• O pensamento ideológico a todo vapor

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  • 02/04/2022 18:16
    Por Gastão Reis

    Educar é, antes de tudo, ensinar a pensar. A chamada educação crítica tem um viés de esquerda. E é apresentada como visão política interessada em defender os interesses do povo. Como diria aquele personagem do Chico Anísio: “Há controvérsias!” E bem fundamentadas, digo eu. Os malefícios das esquerdas latino-americanas são conhecidos: Venezuela, Argentina, Nicaraguá, Cuba, Brasil etc. Eles configuram estragos do pensamento ideológico. A era petista no Patropi resultou em roubalheira monumental e impeachment. Após a queda da atroz ditadura de Pinochet, a exceção foi o Chile. Foram preserva-dos os ganhos havidos na economia como crescimento econômico e inflação baixa. Geração de empregos e elevação dos salários reais nunca fez mal a povo algum, alicerces que são de políticas duradouras de distribuição de renda.

    Quem realmente aprende a pensar sabe que toda moeda tem duas faces. E que a alternância no poder é fundamental na construção de uma real democracia. Ou seja, a alternância entre liberais e conservadores (ou entre esquerda e direita) deveria ser encarada com naturalidade. A reflexão intelectual pé no chão não se ilude com o poder. O nome do jogo é a eterna vigilância, palavras que também definem o preço da liberdade.

    A comparação da França com a Inglaterra nessa questão é ilustrativa. A França se celebrizou pela Revolução Francesa de 1789, prenúncio da História como luta de classes, conceito elaborado depois por Marx, e posto em prática por Lênin, Stálin e seus seguidores. O caso inglês, quase 100 anos antes, desembocou na Revolução Gloriosa de 1688 em que Maria Stuart e Guilherme de Orange se tornam reis com poderes reduzidos. Houve mesmo o episódio da decapitação de Carlos I, que queria ter poderes de rei absolutista.

    Ainda hoje, é pública e notória a tendência francesa de ir para as ruas em suas reivindicações políticas, bem mais frequentes do que as que ocorrem na Inglaterra, onde também as há. Por que essa diferença de frequência em matéria de manifestações políticas de rua num e noutro país? Não me recordo de ter lido alguma coisa sobre isso. Portanto, trata-se de uma especulação em aberto para mim. Vamos a ela.

    É muito conhecida aquela famosa frase do político inglês Lord Acton: “O poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente”. Em relação a este último, o nazismo e o comunismo real são provas contundentes do grau de corrupção absoluta a que o poder pode chegar. Mas essa visão de muita desconfiança dos ingleses em relação ao poder, cuja natureza é corrupta, os levou a tomar medidas bem sucedidas para monitorá-lo.

    O Primeiro-Ministro inglês vai ao Parlamento prestar contas de seus atos de governo toda quarta-feira, e ainda comparece a uma reunião particular com a rainha (ou rei), às sextas-feiras, para quem tem que dar informações sobre qualquer assunto que lhe seja cobrado. Em suma, poder monitorado com rédeas curtas, o que limita em muito os possíveis desvios de conduta.

    Bagehot, famoso por seu livro “A Constituição Inglesa”, nos diria que a isenção de um monarca na defesa do interesse público é muito superior ao de um Chefe de Estado eleito, que depende de partidos e grupos econômicos para ocupar sua posição. Esta é uma diferença importante entre a Inglaterra e a França, que é uma república. Nesta, o presidente mantém vínculos com partidos e grupos econômicos para se eleger. Quanto aos primeiros-ministros, eles dependem desses grupos nos dois países. Mas existe o voto distrital puro, ou algo similar, que permite ao eleitor controlar seu representante em seu distrito eleitoral e até revogar seu mandato. Fica muito claro quem manda.

    A vida política francesa me parece não ser tão azeitada em termos de rotinas de monitoramento do poder. A preferência dos franceses pelos movimentos de rua pode refletir a democracia direta da praça pública grega. De toda forma, o modelo inglês me parece ser mais astuto em relação às peripécias do poder. De mais a mais, as decisões legais não são mais tomadas nas praças públicas.

    O patético nas pautas da esquerda brasileira é a proposta reiterada do controle social da mídia. O social, no caso, significa o governo ali de plantão. Obviamente, seria o poder instalado que faria o controle. Imagine, na praça pública grega, que a pessoa que fosse falar tivesse que explicar antes ao representante do governo o que iria dizer. Isso tem nome e se chama censura. Um autêntico democrata jamais aceitaria isso, uma traição do ideal grego.

    Algo tão sério, ou mais, quanto ao referido controle é a junção dos poderes político e econômico nas mesmas mãos, as do governo. Foi isso que aconteceu na ex-URSS, ainda que cerca de 50% da economia russa, mesmo sob Stálin, continuassem a ser tocados pelo setor privado. Os desastres ocorridos na economia da URSS e de seus países-satélites são a prova do crime. No Brasil, não chegamos a estrangular o setor privado num percentual tão elevado, mas nem por isso deixamos de criar toda sorte de empecilhos à atividade empresarial via carga tributária, que limita os investimentos privados, e bur(r)ocracia ampla, geral e irrestrita.

    É instrutivo ler depoimentos de intelectuais e de ex-políticos comunistas que abandonaram o credo. Um deles, cujo nome infelizmente não me recordo, foi didático em explicar como funciona a lavagem cerebral que está por trás do pensamento ideológico. Em termos crus, ele informa que a realidade não tem importância. E sim a versão criada do tipo “uma mentira mil vezes repetida vira verdade”, como afirmava Goebbels, ministro da propaganda de Hitler.

    As explicações de Putin, ex-KGB, sobre a guerra da Ucrânia é um exemplo perfeito dessa técnica. Primeiro, não é uma guerra. Na “verdade”, o que ele está fazendo lá é correção de rumos para defender a minoria russa perseguida, impedindo que o nazismo tome conta do país. Entendeu? Nem eu!

    Putin é a prova cabal de que o pensamento ideológico está em plena atividade lá na Ucrânia. Aprender a pensar baseado em fatos e resultados é uma bela vacina contra os Putins. E de evitar suas crias por aqui.

    (*) Vídeo do autor, “A cooperativa e o mercado”, complementar ao artigo. Basta clicar no link: https://www.youtube.com/watch?v=WKODzv2iX1g. Ou digitar no Google: Dois Minutos com Gastão Reis – “A cooperativa e o mercado”.

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