O que eu fiz, mamãe?
Durante minha vida, participei de muitos atos e fatos e, até, em alguns deles, fiz história. Acompanhei de perto e de longe trajetórias de amigos, conhecidos, distantes agentes da vida pública nos quais votei pensando na melhoria do país, comparecendo às urnas desde que me fiz gente e sem faltar a nenhum pleito eleitoral. Jamais tive atração pelas candidaturas políticas, nunca postulando ser vereador, deputado e coisas do tipo. Aceitei participar da vida pública em funções técnicas e consumi boa parte de minha mocidade e vida a entidades de cultura e similares. Uma vida de muito trabalho sob muita dedicação. Possuo patrimônio imobiliário coerente com meus ganhos de toda a existência, único para residência, e os rendimentos de uma aposentadoria honrada mensalmente pelo INSS, no limite do famigerado “fator previdenciário” que rouba do contribuinte boa soma do real direito. Tenho família normal, esposa, filhos e netos, meus livros, meus escritos, uma vida dentro dos ditames permitidos em lei. Sou um cidadão idoso comum. Às vezes apareço com fotografias em jornais e revistas, assinalando alguma coisa que tenha feito merecedora da atenção pública. Nada encomendado, por sinal.
Não possuo joias, contas bancárias e aplicações em paraísos fiscais, nem jatinhos, helicópteros, lanchas, lambretas, motos e, apenas, sou proprietário de um automóvel para o ir-e-vir diário para cá e para lá.
Meu patrimônio é minha vida cumprida com zelo e obediência moral.
Eis que fico basbaque, basbacão, incrédulo diante do noticiário da vida de Sérgio Cabral, o filho, um jovem de ótima aparência, criado por um grande homem… Pois bem, Serginho, bem-sucedido na vida pessoal e pública, com passagens pelo Senado Federal, Câmara de Deputados de Brasília e do Rio de Janeiro, governadoria do seu estado, com reeleição consagradora, no caminho de uma presidência da República, mete peludas mãos no erário, recebe malas recheadas de propinas, passeia pelo agitado mundo dos marajás, monta uma caverna de fazer inveja a ali-babá, inclui no patrimônio pessoal, joias, obras de arte, dólares e euros em paraísos fiscais, puxa, quem pode acreditar numa coisa dessas?
O rapaz jogou a vida fora, tudo pela janela do descrédito, sepultando uma ascendente carreira política. Quando for solto e se livrar da tornozeleira pega-ladrão certamente gastará – e bem – o bom saldo de suas aplicações financeiras aqui e lá fora e, talvez, compre um templo no Oriente e fique meditando e escrevendo um best-seller que poderia ter o seguinte título: “Mamãe, eu acreditei na impunidade!”