nos encontramos, se esperava de julgadores o conforto de purgarem as pústulas da corrupção, lavando o lodaçal da mentira com o bálsamo da verdade. Daria esperanças de luz. Mas o TSE fez-se de cego e de surdo. Mudo jamais, pois sofismou alto o que não poderia ter dito: que as impressões digitais, a arma da matança e a foto da cena do crime que apareceram no curso do processo e provam o dolo do criminoso, não podem ser consideradas. Disse o Ministro Benjamin em seu voto-protesto: não seria coveiro de prova viva. Mas nesse sistema em que o réu manobra para escolher juiz que o absolva, não faltaram pás para enterrar as provas que gritavam. E o delinquente, crise viva que é, segue à solta.
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