• Maio Laranja: educadores do CDDH falam sobre a importância da campanha e o trabalho realizado pela instituição

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  • 19/maio 08:18
    Por Maria Julia Souza

    Instituído pela Lei Federal 9.970/00, o dia 18 de maio se tornou a data nacional de combate ao abuso e à exploração sexual infantil no Brasil. O “Maio Laranja” é uma iniciativa que visa dar visibilidade ao tema. Os educadores do Centro de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH) Petrópolis, Cleunice Fernandes e Jonathas Marinho, falaram um pouco sobre a data e a importância da campanha.

    Segundo os dados da Campanha Maio Laranja, a cada hora, três crianças são abusadas no país e cerca de 51% tem entre um e cinco anos de idade. Todos os anos, 500 mil crianças e adolescentes são explorados sexualmente no Brasil e há dados que sugerem que somente 7,5% dos casos chegam a ser denunciados às autoridades.

    Importância da data

    Para os educadores, o principal objetivo da data é fazer com que toda a sociedade pare para pensar na importância de defender crianças e adolescentes, pensando em políticas públicas para que eles tenham uma infância saudável e segura.

    Cleunice Fernandes e Jonathas Marinho.
    Foto: Maria Julia Souza

    “Quando a gente fala de um mês que tem uma data separada para pensarmos e refletirmos sobre alguma questão que temos na nossa sociedade, principalmente quando estamos falando de abuso infantil, é muito importante. Porque as crianças são essenciais e costumamos falar que elas são o futuro do Brasil. Mas são pequenas pessoas, que são frágeis, dependentes e que não têm como se defenderem sozinhas”, disse Jonathas Marinho.

    “É importante a gente pensar, enquanto sociedade, em projetos que previnem. Porque a criança é vulnerável. Eu acho que quando se tem uma data, uma ação, é importante olharmos para ela todos os dias, mesmo porque elas [crianças e adolescentes] estão totalmente vulneráveis”, explicou Cleunice.

    Jovens atendidos pelo CDDH

    Jonathas explica que a instituição realiza o trabalho de escuta ativa de alguns casos que chegam ao CDDH.

    “A gente ouve esses casos, acolhemos, encaminhamos para os órgãos de direito e fazemos o acompanhamento deles [casos]. Chega para a gente a todo momento essa questão de abuso infantil. O [abuso] sexual é o que talvez mais apareça, mas temos outros tipos de abuso”, explicou.

    Ele conta que, para esses casos, a equipe tem uma forma específica de lidar com as situações.

    Fotos: Maria Julia Souza

    “Isso mexe muito com a gente, porque nós trabalhamos com jovens e crianças, temos filhos e filhas aqui na equipe. Então a gente percebe o quanto elas são vulneráveis, o quanto isso é um problema muito urgente na nossa sociedade. É complexo, porque a gente vem falando sobre isso há muitos anos e sabemos que, desde que o mundo é mundo, existe esse tipo de abuso contra essa população. E é complexo também por isso, porque é um problema que existe há muitos anos e não temos uma posição concreta sobre ele”, contou ele.

    Ele reforça ainda que, na maioria dos casos, o abusador ou abusadora são pessoas próximas à vítima.

    “Então pode ser um tio, tia, avô, avó, pai ou padrasto. Isso traz um desafio maior para a gente, quando percebemos que esse perigo existe dentro de casa. Então a gente recebe muitos casos assim, de crianças que sofrem esse tipo de abuso e que são praticados por parentes ou familiares, que eu acho que é o mais difícil da gente lidar”, disse ele.

    Atendimento especializado

    Jonathas explica que os educadores da instituição estão cadastrados no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) e estão ligados diretamente a essa pauta.

    “Nós procuramos trabalhar esse assunto [abuso] com eles também, no sentido de trazer visibilidade e a importância de falar sobre isso. A conscientização também, porque às vezes os nossos jovens e as nossas crianças passam por situações que nem reconhecem o abuso, por vir das pessoas que eles têm como referência. Nós trabalhamos muito em rede também. O CMDCA é um órgão que a gente está junto, mas também tem o Conselho Tutelar que nós também articulamos. Então quando chega esse caso para a gente, já estamos preparados”, explicou ele.

    Foto: Maria Julia Souza

    Ele reforça o cuidado necessário em agir nesses casos, por se tratar de crianças e adolescentes.

    “Quando tratamos de crianças e adolescentes, tem que ter muito cuidado na forma que se conduz uma denúncia. Não pode ser de qualquer jeito, porque isso pode trazer retaliação para a própria criança. Porque você não denuncia e tira ela [daquele local], principalmente quando é uma situação em que os familiares são os causadores do abuso. Não é de uma hora para outra que a criança sai desse ambiente, tem todo um processo. Então temos todo um cuidado para lidar com essas questões, sempre tendo em mente que cada caso é um caso”, reforçou ele.

    Prevenção

    Para os educadores, o diálogo é a principal forma de prevenir novos casos. Eles explicam às crianças e adolescentes sobre como identificar um caso de abuso.

    “Quando falamos de prevenir, a gente precisa dialogar mais com as crianças e com os adolescentes. Particularmente eu entendo isso, que quando a gente fala de prevenção, falamos de comunicar. Nós precisamos nos comunicar com essas crianças e esses adolescentes. Mas não falamos de qualquer jeito, porque precisamos lembrar que estamos falando com crianças. O adolescente entende mais, mas com criança, principalmente, precisamos falar com elas de uma forma que chegue até elas, mas que seja cuidadosa, entendendo que o público é diferente”, disse Jonathas.

    “É trazer essa questão do diálogo e dar visibilidade para isso, no sentido do Maio Laranja. Porque às vezes quando trabalhamos com comunidade, quando estamos próximos, a família não consegue compreender que a criança está sofrendo um abuso. Então quando a gente dá visibilidade e dialoga, isso faz com que elas consigam entender e denunciar”, explicou Cleunice.

    Jonathas explica ainda uma temática utilizada com as crianças, chamada “Semáforo do Toque”, onde eles explicam os locais em que podem ser tocados ou não.

    “É a mesma ideia do semáforo que a gente tem de carro, nós levamos para eles e desenhamos uma criança, uma silhueta feminina e outra masculina. E aí vamos perguntando para eles quais os lugares que acham que uma pessoa pode tocar. O verde é o lugar em que pode tocar, o amarelo tem que tomar atenção e o vermelho não pode tocar de jeito nenhum. Essa informação de dizer a eles onde pode ou não tocar é muito importante, falar práticas que não são naturais de acontecer, nem quando se trata de familiares, dizer que se elas se sentirem assim podem procurar ajuda”, explicou ele.

    Foto: Maria Julia Souza

    Assim como as crianças são orientadas sobre os locais que podem ou não ser tocados e incentivadas a pedir ajuda, os pais também recebem orientações dos educadores para se atentarem aos sinais.

    “Às vezes a mãe não sabe que o pai está abusando da filha, mas existem sinais, porque a criança sempre traz no corpo e nas atitudes o que está acontecendo com ela. Então se é uma criança que tinha um comportamento muito extrovertido, conversava com todo mundo e ia bem na escola, mas que de repente passa a ter notas baixas e não quer ir na escola, ou tem uma pessoa que é familiar e sente medo de estar próximo, ou então traz algumas falas que são preocupantes, como por exemplo, ‘Não quero mais passar por isso’. Tudo isso é sinal para a gente. Com isso, conversamos com os familiares”, explicou Jonathas.

    Consequências do abuso

    As consequências para os jovens que sofrem o abuso podem se desencadear de diferentes formas, como comportamentais, psicológicas e podem até desencadear doenças.

    “Por exemplo, uma criança que era extrovertida e fica introvertida, uma criança comunicativa que gostava muito de brincar e passa a ficar só dentro de casa, passa a ter déficit de atenção, notas baixas, alimentação reduzida e muitos traumas. E o trauma é algo que a gente leva para a vida toda, podemos tratá-lo e superá-lo, mas é um fantasma que fica na criança e no adolescente, que leva para a vida adulta. Traumas psicológicos podem desencadear doenças”, disse Jonathas.

    Onde denunciar

    As denúncias de casos de abuso e exploração sexual infantil podem ser feitas para:

    – 190: Polícia Militar (quando a criança está correndo risco imediato);

    – Disque 100;

    – Conselho Tutelar;

    – Qualquer delegacia de polícia;

    – Samu: 192 (para pedidos de socorro urgentes);

    – Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS).

    Exposição

    Uma exposição sobre esse e outros temas está sendo realizada no CDDH e está aberta à visitação, de segunda a quinta-feira, das 10h às 12h e no período da tarde, das 14h às 17h. A classificação indicativa da exposição é acima dos 14 anos de idade.

    Fotos: Maria Julia Souza

    “O CDDH está voltado para as exposições temáticas. E dentro delas, tem uma [exposição] que fala sobre o Maio Laranja. E nós percebemos quando o jovem visita essas exposições e, principalmente essa, que ele tem alguns relatos de crianças que sofreram abuso e começam a entender que ‘caramba, foi da mesma forma que aconteceu comigo’. Várias questões que às vezes é muito difícil você falar. Imagina quando você é adolescente. Então é difícil, mas a gente tenta, de alguma forma, pensar em como podemos estar contribuindo com aquela família ou com aquele adolescente”, finalizou Cleunice.

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