• O Caminho da Resiliência

  • 23/out 08:00
    Por Gil Kempers

    O desastre de 2022 em Petrópolis, um desastre complexo

    Os desastres a cada dia ganham mais espaço na mídia e na boca do cidadão comum. Nas rodas de conversa, e principalmente observando o que acontece no Brasil e no mundo. Semana passada assistimos a cidade de São Paulo atravessar uma semana de caos por falta de luz, por conta de uma chuva intensa seguida de raios e ventos fortes. As discussões sobre ações preventivas, alertas, rotas de fuga, e outros, deixaram de ser assunto apenas de pesquisadores, cientistas e pessoas ligadas à defesa civil e passaram a fazer parte do cotidiano, dos grupos de mensagens e dos assuntos mais comentados no país.

    Nesta linha, os conceitos e teorias sobre desastres também vem evoluindo e os estudos sobre o tema ganham força, principalmente depois do incremento das mudanças climáticas, que intensificam os desastres, bem como diminuem o tempo de recorrência entres eles.

    Desta forma a classificação dos desastres também vem evoluindo e neste sentido, surge o conceito de desastres complexos, principalmente pelos recentes episódios tanto no Brasil, como em outros países.

    Pelo mundo podemos observar desastres como o tsunami no Oceano Índico (2004), furacão Katrina (2005), incêndios florestais na Austrália (2008), o rompimento da barragem em Brumadinho (2019) e as grandes inundações no Rio Grande do Sul em 2023 e 2024, são exemplos de desastres de grande magnitude e que são considerados pontos fora da curva. Assim, necessitam de uma avaliação especial, podendo então ser considerados desastres complexos.

    Na minha tese no Mestrado da Universidade Federal Fluminense (UFF), abordei o tema das Ações Operacionais de um Gabinete de Crise em Eventos Extremos e Desastres Complexos: um estudo de caso sobre o Desastre de Petrópolis/2022. A relevância do tema e a importância para os próximos anos é essencial para a preservação de bens e salvamento de vidas.

    Então, o que são desastres complexos?

    Podemos dizer que os desastres são fenômenos que podem ser classificados em diversas formas, mas os desastres complexos podem ser caracterizados por combinar múltiplas dimensões, acarretando impactos físicos e sociais, demandando a necessidade de uma resposta coordenada em diversas linhas de frente.

    Os desastres complexos surgem da análise de crises sociais, na raridade e imprevisibilidade da teoria dos Cisnes Negros. Assim, trazendo para a realidade dos desastres socioambientais, fazendo uma analogia as crises sociais, principalmente pela alta vulnerabilidade social de algumas comunidades aos eventos naturais, quando uma ocorrência de um evento adverso desencadeia uma série de consequências e outros, causando danos físicos e prejuízos, agravando ainda as condições sociais locais. Desta forma os desastres complexos podem ser classificados em múltiplos, em cascata ou prolongados.

    Os desastres complexos são extremamente raros, com grande imprevisibilidade, com grande impacto que desafiam a capacidade convencional de previsão e planejamento, principalmente pela condição inesperada, sendo um grande desafio para a gestão de risco e gerenciamento de desastres. Os desastres complexos forçam novas metodologias e novos caminhos, tanto para a gestão de risco quanto para lidar com as incertezas de eventos extremos.

    Os desastres em cascata ocorrem de um evento inicial e geral consequentes desastres, ampliando a crise. Um exemplo é um terremoto, que desencadeia na sequência inundações, surtos de doenças e outros.

    Os desastres prolongados se caracterizam por ter uma longa duração, como estiagem prolongadas, causando conflitos, desabastecimentos e outras consequências. Os eventos podem durar meses ou anos, agravando o quadro com o aparecimento de doenças e outros elementos.

    Por fim, os desastres múltiplos ocorrem quando um evento adverso ocasiona simultaneamente outros eventos adversos, como o ocorrido em Petrópolis, em 2022.

    Realmente o evento de 2022 em Petrópolis foi uma quebra de paradigma em diversos caminhos da ciência, tanto que a chuva foi classificada como convectiva e orográfica, mudando inclusive a forma de enxergar o fenômeno. No dia 15 de fevereiro, alguns locais foram registrados 121 mm/h como foi o caso de São Sebastião, perfazendo entre 16h30 e 21hh30 mais de 457mm. Realmente é um volume muito intenso, em um curto espaço de tempo, não sendo cabível em nenhum solo do mundo a absorção deste montante, causando simultaneamente movimentos de massa, escorregamentos, inundações e enxurradas.

    Portanto, tanto a ciência quanto a sociedade precisam entender melhor os fenômenos, que podem ser cada vez mais frequentes e intensos, indicando um novo normal.

    Petrópolis é sim uma cidade de alto risco geológico e requer uma atenção especial no país e no mundo na gestão de risco. Uma das provas disso, é que a cidade de Petrópolis é a número um do país em mortes decorrentes de desastres, somando mais de 500 vítimas fatais nos últimos 30 anos. Realmente é assustador esse dado!

    Mas essa realidade também indica que Petrópolis precisa ser a número um em resiliência, redução de risco e prevenção de desastres! É necessário o desenvolvimento de ações estruturais e não estruturais eficientes para salvar vidas e prevenir dados!

    Esse é o caminho, o desenvolvimento de uma cultura de resiliência e o conceito de governança em defesa civil. Só assim diminuiremos riscos e evitaremos mortes em nossa amada cidade!

    Seguimos firmes.

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