• Lázaro Ramos lança luz sobre questões raciais em novo especial

  • Continua após o anúncio
  • Continua após o anúncio
  • 18/11/2020 17:30

    Todos os dias deveriam ser de cidadania, de celebração da consciência negra, do empoderamento feminino, da afirmação LGBTQIA+, mas Lázaro Ramos reconhece a importância simbólica de um dia para comemorar. “As pessoas estão sempre tão imersas nas suas coisas que precisam dessas datas para parar um pouco, e pensar.” Este que ficará como o ano da pandemia será também o do Black Lives Matter. Em todo o mundo houve protestos provocados pela morte de George Floyd, e no Brasil houve o caso João Pedro. Mas Lázaro não considera que as tragédias de 2020 façam deste ano, e da comemoração do 20 de novembro – dia de Zumbi dos Palmares -, uma data mais importante.

    “Há quanto tempo pessoas e entidades chamam a atenção para essa verdadeira tragédia brasileira que são as chacinas de jovens negros na periferia?”, indaga Lázaro. Nesta sexta (20), vai ao ar o especial de Manuela Dias, que ele dirigiu, na Globo. Falas Negras chega sob o signo da expectativa, mas também provocando polêmica. Roteiristas negros reclamaram que seja uma roteirista branca a assinar a peça, com depoimentos reais de pessoas que lutaram contra a escravidão, o racismo, o preconceito. O projeto nasceu de Manuela. Há tempos, Lázaro vinha se preparando para a direção. Dirigiu teatro, o programa Espelhos, do Canal Brasil. Tomou aulas particulares para entender a técnica.

    “Os não negros precisam entender o lugar de escuta”, ele diz. Lázaro já virou uma das vozes mais fortes em defesa da igualdade racial e social no País. Seu foco sempre foi a abordagem de temas relevantes, mas Lázaro sempre quis fazer isso de forma acolhedora. Transformou-se na exceção que confirma a regra do racismo no Brasil da suposta cordialidade. Além de Falas Negras, ele entra numa temporada de comemoração, e reconhecimento. No começo de dezembro, será o homenageado do 30º Cine Ceará. Guarda uma lembrança forte. A primeira vez que foi a Fortaleza foi pelo teatro. Aproveitou uma folga e foi ao cinema. Mais do que simbólico, acha que foi premonitório. Aquela ida ao cinema lhe produziu uma euforia. Ceará, cinema, Lázaro. O festival deste ano será encerrado com Silêncio da Chuva, a adaptação do primeiro livro de Luiz Alfredo Garcia-Roza, por Daniel Filho. Um homem é encontrado morto na direção do carro e a polícia destaca uma dupla para investigar o caso, Espinoza/Lázaro e Daia/Thalita Carauta. Lázaro e Daniel Filho possuem outra parceria inédita, o longa Medida Provisória, um sonho de oito anos que Lázaro finalmente conseguiu concluir. Ele dirige e Daniel Filho produz

    Foi há quase 20 anos. O repórter foi só ao Rio, numa visita ao set. Um certo Karim Aïnouz, que depois iria adquirir a importância que todo cinéfilo sabe, estreava na direção com Madame Satã, sobre o lendário personagem das noites da Lapa. O gay que não levava desaforo para casa e enfrentava no braço, e na navalha, quem lhe faltasse o respeito. Quem fazia o papel era Lázaro, um jovem ator baiano que já fizera um pequeno papel no ótimo A Máquina, de João Falcão. Lázaro lembra: “Foi o primeiro de muitos encontros que a gente teve, em festivais nacionais e até do exterior (‘Madame Satã’ foi a Cannes). Mesmo que, eventualmente, a gente tenha estado em desacordo, compartilhamos o amor pelo cinema”.

    Já que o tema é a Consciência Negra, o repórter faz uma mea-culpa. Numa entrevista feita há tempos com Lázaro, quando ele ainda não era o astro multimídia em que se transformou, o repórter perguntou que personagem ele gostaria de representar. A resposta veio rápida – “Hamlet!”. Lázaro, o príncipe da Dinamarca? Como o preconceito está entranhado na cabeça da gente Por que não? Bastaria levar o “ser ou não ser” para o reino de Wakanda. “Cara, juro que não me lembrava dessa história, mas a gente já se conhece há tanto tempo que, se tivesse percebido alguma coisa, o que eu ia dizer é ‘Se liga, mano’. Estamos juntos na mesma luta contra a ignorância, por um mundo melhor e mais justo, em que negros, mulheres e gays sejam plenamente reconhecidos em seus direitos. A luta pelo cinema brasileiro.”

    Lázaro não fez seu Hamlet, mas fez um Espinoza preto e até um Arandir negro na transcrição da peça de Nelson Rodrigues Beijo no Asfalto, por Murilo Benício. Tem quebrado barreiras, estabelecido paradigmas.

    Últimas