• O Caminho da Resiliência

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  • 23/jul 08:00
    Por Gil Kempers

    Os recentes Fenômenos Hidrológicos ocorridos nos EUA

    Na semana passada, a imprensa mundial noticiou os eventos hidrológicos extremos ocorridos nos Estados Unidos da América (EUA), que vitimaram mais de cem pessoas e deixaram um rastro de devastação, com elevados danos e prejuízos. Esse acontecimento nos indica que o mundo todo deve voltar seu olhar para a crise climática que envolve o planeta e a importância desse tema como política pública para o enfrentamento de desastres.

    Sabemos que todas as políticas públicas – como saúde, educação e muitas outras – são vitais para a população e seu desenvolvimento. Contudo, a política pública de defesa civil é prioritária diante do cenário atual das mudanças climáticas, principalmente porque todas as demais sucumbem em face de um desastre.

    As inundações afetaram especialmente o Texas e o nordeste do país, incluindo Nova York e Nova Jersey, além do Novo México e da Carolina do Norte. O Texas foi o estado mais atingido, onde o rio Guadalupe transbordou rapidamente, em especial no condado de Kerr. A região registrou 130 mortos, e indica-se que a localidade apresentou falha na emissão de alertas, principalmente por ser uma área muito utilizada por campistas.

    Em Nova York, as chuvas intensas inundaram estações de metrô, e a mobilidade urbana foi severamente afetada. O estado de Nova Jersey chegou a declarar estado de emergência, tendo em vista os severos impactos. Os relatos indicam uma intensidade e rapidez elevadas das inundações, o que intensifica as discussões sobre a preparação local para o enfrentamento dessa crise.

    É importante ressaltar que o condado de Comfort, vizinho ao condado de Kerr, dispõe de um sistema de alerta e alarme por sirenes, que foi acionado durante o feriado de 4 de julho, e não foram registradas vítimas fatais. No entanto, o condado de Kerr não possui essa ferramenta e apresentou um número elevado de vítimas, especialmente pelo fato de as pessoas terem sido pegas de surpresa durante o evento, ainda mais com a informação de que a elevação do rio aconteceu à noite.

    Nesse contexto, a discussão sobre o investimento em defesa civil também ganhou o cenário americano, onde muitas pessoas questionaram a falta de investimento em prevenção. É correto afirmar que esse pensamento é o adequado. O investimento nas ações que antecedem o desastre, como prevenção, preparação e mitigação, são mais baratos e eficientes que as ações de resposta e recuperação, que ocorrem durante e depois do desastre. Esse tema já foi comprovado até mesmo em artigos acadêmicos, como o de Kobiyama (2004), que faz essa comparação: para cada R$ 1,00 investido em prevenção, economizam-se R$ 50,00 na resposta e na reconstrução, além, é evidente, de salvar vidas e diminuir danos e prejuízos. Por esse motivo, a política pública de defesa civil deve ser repensada e elevada ao patamar necessário.

    Para que se tenha uma pequena noção disso, a legislação vigente no país que trata do tema defesa civil, a Lei nº 12.608/2012 – que estabelece a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil, promulgada após a tragédia da Região Serrana em 2011, com aproximadamente 1.000 mortes –, não prevê recursos para prevenção, preparação e mitigação. Ela destina recursos a um município afetado por desastres somente depois que um desastre acontece, ou seja, para resposta e recuperação. Mesmo sendo uma lei muito importante, que gerou muitos avanços, está na hora de atualizá-la e buscar atender a todo o ciclo de defesa civil, especialmente destinando recursos para os estados e municípios antes dos desastres, para que possam preparar a população diante das ameaças existentes.

    Nesse sentido, deve-se pensar em um sistema único de defesa civil, nos moldes do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), prevendo repasse de recursos e destinando valores para a ponta, para os territórios, onde efetivamente o desastre acontece.

    Assim como ocorreu após o desastre nos Estados Unidos, esta semana a sociedade passou a questionar as ações de prevenção nos locais mais afetados, buscando desenvolver medidas que previnam novos desastres como esse. Nessa esteira, é muito importante que a sociedade civil e o poder público concentrem esforços para evitar novos eventos dessa natureza.

    Na mesma linha, o Brasil deve pensar nas ações que antecedem os desastres, a fim de preveni-los e preparar os territórios e populações para o seu enfrentamento. Diante das mudanças climáticas, da intensificação dos fenômenos e da redução do tempo de recorrência, os desastres são uma realidade que efetivamente afetará a população. Na verdade, já passou da hora de encarar essas ameaças com planejamento e ações concretas de redução de risco.

    Seguimos firmes!

    **Contato com o autor: gkempers@id.uff.br

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