Juros: taxas curtas ficam estáveis com fala de Campos Neto, mas longas sobem com fiscal
Os comentários do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, indicando ao mercado que apostar num forte aumento da Selic em setembro é incompatível com a comunicação apresentada pelo Comitê de Política Monetária (Copom), travaram o avanço das taxas na ponta curta da curva dos contratos de Depósito Interfinanceiro (DI), mas em níveis que pressupõem uma chance majoritária de alta de 0,50 ponto porcentual na Selic em setembro. Além disso, não impediram a disparada de até 20 pontos-base dos juros nos vértices médios e longos, baseada principalmente em preocupações com o aumento das despesas públicas, mas refletindo também a alta dos juros dos Treasuries e do dólar.
Durante participação na Expert, evento da XP, Campos Neto disse que “existe hoje um prêmio de risco na parte curta da curva de juros que não é compatível com a mensagem transmitida na ata e nas comunicações, e que foi fruto da convergência de opiniões da diretoria colegiada. E por fim nós entendemos que se e quando houver um ciclo de ajustes nos juros, esse ciclo será gradual”.
Logo após a fala do presidente do BC, as taxas perderam fôlego ao longo de toda a curva, mas o efeito mais notório foi entre os contratos de vencimento mais próximo, que passaram a projetar juros iguais ou levemente inferiores aos do ajuste de quinta-feira. Esse efeito permaneceu na ponta curta nas horas seguintes, mas nos vértices médios e longos as taxas voltaram a subir – o que especialistas atribuíram a um movimento de compensação.
“O mercado ficou segurando no juro curto, por causa da declaração do Campos Neto sobre ajuste gradual, mas aí o longo prazo é que sobe, porque o mercado joga tudo para depois. Se não vai aumentar agora o que precisa, vou precificar mais alto lá na frente, porque o risco pode ser um pouco maior”, disse Vinícius Romano, head de renda fixa da Suno Research.
A contenção das taxas curtas pelos comentários de Campos Neto, porém, não retirou da curva a expectativa de um aumento mais intenso da Selic no mês que vem. A precificação no final da tarde apontava para um aumento de 42,6 pontos-base na taxa básica, até um pouco maior que o de ontem, de 40,02 pontos, segundo Carlos Lopes, economista do banco BV. Estes níveis, na prática, sugerem que entre as hipóteses de alta de 0,25 ponto porcentual e de 0,50 ponto porcentual, a segunda opção é a mais provável, com 70% de chances.
Romano pondera que este aumento dos juros “não é tão garantido”. “A sinalização das autoridades é para não trazer surpresa se houver uma alta de fato. Mas a dúvida traz mais volatilidade. Pelos dados que a gente tem visto, fica em aberto”, avaliou.
Lopes explica que as taxas de DIs se apoiam principalmente nos “sinais conflituosos” entre a política fiscal – que rege os gastos do governo – e a política monetária – que visa o controle da inflação.
“Do lado fiscal a gente vem já de bastante tempo tendo política de continuar com aumento de gastos públicos compensado por receitas. A estratégia não tem sido crível pelo ponto de vista do mercado, que não acredita no atingimento das metas fiscais. Os sinais recentes têm sido de que essa estratégia, mesmo diante de uma frustração, não vai ser revista”, avaliou, acrescentando que o plano do governo de aumentar as despesas do auxílio gás contornando diretivas de controle de despesas reforçam as preocupações do mercado. “Traz preocupação de que teremos expansão do gasto a despeito das regras fiscais”.
No fechamento, a taxa de DI para janeiro de 2025, que hoje teve um volume de negócios próximo a 3 milhões de contratos – bem acima da média de agosto, de 1,1 milhão -, rodava a 10,995%, de 10,991% no ajuste anterior. A taxa do contrato de DI para janeiro de 2026 subia a 11,880%, de 11,815%, e a taxa para janeiro de 2027 aumentava a 11,980%, de 11,775%. A taxa para janeiro de 2029 avançava a 12,165%, de 11,854%.