• MAC mostra a arte italiana feita na pandemia

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  • 24/06/2021 08:20
    Por Antonio Gonçalves Filho / Estadão

    A imagem de um beijo reproduzida a seguir, um óleo sobre tela do grafiteiro e pintor italiano neopop Tvboy, de 41 anos, se apropria de uma famosa tela do romântico veneziano Francesco Hayes (1791-1882), pintada em 1859 e conservada na Pinacoteca de Brera, em Milão. Há, porém, uma diferença fundamental na rebelião de Hayes contra a ocupação estrangeira na Itália na época do Risorgimento e o comentário irônico de Tvboy pintado em fevereiro do ano passado pelo artista de Palermo. Nesta, jovens de máscaras se beijam, respeitando – ainda que à maneira dos apaixonados – o distanciamento social imposto por razões sanitárias.

    Esta diferença pode ser atestada na mostra Além de 2020 – Arte Italiana na Pandemia, que o Museu de Arte Contemporânea (MAC/USP) mantém aberta até 22 de agosto no terceiro andar de sua sede, no Ibirapuera. Na exposição, com curadoria de Teresa Emanuele e Nicolas Ballario, estão reunidas obras e projetos de artistas independentes, grupos e coletivos que conceberam alguns destes trabalhos para arrecadar recursos destinados a amparar o sistema de saúde da Itália no combate à epidemia do covid-19 em 2020.

    A exposição, lembra a diretora do MAC/USP, Ana Magalhães, representa, antes de tudo, uma oportunidade de comparar a arte feita na Itália de hoje com a do passado – e o acervo do museu está repleto de bons exemplos do século 20, de Giacomo Balla a Sironi, passando por De Chirico, Modigliani e Morandi. Com uma estreita ligação com a arte italiana desde sua criação, o MAC recebeu na mostra o apoio do Consulado-Geral da Itália e do Instituto Italiano di Cultura, parceiros de longa data da instituição. A exposição viaja depois por países sul-americanos e chega aos EUA.

    É uma maneira de compensar o isolamento experimentado pelos artistas italianos em seus ateliês durante a pandemia. Presa no isolamento, observa a curadora Teresa Emanuele no catálogo da mostra, “a criatividade se confrontou com ela mesma”. De certo modo, isso teve reflexos positivos. Foi uma maneira que os italianos encontraram de testar seus limites e dialogar com o resto do mundo, conclui a curadora. Enfrentando um tema global, que “monopolizou o debate em todos os lugares”, como nota o cocurador Nicolas Ballario, a arte venceu, enfim, o desafio de não ser apenas uma crônica mundana e regional dos tempos que correm.

    Há de tudo na mostra: pinturas, desenhos, fotografias, vídeos, performances, instalações. Uma delas é a do grupo brasileiro Projetemos, convidado pela diretora Ana Magalhães para dialogar com os italianos. “Trata-se de um coletivo, uma rede de projecionistas que entrou em evidência durante a pandemia, usando a projeção em ações coletivas coordenadas para mobilizar a sociedade civil”, explica. O êxito dessas projeções foi tão grande que a própria empena do prédio do MAC deverá servir (em julho) de suporte para uma dessas projeções.

    Outro exemplo de resistência coletiva foi o projeto Extra Flags. Durante o fechamento, o Centro Pecci de Prato convidou artistas para desenhar uma série de bandeiras que foram içadas no mastro do museu como sinal de vitalidade da arte contra o covid-19. Há poucos, mas belos exemplos desta iniciativa no MAC, assinados por Mariella Senatore, Nico Vascellari e Mariza Migliora.

    Não há só italianos na mostra. O argentino Abel Zeltman, de 53 anos, que vive na Itália desde 1995, foi um pouco além de 2020 e imagina como o “novo normal” vai afetar a sensibilidade, cujo antídoto, segundo ele, é a máscara como obstáculo para as relações. Sua obra, Así se Baila el Tango (carvão sobre tela), mostra casais de mascarados dançando o último tango da pandemia.

    Registro lírico do isolamento são as pinturas do fotógrafo e cenógrafo milanês Paolo Ventura, feitas em seu estúdio de Anghiari. Lembram as ilustrações para livros infantis do pai, Piero Ventura, em especial a pintura de um passarinho ao lado de um laço (como o pintassilgo de Carel Fabritius), metáfora da prisão involuntária provocada pela quarentena.

    Ainda que tenha a experiência de confinamento, Francesca Romana Pinzari passou o lockdown no campo. A contemplação da natureza ajudou a artista a desenvolver seu projeto de transmutação da matéria – sua obra é uma instalação com duas cadeiras vintage a que foram agregados cristais de sulfato de cobre. Entre outras obras que revelam a reaproximação do homem com a natureza, está Tiglio, de Benedetto Pietromarchi, que usa terra de Montesi, carvão e pigmento sobre tela.

    Pietromarchi, de 49 anos, viveu em Londres, mas voltou para o campo (Maremma, na Toscana) antes de se instalar em Roma.

    SERVIÇO

    ALÉM DE 2020 – ARTE ITALIANA NA PANDEMIA.

    MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA DA USP (AV. PEDRO ÁLVARES CABRAL, 1.301, IBIRAPUERA), TEL. 2648-0254. 3ª/5ª, 11H/19H; 6ª/DOM., 11H/21H.

    ESTACIONAMENTO E INGRESSOS

    GRATUITOS. ATÉ 22/8.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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