O indefectível Renan
Renan não muda. Usa e abusa, é o Renan de sempre. Para manter o mandato, lá atrás, foi obrigado a deixar a presidência do Senado. Entregou os anéis e manteve os dedos. Mas, com os dedos e as mãos largas, continuou pintando e bordando.
Pintou e bordou tanto que caiu de cara na tela da Lava-Jato, envolvido em 8 inquéritos da operação, em curso no Supremo Tribunal Federal. Há outros no mesmo tribunal. Em um deles, já figura como réu, acusado da prática de estelionato, crime de apropriação de recursos públicos.
Mas Renan é Renan, o indefectível Renan. Reagiu à informação do recebimento da denúncia pelo Supremo com cinismo. Sem mover um músculo da face, adiantou que somente agora terá condições de provar sua inocência. Com a maior desfaçatez, passa uma borracha no passado e tenta apagar os fatos, como se nada tivesse ocorrido. Mônica Veloso e sua filha, a quem a empreiteira Mendes Junior pagava pensão mensal, notas fiscais falsas, pagamentos com recursos do Senado, negociações suspeitas na compra de gado e ‘otras cositas mas’ nunca existiram. Uma reação típica de alienado ou alguma forma de psicopatia? Com a palavra, os especialistas.
Ainda bem que o Supremo não entrou nessa – um placar de 8 a 3, com exceção dos conhecidos ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que votaram em favor de Renan. A propósito, em sessão anterior no Senado, Gilmar Mendes já se mostrava afinadíssimo com o alagoano, ao se opor às posições firmes do juiz Sérgio Moro.
Renan antes já manobrara para votar e aprovar de cambulhada o projeto oriundo da Câmara, que desfigurou em grande parte as 10 medidas de combate à corrupção apresentadas pelo Ministério Público Federal. Em boa hora foi derrotado e a proposta encaminhada para exame da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, seguindo rito regimental. É claro que não se defende a iniciativa como perfeita e acabada, não sujeita a aprimoramentos ou revisões, pelo simples fato de ter respaldo em mais de 2.000.000 de assinaturas da população brasileira. Nada disso, no projeto há distorções e equívocos que precisam ser corrigidos, contanto que em situação regular e não em votação na calada da madrugada.
Renan Calheiros perdeu as mínimas condições de continuar presidindo o Senado. Permanece na função porque o ministro Toffoli – sempre o Toffoli, com pedido de vista, suspendeu o julgamento do processo no Supremo que avaliava a hipótese de um réu ser mantido na linha de substituição do presidente da República. Já havia maioria folgada no colegiado contra tal possibilidade, mas o antigo advogado do PT não hesitou um só segundo em atropelar a manifestação majoritária do tribunal, jogando para as calendas a confirmação da decisão, proferida em nome da decê ncia e da ética.
As manifestações de domingo em todo o Brasil exigiram a deposição de Renan e a Ordem dos Advogados do Brasil antes já se posicionara com igual objetivo. Assim, tudo indica que o alagoano retornará às origens, reencontrando-se como antigo parceiro de Collor, como se mostrava antes de dar o grande salto nessa esquisita República brasileira, que o acolheu em cargos da mais alta relevância.
Paciência, é o Brasil, o Brasil em estado de coma, mergulhado no mar de lama da corrupção. Um dia o retiraremos da letargia profunda e construiremos uma Nação realmente livre e democrática.
paulofigueiredo@uol.com.br