Na magia do teatro
19 de agosto é o dia consagrado ao Artista de Teatro. Data mágica como mágico é o Teatro.
Chego apressado. Me desnudo da roupa do dia a dia, que fica pendurada no cabide do camarim, e visto a fantasia destinada ao meu personagem. Ajeito aqui, me ajeitam ali, cubro os poucos fios de cabelo de minha cabeça com farta peruca, borrifo maquilagem no rosto. Me encaro no embaçado espelho e aquele não mais sou eu.
No dizer do grande dramaturgo Somerset Maughan, em fala de sua peça “Adorável Júlia”,eis a síntese perfeita do projeto: “O Teatro é mágico. E não é imagem poética, não! Verdade mesmo. Veja o senhor : por um par de horas, subimos lá e somos aquilo que não somos. É magia. Enquanto isso, vocês, espectadores, se nós formos bons atores, transportam-se para o palco e vivem vidas que, absolutamente, não são suas. É como na Cinderela : velha vira fada, melancia vira carruagem, ratinho vira cavalo. O Teatro é uma vara de condão!”
Quanta sabedoria em uma definição perfeita e somente aqueles que têm oportunidade de subir ao palco, compreendem tanta magia. O momento é de santa responsabilidade porque não está o ator diante de câmeras para filmagens, que podem repetir cenas até a perfeição, mas cara-a-cara, hálito com hálito, presença viva diante de olhares cobradores e ansiosos… É o momento do frio na espinha, da responsabilidade por enfrentar a ansiedade de uma platéia, no desejo de não ser nada a não ser o personagem que possa comover e prender a quantos amam o Teatro.
Eu, Ator, deixo na coxia minhas inseguranças, meus valores, minha vida, para penetrar num espaço novo de atuação, onde me transformo em personagem o qual deve ser absorvido pelos espectadores como complemento de seus sentimentos, como exemplos de comportamentos, como infinitos auto-reencontros.
Porque, de repente, eu sou um mendigo, um rei, um bobo-da-corte, um homosexual, uma donzela, uma criança, um galã, um velho carcomido de tristezas, um louco insano ou filósofo, um animal da escala zoológica, uma bruxa, um romântico, um vilão medonho, um santo, um demônio, um verme, um alguém…
E vivo vidas que, absolutamente, não são minhas, parafraseando Maughan.
Aos meus colegas Atores e Atrizes os meus aplausos, principalmente aos jovens iniciantes, notadamente aos veteranos, da parte de um Ator que vem de seis lustros enfrentando platéias, aprendendo sempre que o Teatro é a arte das artes pelo universo que abraça em seus tentáculos miraculosos de coragem e desprendimento e, naturalmente, explorando o talento dos predestinados.
Para todos, a reprodução de um soneto antigo, que escrevi no século que passou: “O ARTISTA / Ri artista; gargalha de alegria! / demonstra ao mundo que toda desgraça / que leva o homem à triste nostalgia / é esquecida com teu riso e graça! / Chora artista ; perlustra a triste via / na crueza do drama que ultrapassa / a realidade do que a mente cria… / No caminho da dor tua arte passa! / Ri e chora do mundo os sentimentos / que forjam as paixões desenfreadas / e existem no teu ser só por momentos. / E, ´inda artista eleva o teu riso / para a beleza irreal das fadas, / obrando neste mundo um paraíso!”
Abacadabra! Estamos no Teatro!