• Justiça homologa plano de recuperação judicial da AgroGalaxy e encerra 8 meses de negociação

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  • 27/maio 15:22
    Por Gabriel Azevedo / Estadão

    A Justiça de Goiás homologou o plano de Recuperação Judicial (RJ) da AgroGalaxy e reconheceu a viabilidade da proposta para superação da crise financeira do grupo. A juíza Alessandra Gontijo do Amaral, da 19ª Vara Cível e Ambiental de Goiânia, concedeu a recuperação ao conglomerado de 13 empresas que acumula dívidas de R$ 4,6 bilhões, mas rejeitou cláusulas que tentavam proteger terceiros garantidores.

    A decisão encerra oito meses de negociações que começaram quando a AgroGalaxy pediu recuperação judicial em setembro de 2024. A empresa, que já foi uma das maiores redes de revenda de insumos agrícolas do País, enfrentou grave crise que a levou a fechar metade das lojas, demitir 40% dos funcionários e sair de três Estados. Hoje opera com 65 lojas, 14 silos e uma unidade de sementes em nove Estados, em comparação com cerca de 130 unidades no auge.

    “A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores”, citou a magistrada, reproduzindo o artigo 47 da Lei de Falências. A homologação representa um alívio para a empresa, que agora pode focar na execução do plano aprovado por 82,4% dos credores em abril.

    O plano homologado é a quarta versão apresentada pela companhia, após meses de negociações com mais de mil credores. Durante a assembleia de credores, realizada em abril, após mais de 12 horas de discussões, o Banco do Brasil, maior credor individual com R$ 391 milhões, chegou a pedir o adiamento da votação por 30 dias. A proposta foi rejeitada por 1.136 votos contra apenas 79 favoráveis.

    “A assembleia geral de credores é um dos pilares do processo de recuperação judicial, sendo o momento no qual os credores se reúnem para deliberar sobre o futuro da empresa”, destacou a juíza na decisão. Ela ressaltou que “as decisões tomadas pelos credores em assembleia possuem um peso determinante e, em regra, prevalecem”, reforçando a legitimidade do plano aprovado.

    Apesar da homologação, a Justiça declarou ilegais seis cláusulas que tentavam estender os benefícios da recuperação a terceiros não envolvidos no processo. “A homologação do plano de recuperação judicial é um passo fundamental para a empresa devedora, mas ela não serve como um ‘escudo’ para terceiros garantidores”, escreveu a magistrada, preservando direitos de credores contra avalistas e fiadores.

    A empresa tentou incluir dispositivos que impediriam credores de acionar sócios, administradores e garantidores. “A inclusão de cláusulas no plano de recuperação judicial que preveem a liberação de terceiros garantidores é, de fato, incompatível com a legislação aplicável”, decidiu a juíza, seguindo jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça.

    Entre os credores que questionaram aspectos do plano estão Cemig, Louis Dreyfus Company e Banco Bocom BBM, que criticaram especialmente a falta de transparência em algumas operações e a tentativa de proteger terceiros. “Os credores do devedor em recuperação judicial mantêm seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso”, fundamentou a magistrada.

    A decisão aprovou a criação de diferentes categorias de credores, com condições de pagamento distintas. Fornecedores que mantiveram relacionamento comercial durante a crise, denominados “credores colaboradores”, terão pagamento integral sem desconto, com dois anos de carência e prazo total de dez anos. “O voto favorável ao plano não é apenas um ato burocrático; é a validação expressa da estratégia de reestruturação proposta pela empresa”, justificou a juíza.

    Para credores quirografários comuns, o plano oferece duas opções principais: recebimento de até R$ 15 mil à vista com quitação total da dívida, ou adesão a um esquema com deságio de 85% e pagamento parcelado em 26 vezes, começando apenas três anos após a homologação. Os pagamentos terão correção pela Taxa Referencial acrescida de 0,5% ao ano.

    O plano prevê a venda de uma carteira de recebíveis avaliada em R$ 760 milhões, operação que deve injetar R$ 91 milhões em caixa e contribuir para reduzir cerca de R$ 300 milhões em dívidas. A proposta foi apresentada por dois fundos e inclui duplicatas e notas promissórias vencidas entre 2013 e 2024.

    A empresa também pode vender outros ativos por meio de Unidades Produtivas Isoladas (UPIs), sempre com autorização judicial prévia. “A cláusula que permite a alienação com controle judicial confere a flexibilidade necessária para que a empresa se adapte a novas realidades de mercado”, decidiu a magistrada, rejeitando objeções sobre falta de detalhes.

    Com a homologação, a AgroGalaxy tem dois anos para cumprir as obrigações do plano, sob pena de conversão em falência. “O descumprimento de qualquer obrigação do plano durante esse período bienal resultará na convolação da recuperação judicial em falência”, advertiu a juíza. A decisão determina ainda o cancelamento de protestos e a retirada de registros de inadimplência.

    A crise da AgroGalaxy reflete dificuldades do setor de revenda de insumos, pressionado por quebra de safras, inadimplência rural e aperto creditício. No quarto trimestre de 2024, registrou prejuízo de R$ 292,4 milhões e queda de 69,3% na receita, para R$ 741 milhões. No acumulado do ano, o prejuízo chegou a R$ 2,48 bilhões, com receita de R$ 4,61 bilhões – menos da metade dos R$ 9,4 bilhões de 2023.

    Para enfrentar a crise, adotou medidas como conversão de vendas a prazo em operações à vista, antecipação de recebimentos e redução de estoques de R$ 839,8 milhões para R$ 223,8 milhões. As ações elevaram o caixa de R$ 195 milhões para R$ 480 milhões no final de 2024. A empresa deve divulgar os resultados do primeiro trimestre de 2025 em 29 de maio, após o adiamento da data inicial.

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