O demônio, o pecado…
O Evangelho (Mc 1, 21-28) apresenta – nos Jesus pregando, na Sinagoga de Cafarnaum, no dia de sábado. Conta que Ele “começou a ensinar” e os seus ouvintes “se maravilhavam… porque ensinava como quem tem autoridade”. Até o espírito impuro, presente num homem, se dá conta da Sua presença e, enquanto grita, não deixa de reconhecer em Jesus “o Santo de Deus.” Ao expulsar o demônio, libertando o possesso, todos ficam maravilhados e dizem: “Que é isto? Eis uma nova doutrina e feita com tal autoridade que até manda nos espíritos impuros, e eles obedecem-lhe”. À eficácia da palavra de Jesus acrescentava a dos sinais de libertação do mal. Santo Atanásio observa que “comandar os demônios e expulsá – los não é obra humana, mas divina”; com efeito, o Senhor “afastava dos homens todas as doenças e todas as enfermidades. Quem, vendo o seu poder… ainda duvidaria que Ele é o Filho, a Sabedoria e o Poder de Deus?” A autoridade divina não é uma força da natureza. É o poder do amor de Deus que cria o Universo e, encarnando-se no Filho Unigênito, descendo à nossa humanidade, purifica o mundo corrompido pelo pecado. Romano Guardini escreve: “Toda a existência de Jesus é tradução do poder em humildade… é a soberania que se abaixa à forma de servo”. Para Deus a autoridade significa serviço, humildade e amor; significa entrar na lógica de Jesus, que se inclina para lavar os pés aos discípulos ( Jo 13,5), que procura o verdadeiro bem do homem, que cura as feridas, que é capaz de um amor tão grande que O leva a dar a sua vida, porque é Amor. Numa das suas Cartas, Santa Catarina de Sena escreve: “É necessário que nós vejamos e conheçamos, na verdade, com a luz da fé, que Deus é o Amor supremo e eterno, e não pode desejar outra coisa, a não ser o nosso bem”.
Desde a chegada de Cristo, o demônio bate em retirada, mas o seu poder é ainda muito grande e “ a sua presença torna-se mais forte à medida que o homem e a sociedade se afastam de Deus” (São João Paulo II); devido ao pecado mortal, não poucos homens ficam sujeitos à escravidão do demônio, afastam-se do Reino de Deus para penetrarem no reino das trevas, do mal; convertem-se, em diferentes graus, em instrumento do mal no mundo e ficam submetidos à pior das escravidões. Jesus sabe que para libertar a humanidade do domínio do pecado, Ele deverá ser sacrificado na Cruz como verdadeiro Cordeiro Pascal. O demônio, por sua vez, procura distraí – lo em vista de o desviar ao contrário para a lógica humana de um Messias poderoso e com sucesso. A Cruz de Cristo será a ruína do demônio, e é por isso que Jesus não cessa de ensinar aos seus discípulos que para entrar na sua Glória deve sofrer muito, ser rejeitado, condenado e crucificado ( cf.Lc 24, 26), dado que o sofrimento faz parte integrante da sua missão.
“Jesus intimou o espírito mau: cala-te e sai dele! Então o espírito mau sacudiu o homem com violência, deu um grande grito e saiu” ( Mc 1,25-26). Os Evangelhos apresentam vários relatos de curas miraculosas. A vitória sobre o espírito imundo, nome que se dava correntemente ao demônio, é sinal claro de que chegou a salvação divina: Jesus, ao vencer o Maligno, revela-Se como o Messias, o Salvador, com um poder superior ao poder dos demônios: “É agora o julgamento deste mundo. Agora o príncipe deste mundo vai ser expulso” ( Jo 12,31 ). Ao longo do Evangelho torna-se patente a luta contínua e vitoriosa do Senhor contra o demônio.
A oposição do demônio a Jesus vai aparecendo, cada vez mais clara: é solapada e sutil no deserto; manifesta e violenta nos endemoninhados; radical e total na Paixão, que é “a hora e o poder das trevas” (Lc 22, 53). A vitória de Jesus é também cada vez mais patente, até ao triunfo total da Ressurreição.