• O massacre em Colniza

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  • 02/05/2017 13:09

    No Brasil, os conflitos envolvendo a posse de terra são seculares, vem desde as Capitanias Hereditárias. Naquela época, os donatários tinham plenos poderes tanto no campo jurídico quanto administrativo. Podiam nomear funcionários e até aplicar pena de morte para escravos, índios e homens livres. Esse sistema de capitanias não teve o êxito esperado. Das 14 criadas, apenas duas prosperaram: São Vicente e Pernambuco. Os donatários destas estabeleceram uma convivência pacífica com os índios, desenvolveram o cultivo da lavoura canavieira e chegaram a instalar engenhos. O nome do professor que me explicou essa matéria, no antigo Ginásio, confesso que não lembro; mas o autor do livro de História do Brasil em que estudei na adolescência chamava-se Antônio José Borges Hermida.

    A questão latifundiária até hoje derrama sangue no solo brasileiro. A morte no campo precisa ser tratada com mais atenção, requer uma intervenção federal mais séria.

    Na quarta-feira, dia 19/04, em um assentamento no Município de Colniza no Mato Grosso, a 1.065 km de Cuiabá, próximo ao distrito de Guariba, em uma gleba denominada Taquaruçu do Norte, 9 trabalhadores foram assassinados por homens encapuzados que invadiram o assentamento. Os mortos eram evangélicos. Foram assassinados dentro de casa. Nos corpos, havia sinais de torturas. Foram executados a tiros e a golpes de facão. 

     Esse fato ocorreu na semana em que se relembrava o massacre de Eldorado dos Carajás, no sudeste do Pará, no qual 19 trabalhadores rurais foram assassinados em 17 de abril de 1996.

    É válido ressaltar que o massacre em Colniza ocorreu por volta das 18:00 horas, mas só chegou ao conhecimento do sistema de segurança pública na tarde do dia seguinte. Além do mau tempo ter dificultado, o local é de difícil acesso e a comunicação é precária naquela região. Os corpos ficaram expostos mais de vinte quatro horas à espera das autoridades para removê-los e periciá-los. Passado uma semana, de acordo com relato da Polícia Civil do Estado, nenhum dos criminosos ou os supostos mandantes do crime foram presos.

    O que também me levou a pensar nessa chacina foi a falta de comunicação, a imprensa teve dificuldade em dar essa informação à sociedade. Um atentado acontece no continente europeu, a notícia chega aqui imediatamente. Esse fato grave demorou muito tempo para chegar ao conhecimento do povo. A violência urbana ocupa mais espaço na mídia do que a violência no campo. Fato este que favorece a impunidade no meio rural. Essa triste verdade me fez lembrar um trecho do livro “Os Sertões” de Euclides da Cunha:

    “Vivendo quatrocentos anos no litoral vastíssimo, em que pelejam reflexos da vida civilizada, tivemos de improviso, como herança inesperada, a República. Ascendemos, de chofre, arrebatados na caudal dos ideais modernos, deixando na penumbra secular em que jazem, no âmago do país, um terço de nossa gente. Iludidos por uma civilização de empréstimo; respingando, em faina cega de copistas, tudo o que de melhor existe nos códigos orgânicos de outras nações, tornamos, revolucionariamente, fugindo ao transigir mais ligeiro com as exigências da nossa própria nacionalidade, mais fundo o contraste entre o nosso modo de viver e o daqueles rudes patrícios mais estrangeiros nesta terra do que os imigrantes da Europa. Porque não no-los separa um mar, separam-no-los três séculos (…)”

    A obra é literária, mas a guerra de Canudos é uma realidade viva até hoje. O autor já afirmara que “foi um refluxo em nossa história.”

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