O 8 de janeiro de Lula sem povo
A comemoração do 8 de Janeiro a portas fechadas, dentro do palácio, dá bem a medida da grande distância existente entre o atual governo e o povo brasileiro. É sintomático o receio do andar de cima de se expor junto à população. O presidente da república só entra em contato com plateias pré-selecionadas para evitar ter que ouvir palavrões. Membros do STF se escondem em salas vip dos aeroportos pela mesma razão. O poder legislativo federal em sua criatividade macabra inventou o impensável: o orçamento secreto. O cidadão tem o “direito” de pagar a conta sem saber aonde vai ser usado o dinheiro dos impostos pagos por ele. Só a corrupção explica.
O quadro político-institucional é, sem dúvida, surrealista. O passeio de Lula ao longo da parede com fotos dos ex-presidentes da república brasileira, com nomes e períodos em que ocuparam o cargo, foi seguido de sugestões estapafúrdias de sua excelência. Uma delas é que ex-presidente Temer não foi eleito, como se o eleitor não tivesse visto as fotos da chapa Dilma e Temer ao votar. A outra pérola é que, sob a foto da Dilma, deveria estar escrito que ela foi vítima de um golpe, e não do impeachment democraticamente votado. Pior: propôs, que as mentiras de Bolsonaro fossem mencionadas sob a foto do antecessor. Esqueceu, obviamente, das dele.
As manifestações pacíficas de repúdio à eleição de Lula tiveram como pano de fundo o repúdio da população ao que foi denunciado pelo ex-ministro Marco Aurélio Mello ao afirmar que o STF ressuscitou Lula politicamente. Ou seja, extrapolou suas atribuições constitucionais nos vendendo gato por lebre. Atuar politicamente não é função do STF, mas sim de zelar pelo que está escrito na constituição federal. A ministra Carmen Lúcia chegou a reconhecer que houve decisões do STF, aqui inclusas diversas delas do ministro Alexandre de Moraes, que passaram por cima da constituição.
Ainda me recordo de um grande intelectual inglês, cujo nome não me lembro no momento, em seu desencanto com as práticas da doutrina comunista que negavam a verdade dos fatos. A vida política deveria obedecer a uma estranha lógica em que o real era confeccionado pelos interesses de classe bem na linha do pensamento único. Paul Johnson, em seu excelente livro intitulado “JESUS – Uma biografia de Jesus Cristo para o século XXI” nos diz o seguinte: “Jesus era conhecido por sua gentileza, paciência e tolerância. (…) Não tinha gosto por qualquer tipo de legalismo ou lógica ponderada (…).
Parecer até que Cristo estava fazendo a defesa do irracional. Mas, na verdade, Ele ia mais fundo. Nunca me esqueci de um advogado conhecido meu ao me relatar um episódio de sua vida em que ele reconhecia estar errado, mas se valeu da lógica jurídica torta para se gabar de como passou a perna no próximo que tinha razão. A lógica ponderada do legalismo do STF busca esconder a defesa de interesses espúrios sob a capa de defesa da democracia.
A história francesa nos revela no que dá cortar as relações necessárias e respeitosas entre governantes e governados. É fato histórico conhecido a decisão de Luís XIV (1638-1715), o Rei-Sol, de concentrar a nobreza no palácio de Versalhes supostamente para poder controlá-la melhor. Anulou seu papel fundamental de correia de transmissão entre o povo e o rei. Demorou quase ¾ de século, mas acabou dando na Revolução Francesa. Idiotice semelhante jamais foi cometida pelos reis e rainhas ingleses. A monarquia francesa morreu e a inglesa está viva e saudável até hoje. E fiel ao bem comum.
Algumas previsões não são tão difíceis de serem feitas. A reação conservadora está em andamento no Brasil. E a conversa da grande mídia de ver nesse processo as pegadas da extrema direita (aliás, no Brasil não existe extrema esquerda) cai no vazio. Trata-se de uma reação saudável da população diante dos desmandos de toda ordem nas diversas esferas, em especial no que tange aos padrões morais e ao desrespeito contumaz ao dinheiro público. A onda de indignação vai desaguar nas próximas eleições. Quem viver, verá.
A mentira, fiel companheira de Lula, continua fazendo das suas. Seu grau de confusão mental pode ser avaliado por suas últimas iniciativas. Depois das reiteradas sugestões do ministro Haddad sobre a importância dos cortes de despesas para dar maior eficiência ao governo federal, Lula resolveu acoplar à redução de gastos um aumento de gastos com a isenção do imposto de renda de quem ganha até 5 mil reais por mês. O mercado percebeu logo a pirueta mental de Lula, e deu o troco: o dólar explodiu e a taxa de juros, a SELIC, foi na mesma direção. Mas a narrativa de Lula nos diz que o culpado é o mercado. Simples, e idiota, assim.
A crença em narrativas de Lula, percebida por todos exceto ele, se manifestou na reforma ministerial que deve ocorrer neste início de 2025. Sua primeira reocupação foi trocar o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, pelo marqueteiro Sidônio Palmeira da época de sua última campanha presidencial. Ou seja, Lula continua no palanque, sempre pronto a fazer uso de mentiras para continuar no poder. Tenta encobrir seus desmandos sob a alegação de que os méritos de seu governo estão padecendo da falta de boa divulgação junto à população. Como sempre, terceiriza a culpa.
O competente economista Mario Henrique Simonsen ironizava o conceito de média com o exemplo do indivíduo com a cabeça no forno e os pés no freezer que, na média, estaria bem. É uma boa metáfora para o que vem acontecendo com a inflação nos últimos 12 meses. A despeito de a taxa de inflação ter ficado, em 2024, em 4,83%, pouco acima do limite superior da meta de 4,5%, ela não conseguiu esconder o que aconteceu com as taxas referentes à alimentação, educação e saúde. Estas ficaram respectivamente nos seguintes percentuais: 7,56; 6,70 e 6,09. Ou seja, justamente nos itens mais dolorosos para a população de baixa renda, que sentiu o drama no próprio bolso.
É por essas e outras que a população sumiu da solenidade do 8 de Janeiro.
**Sobre o autor: Gastão Reis é empresário e economista