• Mesmo com escassez de chuvas, energia é risco de -0,5 pp para IPCA de 2024

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  • 03/mar 07:01
    Por Cícero Cotrim / Estadão

    Apesar da escassez de chuvas e do aumento da demanda por energia, os preços de eletricidade são um risco para baixo no IPCA de 2024. Economistas reconhecem a chance de um aumento da bandeira tarifária, de verde para amarela. Mas outros dois fatores – o julgamento da Tust/Tusd no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o uso de recursos da Eletrobras para baratear contas de luz – mantêm o viés negativo, de até 0,5 ponto porcentual.

    Os economistas ouvidos pela reportagem atribuem nos seus cenários probabilidades entre 30% e 40% de mudança da bandeira para amarela, com impacto entre 0,1 e 0,17 ponto porcentual no IPCA – a depender do resultado de uma consulta pública feita pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para alterar a taxa extra. Para que o impacto apareça na inflação deste ano, a nova bandeira teria de ser mantida até dezembro.

    Mas o impacto dessa mudança seria ao menos quase totalmente compensado pela antecipação de recursos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) da Eletrobras. Essa medida – mencionada pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, na semana passada – pode mobilizar até R$ 26 bilhões para empréstimos às distribuidoras com a “conta covid” e “conta escassez hídrica”, barateando a energia.

    “Ainda não está claro quanto desses recursos serão usados e como isso vai ser distribuído ao longo dos anos”, diz João Fernandes, economista e sócio da gestora de recursos Quantitas. “Se o governo realmente optar por antecipar os R$ 26 bilhões, o impacto negativo dessa medida no IPCA pode ser maior do que 0,20 ponto porcentual, mas ele não precisaria usar tudo para mitigar os impactos dessas contas na energia.”

    Embora Silveira tenha levantado a possibilidade de securitizar esses recursos para obtê-los logo, o economista lembra que isso levaria ao pagamento de juros. Portanto, ele considera mais provável um acordo entre Executivo e Eletrobras, o que dificultaria a antecipação do montante total de R$ 26 bilhões, devido ao caixa da empresa.

    Hoje, Fernandes considera mais provável que o governo use recursos mais próximos de R$ 12 bilhões a R$ 14 bilhões, o que retiraria 0,1 ponto do IPCA de 2024. Nas contas dele, isso compensaria totalmente o acréscimo de um eventual aumento da bandeira – também de 0,1 ponto, considerando uma revisão para baixo na sobretaxa. A Quantitas atribui probabilidade de 30% a 35% de bandeira amarela no fim do ano.

    A estrategista de inflação da Warren Investimentos, Andréa Angelo, calcula que o uso de R$ 12 bilhões da CDE retiraria 0,15 ponto porcentual do IPCA de 2024, a depender do fluxo de pagamentos, que será regulamentado via Medida Provisória (MP). Esse efeito, ela diz, quase compensaria um aumento da bandeira para amarela, que adicionaria 0,17 ponto ao IPCA, sem considerar a revisão das taxas.

    “O acionamento da bandeira ainda não é o cenário-base, porque o pessoal do ONS deve tentar gerenciar esses problemas para entrar em 2025 numa situação menos pior, mas sem mexer na bandeira”, diz a estrategista. “Nós não incorporamos no cenário, mas está no radar.”

    Taxas

    Mesmo diante desses fatores, o principal risco para os preços de energia este ano continua centrado em um evento do calendário jurídico: o julgamento, no STJ, de recursos que discutem a inclusão das Tarifas de Uso do Sistema de Transmissão (Tust) e de Uso do Sistema de Distribuição (Tusd) na base de cálculo do ICMS. A corte deve se reunir para debater o tema no início de março.

    Tanto Angelo quanto Fernandes calculam que um decisão favorável ao contribuinte – isto é, de retirar as taxas da base tributária – resultaria em um impacto negativo em torno de 0,4 ponto porcentual para o IPCA deste ano. Descontando os outros fatores e partindo da mediana do último relatório Focus, a inflação de 2024 cairia de 3,80% para 3,40%, apenas 0,4 ponto acima do centro da meta, de 3%.

    Para ambos os analistas, a maior probabilidade é de uma decisão pró-Estados – ou seja, de manutenção da Tust e Tusd na base do ICMS -, mas o outro resultado não pode ser descartado. “A assimetria da energia para o IPCA é baixista, mesmo sem atribuir chance elevada desse impacto mais forte, da Tust/Tusd, acontecer”, diz Angelo, que espera IPCA de 4% este ano, sem incluir no cenário nenhum dos vetores de baixa.

    Fernandes, da Quantitas, espera IPCA de 4% este ano, já levando em conta um impacto negativo de 0,2 ponto porcentual de energia elétrica, feito com base na ponderação dos impactos pelas probabilidades de concretização. Ele calcula chance em torno de 60% de decisão pró-Estados pelo STJ, mas diz que não é possível descartar o outro desfecho.

    “Pessoalmente, eu acho que o STJ não vai aprovar isso, ou vai adiar o julgamento e depois não vai aprovar, porque o impacto fiscal é muito grande. Mas está longe de ser claro”, diz o economista. “A energia elétrica se consolidou como um risco de baixa para o IPCA deste ano.”

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