Novo ‘Poderoso Chefão’, que Coppola reeditou e melhorou, chega aos cinemas
No início do ano, quando os estúdios Paramount anunciaram que o diretor Francis Ford Coppola retrabalharia o filme O Poderoso Chefão III, criou-se uma grande expectativa. Afinal, o longa rodado em 1990 é considerado o pior da trilogia sobre a família Corleone, muito aquém das duas primeiras partes que são obras-primas. Desde a pálida atuação da filha do diretor, Sofia Coppola (hoje, uma renomada cineasta), até o desfecho insatisfatório, o filme deixava a desejar.
Não mais – a partir desta quinta (3), quando O Poderoso Chefão – Desfecho: A Morte de Michael Corleone estreia nas salas de cinema (e, no dia 8, chega às plataformas digitais), Coppola não apenas recupera seu trabalho como finalmente oferece o longa que desejava. O próprio diretor, aliás, aparece antes do início da projeção, explicando suas escolhas. “Graças à gentileza da Paramount Pictures de me deixar revisitar esse projeto, eu o reeditei e dei a ele um título que não é exatamente novo, mas é o título original”, comenta.
Coppola foi, na verdade, diplomático ao se referir à bondade do estúdio – a produção foi acidentada e a Paramount não aceitou que o longa tivesse como subtítulo A Morte de Michael Corleone, como desejavam Coppola e o roteirista Mario Puzo. O estúdio também ofereceu um salário minguado para Robert Duvall, excelente como o conselheiro da família Corleone, Tom Hagen – naquelas condições, o ator não aceitou participar do filme. Assim, era inevitável a fraca recepção (se comparada às sequências anteriores) e ao fracasso no Oscar: apesar das sete indicações, não venceu em nenhuma.
No título original, consta a palavra “coda” que, em português, se transformou em “desfecho”. “Em termos musicais, uma coda é uma espécie de desfecho. É um resumo. E era isso que gostaríamos que esse filme fosse. Você verá um filme com um começo diferente, um final diferente. Muitas cenas foram reposicionadas e penso que o filme ganhou uma nova vida. O que, de fato, serve para elucidar o que os dois primeiros filmes significaram”, continua o diretor, quase irreconhecível, pois está mais magro, com a barba grisalha.
De fato, comparada ao longa que estreou em 1990, a nova versão começa exatamente com a cena que, na anterior, surge quando já foram transcorridos 40 minutos de projeção. Com isso, Coppola foca precisamente na relação insidiosa entre o poder da Igreja e o dinheiro corrompido. Se os minutos iniciais antes reforçavam a importância da família e da religião para os Corleones até chegar àquele ponto, o cineasta, que hoje está com 81 anos, torna a relação o ponto central da trama.
É curioso como Coppola não escondeu, ao longo dos anos, sua insatisfação com as decisões unilaterais do estúdio em relação ao título do filme e também com a forma com que a trama é inicialmente narrada – em comentários que figuram em versões em DVD de O Poderoso Chefão III, o diretor explicita sua decepção com a falta de liberdade criativa (“naquela época, meu poder de decisão estava em baixa”) e revela que pretendia iniciar a narrativa com a cena que ora figura na nova versão, “em que o arcebispo Gilday (Donal Donnelly) relata a Michael Corleone (Al Pacino) como o Vaticano teria se metido em dificuldades financeiras”.
Coppola conta que seu colaborador Walter Murch, porém, sugeriu que seria melhor tratar antes da vida familiar e particular e depois entrar nos negócios. “Em vez de dizer ‘não é nada pessoal, são apenas negócios’, é como se dissesse ‘não são negócios, mas assuntos pessoais’, o que definiria melhor a postura de Don Corleone. Então, decidimos começar com a cerimônia em que Michael é condecorado pela Igreja pelas generosas doações.”
Com o novo formato, o longa que, ao longo dos anos foi criticado pelo desenvolvimento lento e que mais parecia uma recauchutagem de seus predecessores imaculados, ganhou mais agilidade e precisão. E, ao reposicionar a cena (que, de uma certa forma, remete ao início do pioneiro O Poderoso Chefão), Coppola acerta ao deixar às claras a intenção do mafioso: Michael está saldando a dívida da Igreja Católica para legitimar os negócios da família Corleone e, não à toa, se tornar um dos homens mais ricos do mundo. Por ser um filme pródigo em excelentes diálogos, a cena termina com Gilday se lamentando: “Parece que, no mundo de hoje, o poder de absolver dívidas é maior que o poder de perdoar”. Ao que Michael retruca: “Nunca subestime o poder do perdão”.
Naquela fase da vida, Michael é um homem atormentado e em crise – exatamente como Coppola, no início dos anos 1990, quando acumulava fracassos e despertava a desconfiança da crítica, que previa encerrado seu talento. “Foi um momento em que me sentia como ele, tentando entender o que era mais importante que fama e dinheiro, e, ao decidir fazer o terceiro filme, só poderia ser com um Michael Corleone mais velho. Naquela época, eu já sabia, como ele, que a realização é ver os filhos e a família prosperarem.”
É em busca disso que Michael luta, no final da existência. Para isso, aceita a contragosto a carreira de cantor de ópera do filho Tony (Franc D’Ambrosio) e concede à filha Mary (Sofia Coppola) a presidência do instituto beneficente da família. Depois de uma vida cumprindo à risca as regras de um jogo de poder (em que se sentiu obrigado até a matar um de seus irmãos), Michael busca a expiação e, quem sabe, paz.
Coppola também alterou o final do filme, que não convém aqui revelar. Apenas não foi possível “melhorar” a interpretação de Sofia. Em sua defesa, porém, a atriz Diane Keaton, que vive Kay, ex-mulher de Michael, disse, ao ver a nova montagem: “Mary tem como pai o líder de uma organização criminosa. É insegura, quieta, um tanto assombrada. Sofia foi fantástica”.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.